Quase um milagre econômico
O Estado de S.Paulo
22 Julho 2014
Será quase um milagre econômico. A presidente Dilma Rousseff poderá encerrar seu quarto ano de mandato com a economia brasileira crescendo menos que a dos Estados Unidos e a da zona do euro e muito menos - como há anos - que a da maior parte dos emergentes. Pela primeira vez o crescimento econômico previsto para este ano ficou abaixo de 1% na pesquisa realizada pelo Banco Central (BC), semanalmente, com cerca de 100 economistas de instituições financeiras e de consultorias. Na oitava queda consecutiva, a expansão estimada para o Produto Interno Bruto (PIB) passou de 1,05% para 0,97%. Em contrapartida, a inflação projetada para 2014 diminuiu ligeiramente, de 6,48% para 6,44%, mas continuou muito longe da meta, 4,5%, e muito próxima do limite de tolerância, de 6,5%. Além disso, a previsão para o próximo ano subiu de 6,10% para 6,12%, acompanhando uma projeção pouco melhor para o PIB - aumento de 1,5%.
Economias mais afetadas pela crise iniciada em 2008 já têm desempenho melhor que o da brasileira. As últimas projeções publicadas pelo FMI apontam para os Estados Unidos crescimento de 2% neste ano e de 3% em 2015. Para a zona do euro as estimativas são de 1,1% e 1,5%. Previsões de outras entidades multilaterais e de instituições privadas ficam em torno desses números.
Um novo panorama da economia global será divulgado pelo FMI na próxima quinta-feira. Alguns números serão certamente alterados, mas é fácil prever um detalhe: o Brasil continuará perdendo a corrida para outros países emergentes e em desenvolvimento e para vários desenvolvidos, com crescimento menor e inflação muito maior.
A estimativa pouco menor de inflação em 2014 pode ser compatível com a piora da previsão para o PIB, mas seria muito arriscado apontar nesses números um indício mais claro de estabilização dos preços. A inflação continuará elevada por muito tempo, segundo as estimativas do mercado e também do BC, responsável principal pela política anti-inflacionária. Diante da perspectiva de atividade ainda muito fraca, os economistas consultados na pesquisa semanal continuam projetando juros básicos estáveis até o fim do ano: a taxa básica, a Selic, deverá continuar em 11%.
Para 2015, no entanto, a expectativa é de juros maiores, embora o crescimento econômico esperado ainda seja abaixo de medíocre. A taxa Selic estimada para o próximo ano, de 12%, tem aparecido no relatório do BC há várias semanas. Não se espera, portanto, contribuição importante da gestão orçamentária para a estabilização dos preços. Se houver algum ensaio de austeridade, ainda será insuficiente, mesmo acompanhado de novo aumento dos juros, para derrubar a inflação para menos de 6% ao ano.
O baixo crescimento econômico estimado para este ano e para o próximo está fortemente associado ao mau desempenho projetado para a indústria. Para 2014 a expectativa é de uma produção industrial 1,15% menor que a do ano passado. Na pesquisa realizada quatro semanas antes já se projetava um produto industrial em queda de 0,14%. Para 2015 ainda se calcula algum crescimento para a indústria, mas muito baixo. Em quatro semanas a estimativa caiu de 2,3% para 1,7%.
De acordo com a avaliação dos especialistas consultados pelo BC, a indústria continuará, portanto, muito perto da recessão. Além disso, o crescimento esperado para 2015 ficará muito abaixo do necessário para uma retomada efetiva, depois de três anos muito ruins.
A fraqueza da indústria está refletida nos números muito ruins do comércio exterior. O saldo comercial de mercadorias ficará em apenas US$ 2 bilhões em 2014, segundo a pesquisa. A estimativa para 2015 caiu de US$ 10 bilhões, há quatro semanas, para US$ 9,4 bilhões e depois subiu para US$ 9,8 bilhões na última sondagem. Todos esses números ficam muito abaixo das necessidades brasileiras, porque nem de longe compensam o déficit estrutural das contas de serviços e de rendas. Esse quadro reflete, com muita clareza, o fracasso das políticas industrial e de comércio exterior mantidas há quase 12 anos.