O assassino e sua inspiração
Semelhança entre dois massacres em escolas na Finlândia
em menos de um ano mostra como o "efeito imitação" serve
de estímulo para crimes cometidos por alucinados
Thomaz Favaro
Fotos AP, Reuters e NBC/AP | COINCIDÊNCIAS REVELADORAS O finlandês Matti Saari (à esq.), em foto divulgada em seu website, posa imitando seus ídolos. Abaixo, os assassinos Cho Seung-hui (à dir.), que matou 32 pessoas na universidade Virginia Tech, nos Estados Unidos, e o finlândes Pekka-Eric Auvinen, que assassinou oito pessoas na escola em novembro passado |
Vestido de preto e com o rosto coberto por uma máscara, o estudante Matti Saari, de 22 anos, entrou na escola técnica de Kauhajoki, na Finlândia, na terça-feira passada, e foi direto para a classe, onde seus colegas do curso de culinária estavam fazendo uma prova. Nas duas horas seguintes ele cometeu um massacre. Com uma pistola semi-automática Walther P22, Saari disparou calmamente contra os estudantes em pânico. Depois, colocou fogo nos corpos, que, carbonizados, precisaram de exame de DNA para ser identificados. A polícia, quando chegou à escola, foi recebida a bala. Por fim, como é de praxe nesse tipo de crime, Saari encostou a arma na própria cabeça e apertou o gatilho. Tinha matado nove estudantes e um professor.
O crime chocou a Finlândia não apenas por suas vítimas – mas também pela repetição do enredo. Foi o segundo atentado em uma escola finlandesa em menos de um ano. Em novembro de 2007, o estudante Pekka-Eric Auvinen, de 18 anos, entrou com uma pistola na escola secundária de Jokela, nos arredores da capital, Helsinque, e matou oito. Antes dos ataques, ambos divulgaram na internet vídeos com ameaças e exibição de armas. Saari viajou para comprar sua arma na mesma loja em que Auvinen tinha adquirido a sua, uma evidência de que o primeiro massacre lhe serviu de inspiração. "Não são meras coincidências. Quanto maior a atenção dada a um massacre como esse, maior é a possibilidade de ele ser imitado", disse a VEJA o sociólogo e criminologista americano Jack Levin, da Universidade Northwestern, nos Estados Unidos, estudioso dos massacres em escola.
Matt Dunham/AP |
UM PAÍS DE LUTO |
Os assassinos em massa recebem um reconhecimento instantâneo e tornam-se pessoas que não podem mais ser ignoradas. O "efeito imitação" estimula outros psicopatas a planejar ataques para concretizar seus delírios de notoriedade, criando uma série de crimes similares. Sabe-se que os dois assassinos finlandeses eram admiradores dos massacres ocorridos em escolas americanas. Tinham estudado, em particular, aquele perpetrado pelo coreano Cho Seung-hui, que matou 32 pessoas na universidade Virginia Tech, em abril do ano passado. Cho, por sua vez, dedicou sua chacina aos "mártires" Dylan Klebold e Eric Harris, os dois adolescentes americanos que haviam massacrado treze colegas na escola secundária de Columbine, no Colorado, em 1999.
O sistema educacional da Finlândia é considerado o melhor do mundo. Há no país um excelente programa de apoio aos alunos com problemas mentais, psicológicos ou com dificuldade de aprendizado. Saari, um aluno mediano, jamais esteve sob suspeita no colégio. Era considerado um rapaz quieto, mas não solitário. Aos amigos, reclamava do assédio sofrido na escola secundária, cursada a 290 quilômetros dali, em sua cidade natal. Confessou também que procurou um psicólogo e chegou a tomar tranqüilizantes. Na internet, Saari escreveu que a misantropia, a aversão à sociedade humana, era sua filosofia de vida. Postou vídeos no YouTube em que aparecia praticando tiro, motivo pelo qual foi interrogado pela polícia no dia anterior ao crime. Como não havia cometido nenhum delito – Saari fazia parte dos 13% da população finlandesa com licença para portar armas –, foi liberado. No dia seguinte, após o massacre, a polícia encontrou seu bilhete suicida: "Odeio a humanidade e quero matar o maior número de pessoas possível". Era tarde demais para conter o maluco assassino.