Teoria e Rede
Mais uma vitória do lulismo
Para Singer, o mapa eleitoral de São Paulo demonstra que houve adesão dos eleitores de baixa renda ao que ele considera lulismo, uma demonstração de uma polarização social forte, em curso desde 2006. Nas eleições passadas, o lulismo derrotou seu principal adversário, o PSDB
Vitória em São Paulo fortalece o projeto do governo federal
Foto: Fernanda Estima
André Singer, cientista político, professor na Universidade de São Paulo e membro do Conselho Curador da Fundação Perseu Abramo, faz nesta entrevista à Teoria e Debate uma primeira avaliação do processo eleitoral de 2012, tendo como foco a cidade de São Paulo, que pelas proporções e importância política se destaca no plano nacional. Para o autor de Os Sentidos do Lulismo, o mapa eleitoral da cidade mostra que houve realmente uma adesão dos eleitores de baixa renda ao que ele denominou lulismo
O processo eleitoral de 2012 em São Paulo se caracterizou como um dos mais atípicos. Tivemos em noventa dias uma movimentação bastante intensa nas estimativas de intenções de voto. Qual sua avaliação desse processo eleitoral? O caso de São Paulo se tornou atípico porque o fenômeno Russomano pegou todo mundo de surpresa. Tenho a impressão de que nem mesmo as campanhas estavam esperando que um candidato de um partido muito pequeno, como é o PRD, chegasse a passar um período longo, com o horário eleitoral já iniciado, à frente nas pesquisas de intenção de voto sem sofrer nenhum abalo. Ao contrário, Celso Russomano até cresceu, com cerca de 2 minutos de horário eleitoral gratuito contra dois candidatos com cerca de 7 minutos cada um.
Era esperado que ele tivesse alguma vantagem no começo, pois é muito conhecido, elegeu-se ao cargo de deputado federal muito bem votado em São Paulo, foi candidato a governador na última eleição e, obviamente, porque tinha um quadro na televisão, Patrulha do Consumidor, bem popular. Então, existe um fenômeno de recall, as pessoas lembram o nome.
De um lado, um candidato com muita rejeição, José Serra; de outro, um candidato pouco conhecido, Fernando Haddad, e Russomano como uma espécie de efeito memória, ou seja, o eleitor não estava tão inclinado a votar nele, mas o conhecia mais.
O fato não foi surpreendente. A surpresa foi ele ter ficado quase um mês, já iniciado o horário eleitoral, em primeiro lugar, ainda crescendo. E depois, uma vez que todos já tinham se acostumado com a ideia de que ele iria para o segundo turno, foi uma enorme surpresa ele ter caído tanto em pouquíssimos dias, a ponto de ficar em terceiro lugar. O que tornou o processo eleitoral de São Paulo atípico foram essas duas surpresas, as duas relacionadas à candidatura Russomano.
Não sendo isso, o quadro era razoavelmente previsível: o candidato do PSDB com dificuldades, tendo em vista a forte rejeição à gestão que estava terminando, de Kassab, um prefeito ligado a Serra; por outro lado, um candidato do PT pouco conhecido, que precisaria de um tempo longo de exposição, sobretudo no horário eleitoral, para se tornar conhecido.
E a queda de Russomano se deu porque ele não tinha tempo de televisão?
É difícil afirmar categoricamente porque seriam necessários mais dados e pesquisas mais aprofundadas. Mas a hipótese que parece mais plausível nesse momento é que ele tenha caído em função da proposta de mudança na cobrança do transporte público – as pessoas que viajassem mais tempo pagariam proporcionalmente mais do que as que fizessem percursos mais curtos. Aparentemente esse foi o dado que o derrubou a ponto de não ir para o segundo turno.
É preciso dizer que, não obstante essa queda abrupta, ele acabou tendo 22% dos votos no primeiro turno, o que não é pouco. Em uma cidade como São Paulo, com um colégio eleitoral praticamente do tamanho de Portugal, foi um resultado que faz dele um personagem que provavelmente continuará com alguma relevância na política paulistana e, talvez, paulista.
O que explica o fato de uma eleição municipal em São Paulo extrapolar para o plano nacional?
Uma cidade com um colégio eleitoral excepcionalmente grande, com um orçamento também muito grande, tem um peso político desproporcional. No caso das eleições municipais no Brasil, eu diria que há todas e a de São Paulo. Evidentemente, São Paulo não é a capital administrativa do país, mas é hoje a capital que tem maior peso político.
Assim, as questões políticas acabam tendo grande peso na eleição?
Curiosamente, sim e não. A cidade tem muito peso político e a eleição local tem repercussão nacional e até internacional, mas a eleição propriamente não é completamente nacionalizada. O eleitor sabe que está votando em alguém que vai cuidar das questões da cidade. Não é, por exemplo, um voto contra ou a favor do governo federal, como se pode pensar.
Há algum tempo, as eleições municipais no Brasil têm sido tratadas da seguinte forma: se o candidato do governo federal ganha em São Paulo diz-se que o governo federal ganhou e, se perde, quem perde é o governo federal. Isso é um erro, porque o eleitor não está votando desse modo. A eleição, embora tenha repercussão nacional, não é nacionalizada. Em 2012, o eleitor paulistano votou, assim como ocorreu na grande maioria das capitais, em boa medida contra a gestão do prefeito que está terminando o mandato.
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