Em dez anos a carga tributária do Brasil subiu cinco pontos
percentuais do PIB. É um peso de impostos muito maior do que o de
muitos países ricos que oferecem serviços melhores aos cidadãos. Os
impostos são mal distribuídos; pesam mais sobre o trabalho e a
produção do que sobre o patrimônio. As isenções e os Refis criam
desigualdades entre os contribuintes.
De acordo com um estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento
Tributário (IBPT), o Brasil tem a décima quarta maior carga tributária
entre os países da OCDE. O país não faz parte dessa organização onde
está a maioria dos países mais ricos do mundo; mas se fizesse, estaria
nesta posição no ranking. Têm carga menor que a do Brasil países como
Estados Unidos, Canadá e Espanha. Só para ficar em alguns.
Ninguém é contra o pagamento de impostos, mas hoje, a carga tributária
virou um problema econômico, segundo o presidente do IBPT, João Elói
Olenike.
- É insustentável continuar aumentando os impostos assim. Isso cria
distorção e atrapalha o crescimento. Para se ter uma ideia, em 2001, a
carga era 30,03% e em 2010, foi para 35,13%. Isso significa que o
governo tirou a mais da sociedade, só com esse crescimento, no
acumulado de dez anos, R$1,850 trilhão. Tirou meio Brasil do Brasil em
dez anos, só com o aumento dos impostos.
Bianca Xavier, que é coordenadora de pós-graduação de Direito
Tributário da Fundação Getulio Vargas, pondera que o refinanciamento
das dívidas fiscais só pode ser um instrumento usado uma vez. Se é um
mecanismo frequente, alguma coisa está errada.
- Houve Refis em 2000, 2003, 2006, 2009 e daqui a três anos vão
esperar que aconteça outro. É um sintoma de que o governo reconhece
que as empresas precisam de um mecanismo de recuperação fiscal, ou
seja, que a carga é alta demais. A Procuradoria da Receita Federal tem
dito que isso causa um problema de isonomia. Afinal, quem paga em dia
é prejudicado. Quem não paga e entra no Refis tem 180 meses para pagar
e juros mais baixos.
Conversei com os dois especialistas no programa da Globonews desta
semana. O que fica claro para quem se detém um pouco nesse tema é o
emaranhado que é a estrutura de impostos no Brasil. Mesmo quem sabe
que o país tem impostos e taxas demais, fica espantado com a
informação dada por Bianca Xavier de que a cada hora duas normas
tributárias são baixadas no Brasil. Ela conta que frequentemente tem
de desdizer numa aula o que disse na aula anterior, porque entre uma e
outra, a norma que havia explicado é alterada.
João Elói lembra outra perversidade: há muitos impostos indiretos que
recaem sobre o consumo e isso pesa desigualmente sobre os brasileiros.
Quem é mais pobre acaba pagando relativamente mais. Nos produtos,
todos os consumidores, independentemente do seu poder aquisitivo,
pagam o mesmo imposto. E não há transparência.
- Em outros países, há o Imposto sobre Valor Adicionado e as notas
discriminam o quanto de imposto está sendo pago em cada produto. No
Brasil, o consumidor não sabe quanto está pagando em cada mercadoria.
O imposto sobre patrimônio no Brasil é baixo; 70% da carga recaem
sobre produção, faturamento e salário. As empresas têm de pagar R$120
de impostos, taxas e contribuições em cada R$100 pagos de salário.
Isso incentiva a informalidade ou o pagamento de parte do salário por
fora.
A informalidade é outro problema decorrente dos excessos de regras,
impostos e carga tributária no Brasil. Os dois especialistas acham que
nos últimos anos a tendência tem sido diminuir a informalidade, com as
notas fiscais eletrônicas e outros mecanismos de fiscalização. Mesmo
assim, diz João Elói, de cada R$1 arrecadado, pelo menos R$0,30 estão
sendo sonegados. Bianca Xavier lembra que isso deveria estar reduzindo
o peso dos impostos sobre os contribuintes.
- Se numa mesa de restaurante alguns saem sem pagar, a conta fica
maior para quem fica. Mas se há mais pessoas entre os pagantes, a
conta deveria ficar relativamente mais leve. E isso não está
acontecendo.
Segundo um texto divulgado recentemente pelo IBPT, "o brasileiro, em
geral, não é contra o pagamento de tributos, até mesmo porque tem
consciência de sua importância para custear a máquina pública. O que o
angustia e causa revolta é saber que paga - e paga muito - ao governo
e não tem um retorno minimamente satisfatório". De acordo com João
Elói, o maior peso recai sobre a classe média.
As isenções dadas a algumas empresas ou a alguns setores criam outras
injustiças.
- Isenção é política fiscal. Toda vez que o governo dá uma isenção,
alguém vai ter de pagar por isso. É preciso saber quem está sendo
desonerado, as razões dos benefícios e quem pagará por eles. Tem de
ser isonômico. Não se pode dar para uma empresa e não para o
concorrente. Até recentemente, para citar um exemplo, a LG tinha um
benefício que a Phillips não tinha no mesmo produto. Tributo tem de
ser neutro. Desonerações são privilégios - diz Bianca Xavier.
Quando o governo sustenta que a carga brasileira não é alta,
certamente não está pensando em tudo isso: que ela é mais alta que a
de muitos países que oferecem serviços melhor, que é desigualmente
distribuída, que as desonerações são arbitrárias, que tem aumentado
ano a ano, que existem normas, impostos e taxas demais enlouquecendo o
contribuinte. Além disso, não há no horizonte um alívio desse peso e
destas complicações que atormentam o contribuinte brasileiro.