Política
Pouco a esperar Celso Ming
O presidente da França, Nicolas Sarkozy, é, no mínimo, um forçador de barra. Ou não tem lá muito compromisso com os fatos.
Ao embarcar ontem em Paris para Washington, onde participará da reunião dos chefes de Estado do Grupo dos 20 (G-20) que se realizará neste fim de semana, declarou aos jornalistas que vai demonstrar que 2008 não é 1945 e que o dólar deixou de ser a principal moeda do mundo. E não era o Berlusconi falando; era mesmo Sarkozy.
Ele não vai passar da primeira parte do objetivo declarado à imprensa. Nem precisa insistir; ninguém acha que 2008 repete 1945. Mas está errado no principal. O dólar continua, sim, reconhecidamente a principal moeda do mundo.
O país mais encrencado pela crise são os Estados Unidos. E, no entanto, na pior hora e apesar de tudo, quando é preciso encontrar um porto seguro, todos correm para o dólar e para os títulos do Tesouro americano (T-Bonds). Como negar isso, presidente Sarkozy?
Declarações assim parecem sugerir que a reunião de cúpula, que se imaginava destinada a traçar as diretrizes para a reformatação do sistema financeiro global, não vai passar de um congraçamento, se chegar a tanto.
Três obstáculos hoje aparentemente intransponíveis impedem que se espere mais do que isso desse encontro. O primeiro deles é que não há muito o que negociar com o presidente George Bush, que ainda representa a maior potência econômica da atualidade.
Bush não tem mais o que dizer. Não está em condições de decidir nada com quem quer que seja, porque o balcão atrás do qual está hoje terá outra administração em questão de semanas. A hora é mais de uma festa de adeus do que de reformatação das pilastras da economia. E Barack Obama, o novo chefe, não quer se meter antes da hora.
O segundo obstáculo é que o momento não é de confronto, por maior que sejam as divergências entre Estados Unidos e Europa. Os mercados estão especialmente vulneráveis a cabos-de-guerra entre os senhores do mundo. Se virem meia dúzia de chefes de Estado apontando para direções opostas, o risco é que se desmanchem.
E, finalmente, com Bush e depois de Bush, os Estados Unidos não querem mudanças. Ao contrário do que vai trombeteando Sarkozy, o mundo adora o dólar, confia nele muito mais do que se imaginava até agora e confia muito mais do que no euro ou na libra esterlina. E confia no título mais cobiçado, que ainda são as promissórias emitidas pelo Tesouro americano. Além disso, quem controla as máquinas que emitem os ativos mais cobiçados do planeta não quer mudar nada.
Para não decepcionar as platéias, os mais ansiosos líderes do G-20 provavelmente encaminharão alguns temas para análise de comissões de trabalho encarregadas de examinar as bases para a reestruturação dos fundamentos do capitalismo.
Se isso se confirmar, vai ser difícil obter dessas comissões mais do que estratagemas para ganhar tempo, sabe-se lá até quando e com que objetivo.
Enfim, não dá para esperar demais desse encontro. O que precisa ser perguntado é até quando a crise espera.
Confira
Disparada - O dólar deu ontem mais um salto, de 3,8%, fechando nos R$ 2,38. A volatilidade ainda é enorme. Basta dizer que, há apenas 43 dias, o dólar estava abaixo de R$ 2.
O Banco Central decididamente não quer esses níveis porque sabe o impacto que provocam na inflação, a partir da alta dos produtos importados.
Mas as intervenções que tem feito, por meio de leilões de dólares e de leilões de títulos amarrados à correção cambial, não estão nem segurando as cotações nem revertendo a tendência de alta. O Banco Central parece sem estratégia na sua política cambial.
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