OPUS DEI - Cujus regio, ejus religio
Política

OPUS DEI - Cujus regio, ejus religio



os 3 pilares da Sociedade - o Padre, o Militar e o Banqueiro
George Grosz - 1926

Oficialmente, a Opus Dei é apenas uma associação católica internacional. A sua actividade limitar-se-ia ao conselho espiritual dos seus 79.303 membros (ou seja 1.506 padres, 352 seminaristas e 77.445 laicos). Membros que ela escolheu entre a nata latino-americana e europeia. Entre eles patrões de multinacionais, magnatas da imprensa e da finança, chefes de Estado e de governo. De cada um, ela exige uma austera disciplina e uma completa obediência. Também, embora finja ignorar as suas actividades políticas “pessoais”, pode através deles impor os seus valores aos povos.
Esta seita foi fundada a 2 de Outubro de 1928 por um jovem padre espanhol, de origem modesta, o abade Escrivá. Tratava-se para os adeptos de chegar à santidade participando na instauração de um regime teocrático do qual Escrivá era o profeta. A guerra civil surgiu‑lhes como a ocasião inesperada de estabelecer o Estado católico dos seus sonhos. O abade Escrivá tornou-se director de consciência do general Franco. Em conjunto, reabilitaram o velho princípio «Cujus regio, ejus religio» (tal governo num Estado, tal religião neste Estado).
A Opus Dei empreendeu seleccionar e formar as elites da ditadura até controlar o essencial do poder. Assim, nos anos 70, o governo do almirante Carrero Blanco foi qualificado de “monocolor”: de dezanove ministros, doze eram Opusianos. Embora não tenha exercido nenhuma responsabilidade directa no regime, o “padre” não cessou de aconselhar o generalíssimo. Foi ele que sugeriu o restabelecimento da monarquia de direito divino, da qual Franco foi proclamado regente vitalício.
O abade Escrivá tencionava fazer-se proclamar regente quando ocorresse o falecimento do Caudilho. Foi por isso que se fez nobilitar em 1968 sob o título de Msr Escrivá Balaguer, marquês de Peralta. Mas este plano foi alterado dado que no ano seguinte Franco designou o príncipe Juan Carlos I de Bourbon para lhe suceder. Contas feitas, Msr Balaguer tinha outras ambições. Desde o fim da Segunda Guerra mundial, tinha-se instalado em Roma e empregava-se a estender o seu poder na América Latina. Oratórios da Opus tinham sido instalados nas embaixadas espanholas que facilitaram os seus contactos com as elites locais. Prodigalizou os seus conselhos espirituais a todos aqueles que ambicionavam lutar contra o comunismo e firmar a fé católica no seu país. Assim se precipitou para Santiago do Chile em 1974 para celebrar uma acção de graças com três dos seus “filhos espirituais”, o general Pinochet, o almirante Mérino e o general Leigh.
Monsenhor de Balaguer teria querido estender a sua “Obra” na Europa mas foi impedido parcialmente pelo isolamento diplomático de Espanha. Os seus objectivos eram recrear uma internacional anticomunista (comparável à aliança Franco-Mussolini-Hitler durante a guerra civil), romper o isolamento da Espanha franquista e favorecer a construção europeia.
Em 1957, fez criar em Madrid, pelo arquiduque Otto von Habsburg Lothringen, o Centro europeu de documentação e de informação (CEDI) e, graças a dois outros dos seus “filhos espirituais”, Alcide de Gasperi e Robert Schuman, pesou na redacção do tratado de Roma que levou à criação da Comunidade Europeia. Como o general Franco, o “padre” faleceu em 1975. Foi erradamente que se acreditou que a Opus Dei desapareceria no inferno com eles. O progresso foi retomado três anos mais tarde, em 1978. Aproveitando as intrigas que paralisavam o Sagrado Colégio, a Opus Dei conseguiu convencer os cardeais a eleger um dos seus pregadores como Papa: o arcebispo de Cracóvia, Karol Wojtyla. Desde então, a seita ia poder desviar em seu proveito o aparelho diplomático do Estado do Vaticano e a organização religiosa da Igreja católica.


João Paulo II constituiu o seu gabinete quase exclusivamente de Opusianos e empregou-se a quebrar qualquer resistência no seio da Igreja. Para isso fez isolar – “por razões de saúde” – o superior dos jesuítas, Pedro Aruppe, e nomear um administrador provisório da sua ordem na pessoa de um Opusiano, o padre Dezza. Mas não ousou dissolver a companhia de Jesus. Operou uma gigantesca retoma de controlo dos padres latino-americanos, culpados de compartilharem as análises marxistas e de se oporem às ditaduras católicas.
Dois homens serviram com zelo a sua política: Msr Josef Ratzinger, prefeito da Congregação para a doutrina da fé, e Msr Alfonso Lopez Trujillo, presidente do Conselho pontifical para a família. Um centro de vigilância foi instalado em Bogotá, dotado de um computador de capacidade estratégica, cujos terminais estão instalados na cidade do Vaticano. Inscreveram-se em fichas todas as actividades políticas dos religiosos latino-americanos. Foi a partir destas informações que foram nomeadamente assassinados por “esquadrões da morte” o padre Ignacio Ellacuria ou Msr Oscar Romero. Enfim, João Paulo II promulgou um novo código de direito canónico, cujo artesão principal foi um prelado da Opus, Msr Julian Herranz-Casado, tornado depois presidente do Conselho pontifical para a revisão dos textos legislativos.
Por outro lado, dotou a Obra de um estatuto à medida, o de “prelatura apostólica”. Doravante os membros da Opus Dei escapam à autoridade dos bispos no território dos quais residem. Obedecem apenas ao seu prelado e este ao Papa. A sua organização tornou-se um instrumento de controlo das Igrejas locais ao serviço do poder temporal do Vaticano. Um destino que não pode deixar de recordar o de uma outra seita que reinou pelo terror religioso sobre a Espanha do século XVI antes de impor o seu fanatismo sobre a Igreja universal: a Inquisição.
Enfim, o papa confiou a administração da “Congregação para a causa dos santos” a um Opusiano, Rafaello Cortesini. João Paulo II empenhou-se num processo canónico do abade Escriva de Balaguer e proclamou a seu beatificação no dia do seu próprio aniversário, a 17 de Maio de 1992. Esta mascarada levantou vivas polémicas na Igreja romana. Todos os testemunhos opostos à “causa do santo” foram rejeitados sem ser ouvidos, enquanto seis mil cartas postulares foram incluídas no processo. Elas emanavam nomeadamente de sessenta e nove cardeais, de duzentos e quarenta e um arcebispos, de novecentos e oitenta e sete bispos e de numerosos chefes de Estado e de governo.

Texto de Thierry Meyssan, publicado no Réseau Voltaire em 25/01/1995



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