Perplexidade A entrevista do senador Jarbas Vasconcelos deixou os políticos sem fala. Mas a sociedade brasileira não pode calar |
A entrevista de Jarbas Vasconcelos, publicada na edição passada de VEJA, deixou Brasília em estado de perplexidade. À explicitação – tão serena quanto desencantada – do senador pernambucano de que seu partido, o onipresente PMDB, é um ninho de corrupção e fisiologismo, o Palácio do Planalto, que dá mundos, fundos e latifúndios para manter a agremiação na base governista, não se manifestou. Preferiu apostar no poder dissipador de crises do Carnaval brasileiro. A oposição, por sua vez, conseguiu produzir um silêncio ainda mais eloquente: afinal de contas, como romper um namoro, com vistas à eleição presidencial de 2010, que pode dar em casamento? A reação mais reveladora do grau de esgarçamento da política brasileira partiu, no entanto, da cúpula peemedebista. Diante da afirmação, feita por um integrante histórico do partido, de que "boa parte do PMDB quer mesmo é corrupção", os caciques da agremiação divulgaram uma nota vaga em que o acusam de lançar uma sombra de suspeição sobre todo o sistema e deram o assunto por encerrado. Mais nada. Não recorreram nem mesmo àquele vício que presta elogio à virtude, o da hipocrisia. Hipocrisia de afirmar, por exemplo, que seria aberta uma sindicância interna ou que Jarbas seria chamado a se explicar. Ao comentar a repercussão da entrevista de Jarbas junto à cúpula do PMDB, o jornal O Estado de S. Paulo, em editorial, deu-lhe contornos definitivos: "Com sua murmurada resposta, o baronato partidário passou o proverbial recibo ao denunciante, elevando inadvertidamente os seus argumentos à categoria de constatação de uma realidade objetiva".
As reações partidárias são um péssimo termômetro para medir a febre de corrupção que desde sempre acomete o tecido político do país – em seus níveis municipal, estadual e federal. Para avançar nessa questão, a sociedade brasileira não pode deixar cair no vazio a entrevista corajosa do senador. VEJA espera ajudar nesse sentido, com a reportagem que começa na página 44. Além de revelar detalhes do antigo caso de amor do PMDB com o dinheiro do contribuinte, a reportagem elenca os caminhos mais factíveis para tentar deter as delinquências na esfera pública. A transparência nos gastos, gestão eficiente e, principalmente, o fim da impunidade de corruptores e corruptos, tais são as linhas mestras.
O Brasil é um país mais corrupto do que muitos não porque nossa índole seja pior do que a de outros povos. O que nos é peculiar nesse campo é a impunidade. Os corruptos se beneficiam principalmente de um sistema judicial convoluto, que permite recursos, manobras e adiamentos praticamente sem fim. O resultado disso tudo é o incentivo à prevaricação. Essa lógica precisa ser invertida, de modo que roubar dinheiro público se torne complexo e a punição aos culpados, inescapável. Só assim as coisas começarão a mudar no Brasil.