Petróleo O início da exploração das reservas do pré-sal
Política

Petróleo O início da exploração das reservas do pré-sal


Bilhões para tirar 
bilhões do fundo do mar

A Petrobras começa a exploração no pré-sal, mas ainda
está longe do que realmente importa: explorar Tupi e as 
outras províncias na ultraprofundidade da Bacia de Santos


Ronaldo França e Ronaldo Soares

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Nesta reportagem
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Quadro: O tamanho do desafio

Na próxima terça-feira, o presidente Lula desembarca no Espírito Santo para a cerimônia que marcará o início da produção de petróleo na camada do pré-sal. O evento está revestido da solenidade típica dos momentos históricos. É justo. Pela primeira vez se estará bombeando óleo em grande quantidade a partir da porção do subsolo que se formou há 150 milhões de anos, prolonga-se por 800 quilômetros, de Santa Catarina ao Espírito Santo, e guarda estimados 80 bilhões de barris de petróleo e gás. É o suficiente para transformar o país no sexto maior detentor de reservas, atrás somente de Arábia Saudita, Irã, Iraque, Kuwait e Emirados Árabes. Para Lula, o fato tem ainda o peso de imprimir nos livros de história uma das marcas pelas quais seu governo será lembrado no futuro. O presidente descerá de helicóptero na plataforma P-34, instalada no campo de Jubarte, e provavelmente repetirá a clássica cena de molhar as mãos no petróleo. O que vem depois terá menos pompa e muito mais trabalho. A parte que realmente importa na área do pré-sal fica a 300 quilômetros do litoral, a uma profundidade de 7.000 metros – quase um Everest debaixo da terra – e sob 2 quilômetros de sal. Isso é muito diferente do que existe em Jubarte, cenário da festa oficial. Ali a profundidade também é grande (são 4 400 metros), mas o reservatório está a somente 77 quilômetros da costa e a camada de sal tem apenas 100 metros de espessura. Sem falar que a plataforma que está em operação ali, a P-34, já estava produzindo petróleo.

O nome que simboliza o futuro glorioso que o petróleo do pré-sal trará para o país é Tupi. É de lá e dos blocos vizinhos que, aposta-se, jorrará algo como 50 bilhões de barris. Mas o que existe, por enquanto, é uma promessa cercada de incertezas por todos os lados. Para concretizá-la ainda será necessário superar barreiras das quais se tem apenas uma pálida idéia. É essa imensa dificuldade, aliada aos riscos naturais da atividade petrolífera, que torna o debate sobre o destino que se deve dar a esse dinheiro proveniente do pré-sal tão precipitado. Já se disse que o que se ganhar ali terá de ser usado na educação, no combate à miséria e até na construção de um submarino nuclear. Falou-se de uma nova divisão do dinheiro dos royalties. Falou-se de tudo. Mas não adianta discutir sem saber de quanto dinheiro se está falando. A rigor, hoje, fala-se de nenhum. Não há no pré-sal uma gota de petróleo que se possa classificar como "reserva provada", nomenclatura usada para definir a quantidade de petróleo de cuja existência se tem certeza. É uma promessa. Para começar a torná-la realidade, a Petrobras e seus sócios internacionais farão o primeiro teste no campo de Tupi em março do ano que vem (veja quadro).

Pode haver percalços de toda ordem. É possível que se descubra que a rocha-reservatório, em cujos poros estão armazenados o petróleo e o gás, não se presta à produção em larga escala a longo prazo com a tecnologia existente hoje. A rocha geradora de petróleo em Tupi tem formação heterogênea. A tecnologia usada em um lado do campo pode ser diferente da necessária em outro. Há ainda um temor adicional. O petróleo ali tem uma quantidade de dióxido de carbono (CO2) muito alta, o que pode danificar as instalações. Esses são hoje os principais desafios tecnológicos da Petrobras. Há outros – entre eles, a enorme quantidade de recursos necessários para a exploração em condições tão adversas.

O banco UBS Pactual divulgou um estudo que procura avançar sobre o tamanho do investimento e das incertezas que se tem pela frente. Os analistas do banco basearam seus cálculos em 50 bilhões de barris, a quantidade estimada para os blocos de exploração de Tupi, Júpiter e Pão de Açúcar, que juntos somam 13% da área do pré-sal. Todos na Bacia de Santos (veja o mapa). A conclusão é que seriam necessários 600 bilhões de dólares para tirar da primeira à ultima gota de petróleo que se pode extrair dali. Trata-se, evidentemente, de um exercício, e nem poderia ser diferente diante da falta de informação sobre os campos. Mas ajuda a entender o tamanho do desafio. A Petrobras trabalha com números um pouco mais modestos. Calcula que a empreitada pode, sim, aproximar-se dos 600 bilhões de dólares, mas para explorar as seis áreas já licitadas em que é a operadora: Tupi e Iara, Bem-Te-Vi, Carioca e Guará, Parati, Júpiter e Carambá. Seja como for, é uma montanha de dinheiro. Equivale a 45% do produto interno bruto brasileiro (o conjunto de riquezas produzidas ao longo de um ano).

E é por essa razão que a definição do modelo de exploração precisa ser encarada com seriedade – esse, sim, um debate oportuno. É justo que o país modifique alguns parâmetros das regras em vigor, diante de uma descoberta que muda tão profundamente a relação entre investimentos e lucros. Mas é preciso mais cuidado do que se está tendo nesse debate para que o país não jogue fora a credibilidade internacional que tem conquistado com dificuldade. O presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, Luciano Coutinho, anunciou na semana passada que já há 165 bilhões de dólares previstos para investimentos entre 2008 e 2011 somente na indústria de petróleo. Isso sem considerar o pré-sal, o que dá a medida da importância que essa indústria ganhou. Não se pode ser descuidado nesse campo.

Não foi o que se viu na semana passada. Algumas declarações das principais autoridades envolvidas na discussão causaram arrepios no mercado e tiveram reflexos até na bolsa de valores. A idéia, defendida pelo ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, de o governo desapropriar blocos já licitados na camada do pré-sal chegou a derrubar as ações da Petrobras na segunda-feira – a desvalorização foi de mais de 4%. Em seguida, o governo tratou de serenar os ânimos, deixando vazar propostas mais tranqüilizadoras, como a possibilidade de a Petrobras funcionar como operadora estratégica das reservas do pré-sal. Depois de se chegar ao inferno – com frases do presidente Lula como "Não se pode deixar na mão de meia dúzia de empresas que acham que o petróleo é delas e vão apenas comercializá-lo" –, o céu ficou um pouco menos nebuloso. Na quinta-feira, durante a reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, Lula mudou o tom: "Não é porque tiramos o bilhete premiado que vamos sair por aí gastando o que não temos ainda. O principal destino dessa riqueza deve ser a educação e o combate à miséria. O pré-sal é um passaporte para o futuro". É um avanço. Mas falta ainda o presidente afirmar, com todas as letras, que o Brasil não mudará fundamentalmente as regras do jogo criadas em 1997, quando se promulgou a Lei do Petróleo em vigor. Ao lado das sondas e plataformas, isso será de grande utilidade para chegar ao petróleo do pré-sal.





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