Ao entrevistar Lula para sua mais recente edição, a revista Piauí deveria ter cobrado dele que desenvolvesse melhor alguns dos conceitos que defendeu ou afirmações que fez.
Esta, por exemplo: "Não gosto de ser fonte porque eu acho que você estabelece uma relação promíscua com o jornalista, com o jornal, com a revista, com a televisão."
Há fontes que dão informações a jornalistas porque compreendem a natureza do seu trabalho - informar com correção ao distinto público. Nada cobram em troca - nem mesmo um tratamento privilegiado.
Tais fontes são raras, é verdade. Esbarrei em algumas ao longo de 42 anos de jornalismo.
O ex-ministro da Indústria e Comércio do governo Sarney, o empresário Roberto Gusmão, foi uma delas. O ex-senador Jarbas Passarinho, outra.
Antes de assumir a presidência da República, Fernando Henrique Cardoso foi uma fonte preciosa de muitos jornalistas. Nem por isso chiava quando era criticado por eles.
A maioria das fontes repassa informação esperando em troca algum tipo de proteção do jornalista. Ou então que o jornalista embarque sem cuidado na informação que lhe foi oferecida.
Aí poderá se estabelecer, sim, uma relação promíscua entre o jornalista e a fonte. Aí a "veracidade" da informação quase sempre é a primeira vítima.
Tudo depende do jornalista. Do seu maior ou menor grau de honestidade. Da sua experiência ou da falta dela.
Durante o regime militar de 64, Antonio Carlos Magalhães foi uma notável fonte de informações para alguns jornalistas nos quais confiava. Em compensação cobrava deles proteção. E obteve.
O jornalismo econômico lida com números, realidades concretas, embora também sujeitas a interpretações. Imagino que praticá-lo seja menos arriscado.
É essencialmente pantanoso o terreno do jornalismo político.
A política é feita com palavras, gestos e sutileza muitas vezes.
As palavras são traiçoeiras. Nada mais fácil do que dar o dito pelo não dito ou o dito por incompreendido.
Gestos costumam produzir fatos. Mas um fato consumado pode ser revogado por um fato novo.
Lula acostumou-se em ser notícia desde seu tempo de líder sindical. Nunca precisou ser fonte para agradar jornalistas e conseguir virar notícia mais tarde.
A opinião que tem do jornalismo e dos jornalistas é tosca, primária. Não deve ter lido um único livro a respeito do assunto. É dono de uma excepcional inteligência. E um intuitivo por natureza.
Repete que nunca pediu a ninguém para escrever a seu favor. E que não seria o que é se não existisse a imprensa.
Mas uma vez deixou escapar quase sem querer quanto o jornalismo livre e, por livre, crítico, lhe é incômodo. Foi quando disse que gosta mais de propaganda do que de notícia.
Talvez tenha dito o que a maioria dos políticos pensa, mas guarda para si.