Andar na contramão é algo que o governador de São Paulo faz com relativa frequência – um traço de personalidade –, embora não o faça com estardalhaço, por uma questão de cálculo. Foi um crítico contumaz da condução da política econômica no governo Fernando Henrique Cardoso e continua na mesma posição em relação às escolhas do governo Luiz Inácio da Silva na área. Marca posição aqui e ali, mas não confronta quando não lhe interessa comprar uma briga do ponto de vista político.
A menos que, medidos os riscos, valha a pena. É o caso agora, quando sofre pesada pressão dos aliados para assumir a candidatura a presidente da República em 2010 e rechaça todas elas com veemência. “Não posso evitar que uns me ataquem, outros me provoquem, outros me estimulem como se eu fosse candidato. Entendo os que atacam, tento ignorar os que provocam e agradeço aos que estimulam. Sei conviver bem com essa espécie de diversidade, fico onde estou e não assumo candidatura antes da hora.”
Empenhado em não arrumar confusão com o eleitorado – para seu projeto de se eleger presidente bem mais importante que as reclamações de correligionários ou provocações do adversário –, Serra acha a antecipação da campanha, antes de tudo, contraproducente.
“Primeiro, porque dificulta o combate à crise econômica. O governante, em vez de enfrentar, tende a negar a crise; substitui a eficiência pela afobação, entra em confronto com as forças políticas no momento em que há muito mais necessidade de cooperação e tende a governar menos e a fazer mais espetáculo”, analisa e dá como exemplo o governo federal, cujas energias se desviam para a campanha eleitoral, mais que antecipada, permanente.
“Isso favoreceu a paralisia do governo durante seis meses em relação à política monetária, na contracorrente de todo o mundo, o que permitiu o aprofundamento da crise internamente, devido ao sumiço do crédito.” Na opinião dele, o ambiente eleitoral estimulou “o espetacular aumento de gastos de custeio no governo federal, presente e futuro, prejudicando a elevação de investimentos e dificultando, agora, a correção do problema.”
Em segundo lugar, Serra acha que a campanha antes da hora só serve para irritar o eleitorado. Principalmente no caso de candidatos governantes. “Fui eleito em primeiro turno, tenho responsabilidade de governar um estado difícil onde a crise tem seu maior impacto. O cidadão comum não está pensando em eleição nesta altura. Imagine se começo a fazer discurso de candidato. Qual seria a leitura? A de que estou pouco ligando para os problemas objetivos, preocupado apenas com tititi eleitoral. No dia seguinte seria massacrado pela imprensa e condenado pela população.”
O governador acha essa antecipação “espantosa” e lembra que nunca foi essa a prática. “Em março de 1988, de 1993 ou de 2001, ninguém estava falando nas eleições presidenciais dos anos seguintes, não havia nenhuma definição.”
E por que há agora? Serra prefere deixar a resposta para gente despida de compromisso partidário. “Como um dos possíveis, e não mais do que possíveis, candidatos no ano que vem, minhas hipóteses poderiam soar, digamos, eleitorais.”
Não seria a hora nem o caso de dizer, por exemplo, que isso acontece porque o presidente Lula gosta mesmo é de um palanque. Fazendo campanha, dá a impressão de governar sem precisar governar de fato, no estrito senso do ato.
O tempo de Lula é o tempo de Lula, avalia Serra, que não considera, por isso, que a oposição deva atuar no mesmo tempo Nem para fazer frente à campanha do adversário, hoje correndo sozinho com Dilma Rousseff?
Na visão de Serra, a oposição só teria a perder pelas razões já expostas (seus dois candidatos são governadores) e não teria nada a ganhar. “Ela é a candidata que o PT poderia apresentar, não há outro nome. Isso vale para agora e vale também para o ano que vem.”
Para torná-la conhecida o governo federal não precisaria de mais que os seis meses do prazo legal de desincompatibilização, a partir de abril de 2010, e sem correr o risco de contestações na Justiça Eleitoral. Serra invoca, a título de comprovação, o exemplo do prefeito Gilberto Kassab, em São Paulo. Correr, agora, não adianta nada, na opinião dele. “Dilma crescerá de qualquer maneira, chegará aos 30% só pela força do governo e pelo patamar tradicional de votos no PT.”
Somados os fatores em jogo – crescimento inexorável da principal adversária, condenação da atitude do governante por parte do eleitorado e desvio do foco do enfrentamento da crise com todos os riscos decorrentes –, Serra finca o pé: “Não vou assumir nenhuma candidatura este ano.”
Logo, assume-se desde já o candidato em 2010, correto? “Não digo isso. Quem apostar numa quebra do PSDB por conflitos entre mim e o Aécio (Neves, governador de Minas Gerais) vai perder. Até porque quando um não quer dois não brigam e quando dois não querem aí é que não brigam mesmo.”