Celso Ming -Funilaria reformada
Política

Celso Ming -Funilaria reformada


O Estado de S. Paulo - 11/07/2009
 

 

 
Nada menos que US$ 50 bilhões depois, a General Motors Corporation (GM) recomeça o processo de volta à vida.

Seu presidente, Fritz Henderson, anunciou ontem "uma transformação histórica" e o "início de uma nova era". A nova GM renasce mais magra, depois de aposentar metade de suas marcas (Saturn, Hummer, Opel e Pontiac), fechar 21 mil postos de trabalho, desativar ou paralisar 14 indústrias, desfazer-se de 1,1 mil revendedoras e transformar-se numa empresa ao menos provisoriamente estatal. Perto de 61% do seu capital foi subscrito pelo Tesouro dos Estados Unidos.

A decisão de salvar a GM foi política e suas consequências são imprevisíveis. Nos quatro cantos do Planeta, o setor de veículos vem recebendo atenções fora do comum dos governos. E assim foi com a GM. Mas o risco de que seja engolfada por um desses arranjos artificiais pode ser alto. Desde os anos 80, a Chrysler vem recebendo transfusões após transfusões e até agora não se aprumou.

No passado, outros setores ganharam atenção parecida do governo americano, especialmente as companhias de estradas de ferro e as usinas siderúrgicas. Mas essas intervenções não foram suficientes para resgatá-los.

Uma indústria também está sujeita às leis da vida. E chega o dia em que enfrenta o processo de envelhecimento. Sua transferência para outros países ou, mesmo, sua substituição fazem parte do desenvolvimento que o economista austríaco Joseph Schumpeter chamou de destruição criativa do processo empreendedor.

Não dá para dizer que o principal responsável pelo fracasso da GM em manter-se sobre suas próprias rodas tenha sido o mercado americano que a levou a concentrar linhas de produção nos SUVs, os beberrões de combustível. Lá mesmo, nos Estados Unidos, em apenas 30 anos as montadoras estrangeiras comeram, fatia por fatia, seu mercado que já foi de 50% e hoje não passa dos 20%.

Não há nenhuma garantia de que essa intervenção consiga mudar a cultura da GM, a verdadeira causa da prostração a que chegou. E não está claro que essa fantástica injeção de recursos tornará a empresa competitiva diante dos novos desafiadores do setor, especialmente a japonesa Toyota e a sul-coreana Hyundai.

Essa intervenção tem características de subsídio, prática condenada pelos acordos internacionais de comércio. A Embraer foi derrotada nos tribunais da OMC só por ter tirado algum proveito de juros favorecidos proporcionados pelo governo brasileiro. No passado, o PT condenou a distribuição de créditos de ICMS a montadoras que decidissem instalar-se em alguns Estados brasileiros. Para combater o que chamou de guerra fiscal, em 1999 o então governador do Rio Grande do Sul, Olívio Dutra, cortou os favores que haviam sido arrancados pela Ford do governo anterior. O que não dizer então desses US$ 50 bilhões em dinheiro público injetados apenas na GM?

Outro foco de preocupação é a aplicação do princípio de que uma instituição que envolva risco sistêmico (quebra em cadeia) não pode falir.

Até recentemente, só bancos e quase bancos haviam tido esse tratamento. Agora, a principal justificativa para a operação GM foi a de que sua liquidação causaria ondas de falências pela economia. Mas, se é assim, haverá recursos públicos que deem conta de tanta quebra sistêmica? E quais serão as consequências?



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