Em nova ação conjunta, sete dos mais importantes bancos centrais (BCs) do mundo, liderados pelo Federal Reserve (Fed) dos Estados Unidos, anunciaram ontem um corte de 0,50 ponto porcentual nos seus juros básicos. É mais uma tentativa de transmitir segurança aos mercados financeiros e uma primeira medida para reanimar economias muito enfraquecidas. Além do Fed, reduziram seus juros o BC europeu, o inglês, o chinês, o suíço, o canadense e o sueco. O corte simultâneo de juros foi um passo na direção certa, mas é preciso fazer muito mais, segundo o economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI), Olivier Blanchard. A novidade não altera as projeções do Panorama Econômico Mundial divulgado ontem pela instituição. Segundo o relatório, a crise financeira deve frear a economia mundial em 2009, reduzindo seu crescimento de 3,9% em 2007 para apenas 3% - e essa média só será possível porque os emergentes, liderados pela China, ainda manterão um bom ritmo de expansão. O Brasil não será poupado, mas a projeção não é tão assustadora: crescer 3,5% ainda será um desempenho razoável nas circunstâncias previstas.
O cenário traçado pelo FMI é especialmente sombrio para as economias desenvolvidas, as mais afetadas, até agora, pelo tumulto financeiro. Na zona do euro a produção deverá aumentar 0,2% em 2009. Nos Estados Unidos, ainda apontados como o epicentro da crise, o Produto Interno Bruto (PIB) deverá expandir-se 0,1%. Há certo otimismo nessas previsões: os economistas do FMI admitiram, como hipótese, algum sucesso das políticas de estabilização financeira nos mercados europeu e americano.
Para a contenção dos estragos e a estabilização dos mercados, o FMI propõe uma fórmula surpreendente, quando se consideram os padrões defendidos tradicionalmente pela instituição: os governos devem capitalizar os bancos viáveis, promover a liquidação dos muito enfraquecidos e livrar o sistema dos ativos podres, isto é, dos créditos de qualidade muito baixa. É o novo realismo do Fundo, subscrito pelas autoridades americanas. Quando os problemas são muito graves e ameaçam a saúde de toda a economia, uma intervenção mais ampla do Estado é justificável, disse na terça-feira, num discurso, o presidente do banco central americano, Ben Bernanke.
Não são apenas palavras: o Tesouro dos Estados Unidos foi autorizado, na semana passada, a aplicar até US$ 700 bilhões no auxílio ao setor financeiro, a começar pela compra de ativos podres. Os governos europeus ainda não se animaram a ir tão longe, embora venham ampliando, pouco a pouco, o alcance de suas intervenções.
Ações desse tipo já não servem, segundo o FMI. O diretor-gerente do Fundo, Dominique Strauss-Kahn, cobrou maior ousadia dos governos, numa exortação dirigida, principalmente, embora de forma implícita, às autoridades européias. É hora, segundo ele, de abandonar as intervenções picadinhas e trabalhar no atacado, com políticas de alcance muito mais amplo.
Em seu novo Relatório de Estabilidade Financeira, os economistas do FMI não se limitam a propor medidas mais audaciosas. Cuidam de justificá-las, pintando um cenário de cores nada festivas. O fim da crise não está à vista. Os prejuízos globais vinculados a operações iniciadas com títulos americanos foram estimados, em abril, em US$ 945 bilhões. A nova estimativa do FMI indica US$ 1,4 trilhão. Para voltar à normalidade, os maiores bancos globais precisarão levantar, nos próximos cinco anos, US$ 675 bilhões de capital, além de vender cerca de US$ 1 trilhão de ativos não-essenciais ao seu negócio.
Nada parecido com isso atingiu os bancos brasileiros, em geral capitalizados e seguros. Mesmo assim, o crédito no Brasil encareceu, desde a redução das linhas externas. O setor produtivo é vulnerável à piora das condições no mercado financeiro global. Isso exige ação das autoridades, por enquanto de caráter preventivo. O BC reagiu imediatamente aos novos desafios, oferecendo ao mercado melhores condições de liquidez. Noutras áreas da administração federal a reação vem sendo mais lenta - prejudicada pela preocupação de mostrar o Brasil como ilha de tranqüilidade num mundo de insegurança criada pelas grandes potências. Mas o presidente da República reconheceu, afinal, a gravidade da situação e parece haver aderido ao realismo do BC.
Essa foi a boa notícia da semana.
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