Política
Miriam Leitão A fala de Meirelles
O GLOBO
Esta ata foi diferente. Assim que foi divulgada a ata do Copom, ontem, caíram as taxas de juros no mercado futuro. Os analistas entenderam que o recado do Banco Central era claro: a inflação vai cair mais, e os juros também vão cair mais. O presidente do BC, Henrique Meirelles, me disse que nada é por acaso na ata do Copom. "Tudo é muito bem pensado".
Henrique Meirelles, numa entrevista que me concedeu ontem, contou que o estresse cambial que houve no Brasil a partir da quebra do Lehman Brothers acabou.
Disse que a economia brasileira deve ter um nível de atividade maior no segundo semestre. Ele contou que a decisão sobre a poupança ainda não foi tomada, mas admitiu que mudar o redutor da TR é uma decisão que cabe ao Banco Central, por delegação do Conselho Monetário.
— Qualquer mudança na remuneração tem que passar pelo Congresso, e qualquer decisão de tributação tem que respeitar a anuidade.
O leque de opções é grande, mas não é uma coisa com a qual o poupador deve se preocupar, porque a poupança continuará a ser o grande instrumento de poupança do Brasil.
O presidente do BC informou que o recado que está na ata do Copom sobre a necessidade de "mudança no arcabouço institucional herdado da época da inflação" não se refere só à poupança, mas também aos fundos de pensão.
— Vários fundos têm em seus estatutos uma obrigação de remuneração alta que era o que achava que era o mínimo que conseguiria.
Mas isso numa outra realidade.
A economia mudou muito. Eles terão que mudar esse estatuto porque, senão, não terão onde investir.
Meirelles negou que a preocupação seja com a dificuldade de rolagem da dívida pública.
Ontem foi um dia particularmente intenso. O resultado do teste de estresse dos bancos americanos mostrou que a maioria precisará de mais capital. Meirelles me disse que o caminho escolhido pelos Estados Unidos pode ser mais longo, mas é mais compatível com a economia de mercado.
— A Inglaterra foi pelo caminho mais rápido, estatizou alguns bancos. A partir daí ninguém tinha duvidas de que haveria dinheiro e garantia. O problema é como ter gente preparada no setor público para administrar o mercado financeiro.
Meirelles acha que a economia americana vai deslizar ainda mais antes de melhorar e que o problema dos bancos permanecerá por algum tempo.
— Mas no final, se os bancos não conseguirem captar no mercado o que precisam, o governo dará dinheiro público, o que for necessário.
No fim do processo, em novembro, os bancos estarão capitalizados.
Para a economista Mônica de Bolle, da Galanto Consultoria, como o Tesouro e o Fed disseram que os bancos que precisam se capitalizar são viáveis, o governo dos EUA terá que, de alguma forma, suprir a necessidade de capital dos bancos.
— Uma coisa é o mercado receber bem o resultado do teste. Outra coisa é ter espaço para os bancos se capitalizarem sem o governo.
Se eles não conseguirem captar recursos no mercado, o dinheiro virá do governo.
Até porque, o governo disse que os bancos são viáveis. Ou a instituição é viável, precisa de um aporte, mas pode sobreviver por um período, ou a instituição não é viável — disse ela.
Sobre a situação cambial, o presidente do Banco Central disse que a dívida do Brasil no passado foi muito dolarizada, porque era necessário.
Depois, o BC passou a reduzir o passivo cambial.
Em seguida, passou a ter uma posição comprada no futuro.
— No início da crise, estava com US$ 22 bilhões, e isso foi fundamental, porque o Banco Central pôde vender dólar. Vendemos mais do que tínhamos, e passamos a resgatar essas posições. Agora, zeramos nossa posição.
Para Meirelles, aquele estresse cambial já acabou.
— Por todas as indicações de hoje, já passou sim.
Ainda há muita incerteza, estamos preparados para reversões, mas aquele estresse passou.
Sobre a ata do Copom, ele não quis falar muito.
— Ata de Copom não se explica, se publica. Até porque, se for explicar, vira outra ata. Cada frase lá é discutida, cada palavra, a sequência, tudo para ter uma comunicação explícita. Nada está na ata por acaso.
Tudo foi bem pensado.
O mercado entendeu, e ele não contradisse, que os juros vão cair mais rapidamente, porque o nível de atividade está mais fraco e os riscos inflacionários são menores. Para o economista José Márcio Camargo, da PUC, o Banco Central está vendo uma provável retomada da atividade, mas de forma bastante lenta.
— O BC chama a atenção, em vários pontos da ata, para o elevado grau de ociosidade na indústria, com o desemprego aumentando e pessoal subutilizado. O Banco Central está prevendo pouca pressão inflacionária para o restante de 2009 e para 2010.
Quando perguntei sobre carreira política, ele disse que é precipitado, porque está inteiramente focado no Banco Central e na crise econômica.
— Num certo momento decidirei, ou pela carreira política ou por voltar ao setor privado.
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