Para a Cúpula de Segurança Nuclear (Nuclear Security Summit), realizada em Washington no fim de semana, estiveram reunidos 46 chefes de governo, inclusive o presidente Lula. O encontro, convocado pelo presidente Barack Obama, tinha como objetivo coordenar ações para fortalecer a segurança internacional, em particular no que diz respeito ao combate ao terrorismo nuclear, uma das preocupações centrais da política doméstica norte-americana desde os ataques de 11 de setembro de 2001. A crescente ameaça das redes terroristas internacionais e a dificuldade para identificar e controlar o comércio de materiais ou de armas nucleares levaram os EUA a mobilizar a comunidade internacional para enfrentar esse desafio. Logo depois de sua eleição, em abril de 2009, para enfrentar a ameaça nuclear do terrorismo internacional, o presidente Obama definiu uma estratégia com propostas visando a: 1) Adotar medidas para reduzir e eventualmente eliminar os arsenais nucleares existentes; 2) fortalecer o Tratado de Não-Proliferação (TNP) e dificultar a proliferação de armas nucleares; e 3) impedir que grupos terroristas possam ter acesso a armas ou materiais nucleares. A agenda da cúpula, refletindo os objetivos do governo dos EUA, concentrou-se no exame de medidas de prevenção do terrorismo nuclear e sobre o acesso de agentes não-estatais a materiais físseis, que poderiam ser utilizados para a produção de explosivos atômicos. Os presidentes concentraram sua atenção nos seguintes tópicos:
a ameaça do terrorismo nuclear;
ações nacionais para prevenção do terrorismo nuclear e proteção de materiais físseis;
o papel da Agência Internacional de Energia Atômica (Aiea) na segurança nuclear; e ações internacionais para prevenção do terrorismo nuclear e proteção de materiais físseis.
A cúpula aprovou um Comunicado Conjunto e um Programa de Ação, cujos elementos, trabalhados em reuniões preparatórias (Washington, novembro de 2009; Tóquio, dezembro de 2009; e Haia, fevereiro de 2010), apontam para medidas visando a alcançar um maior grau de segurança nuclear no desenvolvimento e na expansão do uso da energia nuclear para fins pacíficos. O Brasil manifestou-se favorável à adoção de medidas acautelatórias, mas ressaltou que a questão da segurança nuclear é mais ampla e complexa. O presidente Lula apoiou a iniciativa do presidente Obama e se associou ao consenso para a adoção do documento final do encontro. A discussão sobre segurança nuclear faz-se igualmente relevante diante da necessidade de a operação das instalações nucleares e do manejo do material nuclear serem realizados de forma segura. Sua abrangência, no entanto, deveria ter sido tratada de maneira mais ampla. Segurança nuclear, segundo definição da Aiea, envolve "a prevenção e a detecção de roubo, sabotagem, acesso não autorizado, transferência ilegal ou outros atos maliciosos envolvendo material nuclear, outras substâncias radioativas ou as instalações a ela associadas, bem como a resposta a esses eventos". Nesse contexto, a segurança está vinculada diretamente à proteção física do material nuclear, não apenas para a prevenção do terrorismo, mas, principalmente, para a criação de um ambiente nacional, regional e global seguro que facilite e fortaleça a promoção dos usos pacíficos da energia nuclear. Além de tentar controlar o terrorismo nuclear, preocupação central do encontro, a reunião de cúpula foi uma oportunidade para preparar alguns temas da conferência de revisão do Tratado de Não-Proliferação, que ocorrerá em maio, e para examinar, nos bastidores, a questão das sanções da ONU ao Irã. No encontro de maio, o futuro do tratado será discutido e serão examinados assuntos sensíveis, como a questão do desarmamento nuclear e a da não-proliferação. Esses temas interessam diretamente a países como o Brasil, que tem avanços significativos no domínio do ciclo do combustível nuclear. A questão do desarmamento nuclear tem ocupado uma posição secundária na agenda política internacional em virtude de preocupações mais urgentes como o conflito no Oriente Médio, as guerras do Afeganistão e do Iraque, as diferenças com a China, além de preocupações regionais mais prementes como os desastres no Haiti e no Chile e o terrorismo no Paquistão e na Índia. Há mais de dez anos as negociações relativas ao TNP estão paralisadas pela dificuldade de conciliar interesses divergentes entre os países nucleares e os não nucleares. Nesse período, contra o espírito e a letra do TNP, Índia e Paquistão passaram a integrar o restrito número de países nuclearizados em termos militares, sem oposição das potências nucleares. Israel, que decidiu não participar da cúpula de Washington, embora não o admita, também dispõe de armas nucleares. Com o objetivo de dar impulso a essas negociações, os EUA anunciaram nas últimas semanas duas importantes iniciativas: o acordo com a Rússia para redução em 30% dos estoques de armas nucleares nos dois países e a revisão da política nuclear. A revisão inclui a promessa de reduzir o papel das armas nucleares na estratégia de segurança dos EUA e a proibição, como previsto no tratado, do emprego de armas nucleares contra Estados não nucleares membros do TNP, desde que sejam cumpridas as obrigações de não-proliferação (condição que passou a fazer parte das ameaças ao Irã). Nesta mesma semana, no dia 16, o Irã promoverá conferência alternativa sobre o uso pacífico da energia nuclear. O Brasil deverá adotar uma posição discreta e, com prudente cautela, não enviará delegação de nível alto, por conta do sinal político controverso que isso sugere.
PRESIDENTE DO CONSELHO DE COMÉRCIO EXTERIOR DA FIESP, FOI EMBAIXADOR EM WASHINGTON |