Há pessoas que pertencem ao grupo dos gigantes. Não são naturalmente muitos, mas alguns poucos conseguem assumir esse estatuto no nosso quadro de referência. E o que faz deles gigantes é precisamente o facto do seu brilhantismo ser acompanhado de uma magnifica acessibilidade. O Medeiros Ferreira é para mim desses gigantes. Digo-o sinceramente e sem qualquer tipo de exagero. E é também por isso que a notícia da sua partida deixa-me com um natural vazio.
O Medeiros Ferreira foi meu professor na FCSH-UNL. Era aquele conterrâneo brilhante lá da Faculdade, com quem no fim das aulas, de vez em quando, trocava uma ou outra cumplicidade sobre a política nacional e sobre a política açoriana. Mais tarde, foi meu co-orientador na tese de mestrado. Aí sim tive oportunidade de conviver com ele mais de perto, discutindo temas "nada interessantes" como o final do Estado Novo, o 25 de Abril, a forma como se estruturou o sistema partidário português e o seu reflexo nos Açores. Sem grande esforço, mas longe de qualquer petulância ou paternalismo, a assertividade dos seus comentários e sugestões representavam aquele toque que todo o mestrando precisa para melhor orientar a sua investigação.
Mais tarde, quando me candidatei a doutoramento, Medeiros Ferreira veio claro novamente a bordo. Era incansável a este respeito. E tremendamente acessível. Guardo preciosamente na memória as vezes que o encontrei no Princípe Real para discutir temas de tese, problemáticas a desenvolver, etc.
Mais tarde ainda, nas andanças blogosféricas, trocamos um vez ou outra ideias sobre temas diversos. Acompanhá-lo no Bicho Carpinteiro e, mais tarde, no Córtex Frontal era obrigatório. Sobretudo aprendendo como é possível fazer grandes posts com apenas uma ou duas frases. Era um mestre blogosférico neste sentido. Simplesmente brilhante.
No entanto, para além de todas as experiências vividas com o próprio, nestes momentos de partida salta-nos sempre à vista as qualidades que tornavam alguém grande: Inteligência e lucidez, independência e irreverência, com um sentido de humor apurado e com uma atitude que não escondia o seu gosto pela vida. Um líder, um grande intelectual e académico que fazia política inteligente e que importava ouvir para obter uma visão moderada, mas assumidamente de esquerda sobre o país e o mundo.
Felizmente, gigantes como Medeiros Ferreira não chegam de facto a partir. Ficam cá, como referência, com obra feita, fazendo escola até... É isso que, nestes momentos, nos serve para colmatar o tal sentimento de vazio.
Um grande abraço, Professor.
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