Artigo - Gideon Rachman |
Valor Econômico |
27/8/2008 |
O Partido Democrata provocará alguma euforia em Denver nesta semana, mas uma nuvem escura de ansiedade paira sobre a convenção do partido. Uma verdade terrível está começando a se abater sobre os democratas. Barack Obama não é o gênio político "único em uma geração" que pensavam ter descoberto. Pelo contrário, é um candidato fraco à Presidência. Com uma economia frágil, uma guerra impopular e com os republicanos desorganizados, os democratas deveriam vencer fácil a eleição presidencial. Mas Barack Obama, o candidato democrata, está emparelhado na corrida com John McCain, seu rival republicano. Com certeza, Obama possui alguns trunfos reais - inteligência, encanto, boa aparência, qualidade de estrela. Mas a história indica que é um candidato muito perigoso. Desde 1968, os democratas venceram apenas três das 10 corridas presidenciais. Seus dois candidatos bem-sucedidos - Jimmy Carter e Bill Clinton - eram brancos governadores com orientação centrista do sul dos EUA. Todas as vezes que os democratas nomearam um liberal de fora do Sul - George McGovern, Walter Mondale, Michael Dukakis, John Kerry -, perderam. Obama é um nortista. É um liberal. Um ex-professor de faculdade. E é negro. Uma escolha ousada, dadas as circunstâncias. A história pessoal incomum de Obama - filho de um queniano negro e uma americana branca, educado em parte na Indonésia - lhe permitiu escrever uma autobiografia fascinante e introspectiva, "Dreams from my father" ("Sonhos de meu pai"). Mas a história da sua vida pode parecer um pouco exótica para a maioria dos eleitores americanos. O começo da vida de McCain poderia ser facilmente adaptado para um filme de Hollywood. A juventude de Obama está mais para uma peça nos palcos fora do circuito de Broadway. McCain pode contar histórias de heroísmo como prisioneiro de guerra no Vietnã. Obama foi um estudante em universidades de elite numa jornada de autodescoberta. Ele escreve: "Para não ser confundido com um traidor, escolhi meus amigos com cuidado. Os estudantes pretos mais politicamente atuantes. Os estudantes estrangeiros. Os chicanos. Os professores marxistas e as feministas estruturalista. Discutimos neocolonialismo, Franz Fanon, eurocentrismo e patriarcado". Mesmo levando em conta o tom de autozombaria, isso não é exatamente a América predominante. Está claro que Obama não tem experiência. Mas isto, em si, não deve ser um obstáculo para chegar à Casa Branca. O mesmo se aplicava a outros democratas que conquistaram a Presidência - John Kennedy, Jimmy Carter, Bill Clinton. Se Obama suspeita que os republicanos estão apelando para o racismo, deve pensar duas vezes antes de revidar: a mídia está ávida por polêmica As primárias democratas, porém - com uma elevada proporção de eleitores liberais negros e brancos - são uma coisa. Uma eleição geral é outra. Além disso, notoriamente, mesmo na disputa democrata, Obama lutou para obter os votos da classe operária branca em Estados importantes como Pensilvânia. Uma pesquisa recente do "New York Times" aludiu ao tamanho da barreira que Obama precisará ultrapassar. Enquanto 5% dos eleitores americanos disseram que não votarão num candidato negro, 27% disseram que, em sua opinião, os EUA ainda não estavam preparados para um presidente negro. Obama fez campanha como um candidato que por acaso é negro, não como um candidato negro. Ao agir assim, ofereceu aos eleitores brancos um reforço da certeza de que ele não é um desses afro-americanos que fala sem parar sobre raça e que tenta fazê-los se sentirem mal. Pelo contrário, votar em Obama pode fazer as pessoas se sentirem bem consigo mesmas e a respeito das relações raciais na América. Portanto, houve uma certa habilidade cínica na acusação da campanha de McCain, de que Obama seria aquele que está "manipulando a carta da raça". Isso desafiou a noção de que Obama seria um "candidato pós-racial" - e satisfez os ressentimentos dos brancos sobre o que alguns consideram ser um tratamento especial dispensado a negros. A pesquisa do "New York Times" mostrou que 26% dos brancos americanos acreditam ter sido vítimas de discriminação. A sensibilidade especial da questão racial coloca a campanha de Obama num dilema quando chega o momento de reagir a ataques. É uma crença generalizada entre os democratas que os candidatos anteriores - em particular, Dukakis e Kerry - perderam porque foram lentos demais ao reagirem às campanhas negativas movidas pelos republicanos. Se a campanha de Obama suspeita que os republicanos estão apelando para o racismo, porém, precisará pensar duas vezes sobre revidar à acusação no mesmo nível. Qualquer acusação desse naipe será arrebatada por uma mídia ávida por polêmicas - colocando a raça no centro da campanha eleitoral. E isso só poderá ajudar a campanha de McCain. É claro, McCain tem as suas próprias vulnerabilidades. Ele está prestes a completar 72 anos - e algumas pesquisas de opinião indicam que os eleitores estão ainda mais hesitantes em votar num aposentado do que em votar em uma pessoa negra. Sua incapacidade de lembrar quantas casas possui sugere que ele é extraordinariamente rico, ou ligeiramente senil - nenhuma dessas idéias é proveitosa para a sua causa. Os fatores estruturais que na opinião dos democratas os favorecem neste ano certamente existem. Os americanos estão num estado de ânimo taciturno sobre a economia e o país em geral. A impopularidade do presidente George W. Bush terá o efeito de um empecilho para os republicanos. Obama arrecadou uma impressionante soma de dinheiro, comandou uma campanha habilidosa que derrotou a formidável máquina dos Clinton e conta com um exército de partidários extremamente entusiasmados. Mesmo assim, ele ainda é um candidato vulnerável. Ele pode perder? Sim, ele pode. |