Poupança Por que o governo quer mudar as regras
Política

Poupança Por que o governo quer mudar as regras


O LEÃO CHEGOU À POUPANÇA

Com a tributação das cadernetas, o governo quer impedir que
elas se tornem um ímã para recursos dos fundos de investimento


Benedito Sverberi

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Quadro: A proposta do governo para a poupança

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• O que pode mudar

Na quarta-feira passada, terminou o suspense a respeito de uma mudança aguardada com apreensão pelos brasileiros. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, reuniram-se para anunciar que a poupança terá novas regras. Historicamente isenta de tributos, ela agora será alvo do imposto de renda. A partir de janeiro de 2010, poderão ser tributados os rendimentos da parcela que exceder 50.000 reais numa aplicação. Dito de outra forma, quem tiver até 50.000 reais depositados não verá sua rentabilidade mordida pelo Leão. Só precisa fazer cálculos quem tem mais dinheiro que isso. Cerca de 1% das cadernetas se enquadra nessa situação – cujos depósitos, no entanto, representam 40% do total de recursos da poupança. Se o rendimento da poupança for a única fonte de sobrevivência do cidadão, a isenção continuará valendo para cadernetas de valores altos, como 1 milhão de reais. Ao fim e ao cabo, um contingente de investidores de classe média pagará mais imposto em 2011 (veja o quadro). Estima-se que o aumento da arrecadação seja de 335 milhões de reais – valor relativamente pequeno para os apetites do Planalto. Na verdade, toda a ginástica com números foi feita para atender a uma única necessidade: impedir que a poupança se tornasse um ímã para recursos de outros tipos de aplicação financeira.

Essa atração já existia. Desde que a taxa básica de juros começou a cair no Brasil, em janeiro deste ano, o brilho da indústria de fundos de investimento foi ficando empanado. Os rendimentos dos investidores começaram a minguar – e sobre eles ainda pesavam a carga fiscal e as altas taxas de administração cobradas pelos bancos. Enquanto isso, a poupança, com sua remuneração fixa de 0,5% ao mês mais a taxa referencial (TR), além da isenção fiscal, permanecia um porto seguro de rentabilidade. Assim, os milionários que meses atrás achariam a ideia risível passaram a considerar a hipótese de migrar dos fundos para a mesma poupança em que o pequeno assalariado guarda aquilo que lhe sobra, quando sobra. A questão é que os fundos são os grandes compradores de títulos públicos – os papéis com que o governo se financia e rola sua dívida. Quanto à poupança, seus recursos são vinculados por lei à utilização no crédito imobiliário. Os depósitos em fundos perfazem hoje mais de 1 trilhão de reais, enquanto os da poupança somam 270 bilhões de reais. Invertidas as proporções, haveria uma fartura de dinheiro para construir casas, ao passo que o governo – e o sistema bancário — se afogaria. "A medida foi a mais pragmática possível nas atuais circunstâncias", diz Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do Banco Central e economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio.

Caso as novas regras da poupança não surtam o efeito desejado, o governo poderá lançar mão de outro artifício: reduzir as alíquotas de IR cobradas do rendimento dos fundos. Na semana passada, o ministro Guido Mantega chegou a dizer que uma medida provisória com essa finalidade já estava no forno. Depois, voltou atrás. "Vamos primeiro avaliar o impacto do que já foi feito", disse ele a VEJA. "Se detectarmos algum movimento indesejável, editaremos a MP." O governo ainda tem de enfrentar a oposição no Congresso. A maioria dos parlamentares resiste à idéia de taxar a poupança.

Mexer nos rendimentos da poupança era algo impensável anos atrás. A proposta atual pode ser lida como um indício das adaptações que o Brasil terá de fazer se a trajetória de queda na taxa de juros continuar. Trata-se de um passo essencial para completar o processo de estabilização em curso há quinze anos. Rendimentos tabelados por lei (os da poupança não são os únicos), que em outros períodos protegiam o poupador da inflação e seus males correlatos, terão de ser descartados. É o preço que se paga para entrar no clube das economias livres e sadias.




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