Ainda os aeroportos... vamos esperar - Josef Barat
Política

Ainda os aeroportos... vamos esperar - Josef Barat



O Estado de S. Paulo - 05/05/2011
 

 

Recente Nota Técnica elaborada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostra que, em 2010, 14 dos 20 maiores aeroportos administrados pela Infraero operaram acima da sua capacidade nominal. Isso porque, de 2003 a 2010, o número de passageiros/ano passou de 71 milhões para 154 milhões - um crescimento médio anual acima de 10%. Mas os investimentos realizados nesse período não removeram os enormes gargalos que travam o desenvolvimento do transporte aéreo e infernizam a vida de passageiros e tripulantes.

Embora atingindo R$ 8,8 bilhões (média anual de R$ 1,1 bilhão), as aplicações feitas por Infraero e Orçamento Fiscal não solucionaram as insuficiências ou deficiências nos diversos componentes da infraestrutura aeroportuária (pistas, pátios, controle de tráfego, acessos e estacionamentos e terminais de passageiros e cargas) diante do acelerado crescimento da demanda. Os planos, projetos e ações de longo alcance foram preteridos em favor de medidas paliativas e pontuais, dificultando o encaminhamento de soluções mais duradouras. A nota ressalta que o nível mais elevado de investimentos (R$ 1,5 bilhão) ocorreu em 2006, justamente no auge do "apagão aéreo". Neste ano, o custo dos congestionamentos provocados pelo apagão foi estimado em R$ 1 bilhão.

Vários estudos realizados em 2009 e 2010 - entre eles um mais amplo, feito pelo Ipea; um da Coppe-UFRJ; um feito pela MacKinsey para o BNDES; e um da Fiesp - apontaram, em horizontes variáveis de tempo, uma futura média anual de investimentos em torno de R$ 1,5 bilhão, pouco mais elevada que a de 2003 a 2010. São previsões otimistas, tendo em vista a pressão decorrente da realização da Copa e da Olimpíada, eventos importantes para mobilizar a opinião pública em relação ao problema dos aeroportos e pressionar o governo.

Mas cabe lembrar que o planejamento e a remoção dos gargalos não podem ter a Copa como horizonte temporal. Até porque a nota do Ipea aponta para a saturação dos principais aeroportos logo depois de realizados os investimentos previstos para o evento. Para ficar num exemplo, se a capacidade de Guarulhos passar dos atuais 20,5 milhões de passageiros/ano para 35 milhões em 2014, a tendência de crescimento da demanda aponta, para este ano, uma movimentação de 39 milhões. Da mesma forma, Brasília, Confins, Porto Alegre e outros já estariam saturados finda a Copa. Se, para cada 1% do crescimento do PIB, a demanda pelo transporte aéreo respondeu com 3,2%, entre 2003 e 2010, as previsões consideraram uma elasticidade-renda bem inferior, de 2%. O quadro é preocupante e exige mudanças radicais de atitude do governo.

Um sistema complexo com vários segmentos que se articulam, como o da aviação civil, impõe uma competente coordenação e gestão de riscos. A restrição de capacidade num dos segmentos afeta a capacidade dos demais. Se as empresas aéreas atenderam a um crescimento de 80% da demanda com acréscimo de 20% nas frotas, isso é sinal de que operam com melhores modelos operacionais e utilização das aeronaves. Mas, se as infraestruturas, aeroportuária ou aeronáutica, não oferecem condições de acompanhar as novas formas de operação, o sistema como um todo corre o risco contínuo de colapso.

A criação da Secretaria de Aviação Civil pode ser uma solução, mas traz um problema: tirou do sistema uma unidade alcançada no Ministério da Defesa com a vinculação da Infraero, Anac, Decea e Cenipa à mesma autoridade. Por outro lado, se a participação do capital privado é bem-vinda, não se têm ainda modelagens consistentes, capazes de dar sustentação aos processos licitatórios em tão curto espaço de tempo.

O debate provocado pela nota do Ipea faz lembrar uma entrevista do rabino Sobel. Sua resposta sobre a pendência de dois milênios entre judeus e cristãos quanto ao Messias foi: "Vamos esperar! Se, ao chegar, disser que está vindo pela primeira vez, os judeus tinham razão. Se disser que está voltando, os cristãos tinham razão". Esperemos, pois, a Copa para ver quem tem razão...




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