A calvície ronda, também, as mulheres
Política

A calvície ronda, também, as mulheres


De arrepiar os cabelos

O corte curtinho de Victoria Beckham pode virar moda, mas
também pode ser tática contra a queda de cabelo, problema
que, em outra injustiça da natureza, agora afeta as mulheres


Bel Moherdaui

Southern-Press

FALHA À VISTA
Victoria volta às origens depois de anos de megahair, alisamentos e tinturas


Existe coisa pior do que descobrir o primeiro fio branco se projetando com intrusa rebeldia bem na linha de frente da cabeleira. É quando o travesseiro, de manhã, parece cenário de alguma batalha capilar. A quantidade de fios na escova também aumenta a olhos vistos. Um passeio no parque sem chapéu rende queimaduras no couro cabeludo, o rabo-de-cavalo passa a exigir cada vez mais voltas do elástico e as mulheres, tidas como praticamente imunes à calvície, percebem que caminham para ela. Nos últimos anos, queixas de escassez capilar feminina têm se tornado mais frequentes e mais precoces nos consultórios dermatológicos. "Há vinte anos, quem reclamava de queda de cabelo eram pacientes de 50 a 55 anos. Hoje, vemos mulheres de 35 a 40 anos com o mesmo padrão", descreve Andréia Mateus Moreira, coordenadora do departamento de cosmiatria da Sociedade Brasileira de Dermatologia. Nem mulheres com acesso aos mais dispendiosos serviços estéticos escapam. Recentemente, Victoria Beckham, 34 anos, a ex-cantora e mulher do jogador de futebol David, foi flagrada com suspeitas falhas no couro cabeludo. Victoria é uma veterana de anos de alisamentos, tinturas e megahair, a técnica de alongamento em que tufos de cabelo alheio são colados às raízes naturais, com resultados, a longo prazo, nada animadores. Os espaços no meio de campo apareceram justamente quando ela cortou o cabelo curtinho e voltou a algo próximo da cor natural, duas providências comuns para combater a queda acentuada.

A ideia de que a natureza tem suas compensações e que, assoladas pela celulite, as mulheres pelo menos não sofrem com o desaparecimento dos cabelos como os homens é, infelizmente, baseada num pouco natural clamor por justiça. Hoje, calcula-se que metade das mulheres em algum momento da vida terá sintomas de calvície feminina, parte deles tratável e sem maiores consequências além de introduzir termos esdrúxulos no vocabulário – como eflúvio telógeno, que é a queda temporária de cabelos que acontece, por exemplo, no pós-parto, e alopecia areata, nome dado à queda de tufos inteiros, igualmente temporária na maioria dos casos. Mais preocupante, a alopecia androgenética (que acomete com frequência os homens e, como o nome indica, está nos genes) não é reversível com tratamentos clínicos. A única alternativa é o transplante. Embora o efeito estético seja muito mais devastador em termos de imagem, mulheres geneticamente predispostas à calvície têm, pelo menos, uma vantagem sobre os homens: nelas a queda de cabelo é difusa e mais acentuada no topo da cabeça, o que possibilita transplantes bem mais discretos.

Por que, afinal, as mulheres estão perdendo cabelo? "Houve uma grande alteração de hábitos femininos", responde o dermatologista Francisco Le Voci, especialista em transplante capilar do Hospital Albert Einstein. "Elas usam pílula anticoncepcional e têm vida sexual precoce, o que interfere no equilíbrio hormonal. Também sofrem mais stress no trabalho, fumam, consomem mais medicamentos, seguem dietas de emagrecimento mal balanceadas. E ao mesmo tempo abusam dos tratamentos químicos agressivos para deixar o cabelo liso, crespo, loiro, escuro. Tudo isso pode acabar acentuando uma tendência genética que a mulher já tem e que, em outros tempos, talvez não fosse ativada." Segundo Le Voci, o transplante capilar, especialidade desenvolvida tanto por dermatologistas quanto por cirurgiões plásticos, que há dez anos mal era cogitada pelas pacientes, hoje tem nas mulheres 10% a 15% do total de casos. "Em 1991 foi criada a técnica do transplante folículo a folículo. Com ela, passamos a ter uma cirurgia com resultado mais natural e com um aproveitamento muito maior da área doadora. Antes disso, eram usados grupos de dez a quinze folículos, o que deixava tufos na cabeça do paciente", explica o cirurgião plástico mineiro Marcelo Pitchon, especializado em transplante. Pitchon costuma fazer o transplante com fios longos (de até 15 centímetros), e não curtíssimos como a maioria dos médicos. "Embora os fios transplantados caiam em algumas semanas, com essa técnica a paciente pode ver o resultado que terá dali a um ano, um ano e meio", diz.

Além da cirurgia, que exige tempo e habilidade dos médicos, com custo em torno de 15 000 reais, há uma série de tratamentos clínicos e tópicos para estimular o crescimento de cabelos. Entre eles o uso de antiandrogênicos (que bloqueiam a ação da testosterona; esse hormônio masculino, responsável pela energia e pelo vigor sexual, também faz coisas feias, como a miniaturização e o posterior desaparecimento do folículo capilar), ativadores da circulação, laser e até escovas vendidas pela televisão. "Tratamento de queda de cabelo é como receita de bolo. É a associação de vários ingredientes", afirma Le Voci. A dermatologista Andréia Moreira avisa, porém: "O uso de medicamentos pode até fazer nascer algum cabelo, mas não transforma ninguém em leão. E, se a pessoa parar sem indicação do médico, o efeito acabará".




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