Política
Entre o FMI e o poder dos bancos Rolf Kuntz*
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como boa parte da esquerda, parece ter uma paixão secreta pelos grandes bancos. Como todo mundo, ele denuncia as barbaridades do sistema financeiro privado, mas sua campanha mais constante, assim como a de seu ministro da Fazenda, Guido Mantega, é contra o Fundo Monetário Internacional (FMI). O Fundo é uma espécie de Geni, sempre disponível para levar uma descompostura ou para ser apontada como exemplo de ser desprezível. Na Índia, ontem, o presidente voltou a cobrar do FMI maior atenção às mazelas do setor financeiro dos EUA. Na semana passada, em Washington, Mantega havia acusado a instituição de haver sido desatenta à crise em formação no mercado americano. Continuar demonizando a instituição não resolverá nenhum problema do Brasil ou de outro país em desenvolvimento, mas dará uma grande alegria a alguns dos parlamentares mais conservadores do Congresso dos EUA.
Sempre haverá gente capaz de levar a sério discursos anti-FMI. Parte desse público também se opõe à Organização Mundial do Comércio e a acordos comerciais com qualquer parceiro acima da linha equatorial. No entanto, os dados são razoavelmente claros quando se trata da questão financeira: ou se fortalecem as instituições multilaterais, como o FMI e o Banco Mundial, ou a maior parte dos países ficará sujeita ao poder direto dos grandes bancos e, às vezes, à ingerência também direta, sem nenhum amortecedor, do governo dos EUA ou de outras potências de primeira linha.
A percepção desse fato é especialmente importante quando se inscrevem no alto da agenda a regulação e a supervisão do sistema financeiro internacional. Sobre alguns pontos, pelo menos, parece esboçar-se um consenso: é preciso enquadrar todos os tipos de instituições (não só os bancos comerciais), montar esquemas precisos de monitoramento e difusão de informações, tornar a contabilidade mais transparente e instalar sistemas eficientes de alarme e de prevenção de desastres. O presidente da França e do Conselho Europeu, Nicolas Sarkozy, enumerou, ontem, sugestões desse tipo para a regulação do mercado comunitário e, se possível, do sistema global.
Haverá, nos próximos meses, muita discussão política sobre o assunto, com algumas boas idéias e certamente muita retórica, especialmente de tipo terceiro-mundista. Na hora do trabalho sério, o ambiente de assembléia será substituído por estilos de ação mais conseqüentes e mais profissionais.
Uma das questões mais importantes será a divisão de funções entre organismos nacionais e internacionais. Numa economia globalizada, será insensato depender apenas das autoridades nacionais. Mas, para uma solução equilibrada, será preciso ir muito além do Fórum de Estabilidade Financeira, em funcionamento desde 1999 e formado por autoridades de 12 países avançados, 5 instituições internacionais, incluído o FMI, e 6 organismos de regulação e supervisão. Um mecanismo eficiente de acompanhamento e de prevenção de crises terá de operar de forma permanente, com uma equipe de alto nível, um bom sistema de coleta de informações e razoável independência técnica. Esse mecanismo deverá ser o centro do sistema de supervisão e de alerta. Seria um desperdício montar um novo organismo, em vez de atribuir a função ao Fundo, como foi recomendado, na semana passada, pelo comitê político representativo dos 185 países membros, e equipá-lo para isso.
Embora os EUA e outras grandes potências tenham o maior peso político no FMI, proporcional a suas cotas, a instituição tem operado com autonomia técnica e, como fórum multilateral, tem-se mostrado muito mais equilibrado que a ONU. Seus economistas têm sido capazes de antecipar problemas. Alguns críticos deveriam reler (ou ler pela primeira vez) o prefácio do Panorama Econômico Mundial publicado em abril de 2006, há dois anos e meio, portanto. Depois de resumir o cenário central das projeções, o autor do texto escreveu: "Tal cenário seria o proverbial pouso suave. Há possibilidades menos benignas. Por exemplo, o consumo poderá cair mais velozmente do que se prevê quando baixar a espuma dos preços dos imóveis e isso poderá derrubar a confiança e o investimento." A frase seguinte chama a atenção para o conjunto de riscos em torno do cenário central de crescimento robusto. Esse crescimento, confirmando a previsão, continuou até há pouco tempo. Mas o alerta estava lá, com o detalhe da espuma nos preços dos imóveis - no mercado americano, portanto. A leitura atenta pode ser instrutiva.
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