18/06/11
O terreno utilizado pelo clube particular é um bem público, pertencente à Prefeitura, foi cedido sob a condição de ali se construir um estádio de futebol e já deveria ter sido devolvido, pois a condição não foi cumprida, mas, assim mesmo, sua proprietária decidiu prorrogar a cessão. Até agora, o clube não comprovou dispor do dinheiro necessário para a obra, mas nem por isso o estádio deixará de ser construído. Dinheiro do contribuinte será utilizado para isso.A Prefeitura anunciou, além da prorrogação da cessão do terreno, a concessão de benefícios fiscais, que podem chegar a R$ 420 milhões nos próximos dez anos, para a execução da obra. Como já era conhecida a promessa de financiamento do BNDES de cerca de R$ 400 milhões, agora há dinheiro sobrando - não do clube, ressalve-se -, pois já são R$ 820 milhões, bem mais do que os R$ 600 milhões ou R$ 650 milhões que a obra custará, pelas contas dos responsáveis pelo projeto. Tudo isso em benefício de uma entidade privada.
Em resumo, dinheiro público será aplicado numa obra a ser executada em terreno público, mas o resultado não será um patrimônio público, e, sim, um estádio de propriedade privada e de uso privado. Será o novo estádio do Sport Club Corinthians Paulista, no bairro de Itaquera, já chamado de "Itaquerão".
É nesse estádio que deverá ser disputada a partida de abertura da Copa do Mundo de 2014.
Para evitar o risco de fracasso de eventos de grande repercussão, como os que são acompanhados com atenção no exterior, os governantes costumam desengavetar projetos de melhoria dos serviços públicos há muito reclamados.
A construção do estádio e a realização da Copa do Mundo, por exemplo, deverão mudar o bairro de Itaquera, na zona leste da capital. O governo do Estado e a Prefeitura investirão cerca de R$ 480 milhões na região nos próximos três anos, para a criação de um Polo Institucional, que terá fórum, escolas técnicas de nível médio e superior, unidade do Senai, quartel da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros, centro de convenções e um parque, além de uma estação rodoviária, o que beneficiará a zona leste, com 4 milhões de pessoas.
No plano federal, os eventos programados para os próximos anos estão obrigando o governo a acelerar os projetos de ampliação, modernização e adequação do sistema aeroportuário.
São obras urgentes, não por causa dos grandes eventos, mas porque os gargalos que afetam gravemente as operações dos principais aeroportos ameaçam gerar novos caos no sistema, como os de há pouco.
No caso do estádio de Itaquera, porém, o que está sendo anunciado é uma farra esportivo- financeira para beneficiar diretamente um clube particular, sendo a conta transferida para o contribuinte. Haverá outros ganhadores, além do próprio clube. A obra ajudará a melhorar a imagem de alguns dirigentes esportivos e será utilizada por muito tempo por políticos para se apresentar perante o eleitorado.
Não há justificação para o emprego de dinheiro público em obras privadas. A esse respeito, até recentemente o prefeito Gilberto Kassab se dizia disposto a "fazer o que estiver a nosso alcance" para que São Paulo tenha partidas da Copa do Mundo, mas sob a condição de que não fosse colocado dinheiro público na construção de estádios.
Por algum motivo, o prefeito - que tem dedicado muito tempo às conversas para a formação de seu novo partido - mudou de ideia. Ele enviou à Câmara Municipal projeto de lei que dá ao Corinthians o direito de abater o Imposto sobre Serviços (ISS) e o IPTU por dez anos, até o total de R$ 420 milhões. Se isso não é uso de dinheiro público para a construção de estádio, não se sabe o que seja.
A população, que carece de melhor atuação do setor público em áreas essenciais como infraestrutura urbana, sistemas viário e de transporte de massa, saúde, educação e outras, tem o direito de perguntar se não havia melhor aplicação para os escassos recursos da Prefeitura.