Alexandre Oltramari
Fotos Dida Sampaio/AE |
A saúde e a urna O presidente afaga o vice José Alencar na cerimônia em que Dilma apareceu pela primeira vez sem peruca |
O presidente Lula fez na semana passada uma entusiasmada avaliação de seu governo em 2009. Em um café da manhã com jornalistas, Lula destacou a criação de 1,4 milhão de novos empregos em plena crise mundial, comemorou o fato de o Brasil sediar a Copa do Mundo e a Olimpíada e, como sempre faz até mesmo quando está animado, criticou o trabalho da imprensa. A parte mais interessante de seu balanço natalino, porém, tem a ver com o futuro, especialmente 2010 - ano em que, pela primeira vez desde a volta à democracia, Lula não estará disputando a cadeira de presidente, ao menos diretamente. A ascensão da candidata oficial, a ministra Dilma Rousseff, que ultrapassou a marca dos 20% das intenções de voto, parece ter deixado o presidente exultante. Embalado por mais de 70% de aprovação, Lula deixou evidente que se considera o senhor das próximas eleições e vai se comportar como tal. Olímpico, o presidente analisou as chances de sua candidata, o que é natural, deu conselhos à oposição, o que é inusitado, e, por descuido ou soberba, acabou revelando até o papel do deputado Ciro Gomes na campanha, o que é no mínimo indecoroso.
Títere à deriva Ciro ficará na mão se isso for melhor para Lula |
Ciro Gomes, o socialista que corre o Brasil se anunciando como candidato a presidente pelo PSB, é um títere do presidente em 2010. Há muito se suspeitava, mas só agora Lula deixou isso bem claro. Logo depois de anunciar oficialmente sua pretensão presidencial, com o aval do Planalto, o deputado foi instado a transferir seu título de eleitor para São Paulo para ser usado, se fosse o caso, em uma estratégia estadual do interesse do governo. Os bons índices de votação captados pelas pesquisas ajudaram o deputado a se afastar do papel de impostor. Ocorre que o governo percebeu que Ciro Gomes estava atraindo votos da seara da ministra Dilma Rousseff. O que poderia ser uma solução, portanto, aos poucos se mostra prenúncio de problema. Em 2006, numa estratégia similar, Lula incentivou a candidatura de Eduardo Campos, também do PSB, ao governo de Pernambuco. Queria forçar um segundo turno com a participação do PT. Deu tudo errado. Campos, o Ciro Gomes da ocasião, tinha um dígito nas pesquisas, ultrapassou o candidato petista, foi para o segundo turno e venceu a eleição com mais de 60% dos votos. "Se eu perceber que a base não comporta mais que uma candidatura, conversarei com ele (Ciro Gomes) para que desista", sentenciou o presidente Lula, com a autoridade de senhor da eleição. Em outras palavras, Ciro, se necessário, será convidado a sair de campo para não atrapalhar a ministra Dilma Rousseff.
O presidente Lula parece tão otimista com a possibilidade de eleger Dilma como sucessora que arriscou até sugestões supostamente construtivas para a oposição. Ele disse duvidar da eficácia de uma chapa com Aécio Neves na condição de vice de José Serra - um fantasma que atormenta os petistas. "Tenho dúvidas se é bom. Não sei se um time Tostão-Tostão, Coutinho-Coutinho ou Dirceu Lopes-Dirceu Lopes seria a melhor coisa, não sei se daria certo", afirmou, recorrendo mais uma vez ao futebol para dizer que não acredita na eficácia de dois craques jogando no mesmo time. O governador José Serra devolveu a bola. "Quando um jogador é bom, dá para duplicar. Encontra-se um jeito de se arrumar no campo", disse Serra.
As declarações do presidente surgem no melhor momento da pré-candida-tura de Dilma Rousseff. A empinada da ministra nas pesquisas, depois de quase um ano colada a Lula, coincidiu com sua primeira aparição pública sem peruca, usada desde maio passado para esconder a queda de cabelos provocada pelo tratamento contra um câncer. Com os cabelos ainda curtos, agora numa tonalidade um pouco mais escura, e vestindo uma blusa azul cavada, inédita em seu figurino, Dilma compareceu à solenidade de entrega de um prêmio de direitos humanos acompanhada de Lula e do vice-presidente José Alencar, que também trava uma comovente batalha contra a doença. A ministra, uma ex-guerrilheira que frequentou as prisões da ditadura, chorou duas vezes. Uma ocorreu durante homenagem a uma ex-companheira de guerrilha. A outra quando foram exibidas imagens com cenas de violência do regime militar.