O vazamento que adiou o Enem
Política

O vazamento que adiou o Enem


Em busca da prova segura

Depois do vazamento do Enem, o substituto do velho vestibular, o MEC
está diante de um desafio: tornar o exame mais imune a fraudes como essa


Cíntia Borsato

Celso Junior/AE
PREJUÍZO ALTO
O ministro Haddad e o presidente do Inep, Reynaldo Fernandes: 35 milhões de reais no lixo


Uma fraude que veio à luz na semana passada resultou no adiamento do novo Enem, exame do Ministério da Educação que seria aplicado, neste final de semana, a 4,1 milhões de estudantes. A prova, que deve ser remarcada para daqui a 45 dias, substituirá o tradicional vestibular - do qual é considerado um avanço - em mais de 500 universidades do país. A confusão se deve ao vazamento das questões do exame, fato que O Estado de S. Paulo noticiou depois que dois homens ainda não identificados, tendo em mãos um exemplar da prova, tentaram vendê-la ao jornal, sem sucesso. O MEC, no entanto, reconheceu o material como verdadeiro. O caso está sendo investigado pela Polícia Federal, que, na semana passada, considerava mais fortemente as hipóteses de a fraude ter ocorrido na gráfica ou na distribuição das provas, e não nas dependências do MEC. Isso porque o exemplar que veio a público já estava impresso, e no ministério só havia uma versão digitalizada do exame. Tanto a impressão como a distribuição do Enem estavam a cargo de um consórcio de três empresas privadas, liderado pela Consultec, da Bahia. Pouco conhecida no mercado, ela não teve concorrentes no processo de licitação, uma vez que a Cesgranrio, que chegou a ingressar na disputa, acabou desistindo. Avaliou que o tempo para colocar de pé a logística da prova seria curto demais. O atropelo, aliado à ausência de uma empresa com mais experiência em grandes concursos, é um fator que pode ter atrapalhado. Na última sexta-feira, o MEC estudava a possibilidade de passar a ser responsável pela impressão e pela distribuição da nova prova - deixando para a Consultec apenas sua aplicação e correção.

Hans Von Manteuffel/Ag. O Globo
A REVOLTA DOS ESTUDANTES
Eles protestam no Recife: com a mudança, surgem dúvidas se haverá tempo de usar a nota do Enem em algumas faculdades


Não é a primeira vez no Brasil que um concurso desse tipo é alvo de uma fraude. A cada ano, algo como cinco vestibulares têm seu conteúdo violado, pelo menos em parte. Não há notícia, porém, de vazamento numa prova com as proporções do Enem. Manter a segurança num concurso de tal magnitude é certamente mais difícil, ainda que ele siga, grosso modo, o mesmo padrão de vigilância dos outros. Nesse caso, são milhões de provas que precisam chegar a 10.000 localidades em 1.800 cidades, uma logística jamais vista num vestibular. Resume Carlos Alberto Serpa, da Fundação Cesgranrio, à frente de alguns dos maiores concursos no país: "Com uma rede de distribuição tão extensa, mais gente toma contato com a prova - e é preciso redobrar a segurança".

Com o adiamento do exame, universidades como USP e Unicamp, que adotariam o Enem como parte de seu processo seletivo, já cogitam desistir da ideia, dependendo da nova data da prova. "Não podemos atrasar nosso processo por isso", justifica Renato Pedrosa, coordenador do vestibular da Unicamp. O episódio ainda afeta, diretamente, o cronograma dos estudantes. É possível que o Enem acabe sendo aplicado em data bem próxima à da Fuvest e à da própria Unicamp - motivo de angústia para alunos como Flávia Ferreira, 19 anos: "Aumentou o meu stress". O prejuízo para o governo também não é pequeno: jogar o Enem já pronto no lixo e fazer um novo custará algo como 35 milhões de reais.




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