Política e poder na greve de servidores - EDITORIAL O GLOBO
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Política e poder na greve de servidores - EDITORIAL O GLOBO


O GLOBO - 19/08


O movimento do funcionalismo não chama a atenção apenas pela dimensão, uma onda de greves reunindo cerca de 30 categorias, entre as quais milhares de servidores de áreas vitais. Surpreende, também, pelo fato de vários dos segmentos que se encontram paralisados fazerem parte da elite do serviço público, remunerada por altos salários, bem acima dos praticados nas empresas privadas.

Como sempre, a palavra de ordem dos grevistas é "reposição". Os números, porém, mostram outra realidade, a de funcionários bem pagos, depois de oito anos de governo Lula, em que não apenas a folha de salários inchou em quantidade, pelas contratações, mas também nas cifras, impulsionadas por generosos reajustes, concedidos também em nome da "reposição" daquilo que a inflação havia corroído.

A partir da greve dos professores das universidades federais, o movimento parece ter ganhado velocidade. A questão no ensino superior foi em parte resolvida com a aceitação da parcela menos ideológica da categoria da proposta de reajuste feita pelo MEC, segundo a qual se privilegia o mérito, os doutores. Muito razoável.

O problema continua em vários outros segmentos da máquina burocrática, com graves reflexos no abastecimento interno, em função da paralisação de autarquias responsáveis pela fiscalização e liberação de importações e exportações. Como acontece em greves movidas por forte sentido corporativista - reforçado pelo privilégio da estabilidade no emprego -, os preocupantes números divulgados pelo governo não surtem qualquer efeito. Por exemplo: se todas as demandas fossem aceitas, a folha de salários aumentaria cerca de R$ 90 bilhões ou aproximadamente 50%. Inviável, por suposto.

Isso para atender categorias como a de auditores da Receita, beneficiados, de 2003 até hoje, com aumentos de 50% acima da inflação; analistas do BC, 33,8%; fiscal agropecuário, 71,7%. A lista é grande.

O que leva, então, servidores, uma das bases político-partidárias clássicas do PT, a investir desta forma contra um governo do partido, com o risco de inviabilizá-lo, caso ele não possa destinar os recursos necessários à retomada do crescimento? Não há uma resposta única, mesmo porque alguns setores do sindicalismo público estão sob o controle de PSOL/PSTU, adversários do PT.

No lado da CUT - braço sindical petista, mas que aderiu à greve -, pode haver alguma desilusão com a companheira Dilma, não tão permeável às demandas salariais dos burocratas quanto Lula. Não importa que ele pôde ser generoso, em função da conjuntura da época. Como o próprio Lula reconheceu, ao apoiar a postura de Dilma.

Mas, sem Lula, algo parece trincado na correia de transmissão entre o Planalto e o sindicalismo. As greves podem ser uma reação instintiva de quem perde espaços, para que o governo possa proteger, como disse Dilma, quem não é estável no emprego, a grande maioria dos brasileiros.



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