O Globo - 14/12/2011 |
Estamos passando por um debate, sem grande publicidade e bastante intenso, que tem evoluído no Congresso Nacional, e nos bastidores do governo Dilma, que é deveras preocupante para a consolidação do estado democrático de direito e do regime republicano [art. 1º/CF 88] em nosso país. Refiro-me à tentativa da implantação do dito "controle social e popular da mídia" já inserido, inclusive, pelo governo federal no 3º Plano Nacional de Direitos Humanos e objeto de recente debate pelo diretório paulista do Partido dos Trabalhadores. Sob o jargão de "controle social ou popular da mídia" podemos colocar em risco uma das garantias constitucionais mais sagradas de nossa democracia: a liberdade de imprensa. Causa preocupação a "fixação" do dito "marco regulatório" das empresas de rádio, jornais e televisão no Brasil. A busca do "controle social ou popular da mídia" não pode evoluir para uma censura estatal ou político-partidária da imprensa, pois violaria o disposto no art. 5º, incisos IV, V, IX e XIV e art. 220 de nossa Constituição Cidadã. A Constituição de 1988, ávida por nos libertar de uma ditadura que governou o nosso Brasil por mais de 20 anos, garantiu em seu texto a liberdade do pensamento; de expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença; e o direito de acesso à informação. Não podemos utilizar como parâmetro em nosso país os nefastos controles sociais e populares da mídia que proliferam na América Latina - como na Venezuela, no Equador, na Bolívia ou ainda em Cuba com o seu célebre jornal "Granma". Essa mídia, fortemente dirigida, de péssima qualidade, está longe de ser democrática e popular. É uma mídia de Estado pautada por governos de partidos praticamente únicos. O povo brasileiro, por certo, também não quer uma mídia de direita como a defendida pelo dr. Goebells no nazismo, que se vangloriava dizendo que uma mentira "dita cem vezes virava verdade". O cidadão tem o direito de fazer a sua escolha diária desta ou daquela emissora de televisão, comprar este ou aquele jornal, ou ouvir esta ou aquela rádio. Escolher o texto que vai ler, a novela a que vai assistir, a música que vai ouvir. O brasileiro quer opções de mídia de qualidade. Evidentemente que matizes ou vertentes de pensamento defendidas por linhas editoriais deste ou daquele veículo de comunicação fazem parte do jogo democrático e ocorrem em qualquer lugar do mundo. O estado democrático não pode arbitrariamente impedir isto. Nos Estados Unidos, por exemplo, temos a Fox News identificada editorialmente com o Partido Republicano e o "New York Times" que se identifica editorialmente com o Partido Democrata. Todavia, nem o primeiro, nem o segundo veículo perdem o senso crítico e deixam de divulgar as notícias com exatidão sob pena de perda total da credibilidade junto à sociedade norte-americana. Devemos estar atentos, pois os regimes totalitários, sob a pecha de populares, instalam-se sempre sob duas formas: domínio do capital e da informação. Não é isto que queremos para as presentes e futuras gerações de brasileiros. A imprensa, como todos os setores da sociedade, possui as suas mazelas e deficiências, mas quem deve fazer esse julgamento é o povo brasileiro dentro de sua livre consciência no pleno exercício da cidadania. É preferível, em relação ao dito e pretendido "controle social e popular da mídia", que o texto Constitucional de 1988 seja preservado na sua acepção mais democrática, nos livrando do risco de um nefasto "controle estatal e político-partidário" da informação. Fico com a velha máxima do grande estadista inglês Winston Churchill: "A democracia é o menos pior dos regimes." Salve a liberdade de imprensa em nosso país e a Constituição Federal de 1988! GABRIEL WEDY é presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe). |