Pior do que está não fica??

Espero que Tiririca nos ensine sobre o Legislativo- Fernanda Dannemann

Entendo a visão humanista do Marcelo Migliaccio, ao defender os direitos de Francisco Everardo Oliveira da Silva, o palhaço Tiririca, de se candidatar __ e até se eleger__ a deputado federal por São Paulo, pelo Partido da República.

Mas o caso não é este. O ponto nevrálgico de tudo isso é o tal “voto de protesto”, nome bonito que alguém arranjou para o “voto do deboche”, aquele que o eleitor irresponsável dá a um candidato que se intitula “abestado” e admite querer ajudar muita gente, inclusive a própria família.

Foi justamente em nome do “protesto” que o Macaco Tião, nas eleições de 1988, levou mais de 400 mil votos e ficou em terceiro lugar na corrida à prefeitura do Rio. Alguém aí se lembra? E o dr. Enéas, que era motivo de chacota em suas primeiras aparições na TV e, também devido ao “protesto”, saiu do limbo e chegou a deputado federal com a votação recorde superior a 1,5 milhão de votos?

Certamente que entregar o país a uma pessoa sem qualificação __como o próprio Tiririca se assume __ não será o melhor meio para afastar políticos oportunistas do governo. E agora alguém me dirá:

-- Se o Lula está lá, por que é que o Tiririca também não pode?

Mas esta comparação não é cabível. Apesar de ter pouca escolaridade, Lula aprendeu muito em sua trajetória como líder sindical à frente dos metalúrgicos de São Paulo e adquiriu experiência e respeito de gente preparada que se uniu a ele e ao projeto do PT. Não foi por sua veia cômica que conquistou o respeito internacional, aliás. E olha que não sou petista...

E o Tiririca? Não é por ser palhaço ou analfabeto, se o fosse. Mas que capacitação ele teria para ocupar uma cadeira na Câmara? Tanta quanto o Romário. E outros tantos anônimos despreparados que fazem a maioria dos candidatos a qualquer cargo, inclusive à presidência. E quase sempre por oportunismo.

Que preparo símbolos tão populares no futebol ou na televisão podem ter para iniciar uma carreira política? O mesmo que eu tenho para ser desembargadora ou cirurgiã. Este, a meu ver, é o centro de toda esta questão: a carreira política deveria exigir formação específica dos candidatos, com avaliação formal feita por instituições reconhecidas.

E digo mais: os próprios eleitores também carecem de formação para poder exercer seu direito, porque é mais fácil votar em branco ou anular o voto do que entender o que se passa nas esferas do legislativo brasileiro. É mais fácil fazer cara de "entendido" e, como me disse o porteiro do meu prédio, dizer que vai optar pelo voto de protesto, para não ser conivente com nada. Ou então votar no filho do amigo do vizinho.

A imprensa, por exemplo, deveria, além de chamar a atenção para os candidatos ficha suja, voltar os holofotes para aqueles que não se sujaram. Ou será que eles não existem?

Os eleitores precisam saber que, por conta do critério da proporcionalidade previsto pela legislação eleitoral, ao eleger Tiririca, elegem também candidatos como o Pastor Paulo Freire, que é contra a adoção por casais gays, e Valdemar Costa Neto, envolvido com o mensalão e com compra de votos em 2006.

Ou seja, eleição só é brincadeira para quem gosta de circo dos horrores.

Assim como grandes empresas possuem indicadores para medir o desempenho dos seus funcionários e negócios, o Legislativo deveria também ter seus indicadores. (Ou, caso os tenha, publicá-los). Mal ou bem, é mais fácil avaliar o Executivo, ainda que superficialmente... mas qual a informação que os eleitores têm para formar sua opinião sobre a Câmara e o Senado?

Talvez por causa da mal disfarçada ignorância política do povo __inclusive das classes abastadas__ Tiririca tenha despertado a atenção dos eleitores: pode ser que, lá no fundo, tenha criado empatia com o povo, já que assume não saber o que faz um deputado federal. Será que vai mesmo aprender, para nos contar depois?

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