A revolução low cost já chegou aos Açores. O passado Domingo foi marcante a este respeito, com a chegada dos primeiros voos à região. Lançam-se agora vivas à Easy Jet e à Ryan Air, que parecem finalmente colocar um ponto final nos elevados preços do transporte aéreo entre os Açores e o Continente. Mas no meio desta euforia regional que parece ter-se generalizado, apenas um pequeno detalhe, apenas um pequeníssimo pormenor, parece ter ficado por resolver: a SATA, companhia aérea regional de bandeira, não só ficou de fora dos festejos, como vê agora o seu futuro com insegurança e apreensão.
Sobretudo a componente SATA Internacional do grupo, que é agora obrigada a bater-se com operadores que jogam noutro campeonato. E escusado será sublinhar que a SATA não é apenas uma marca com um conjunto de aviões. Trabalhadores da empresa e suas famílias têm evidentemente razões para olhar de forma apreensiva para a revolução low cost em curso. Parte da empresa pública regional parece ser o cordeiro a sacrificar em todo este processo. No fundo, uma moeda de troca, como se de um mal necessário ou de uma fatalidade se tratasse.
O Governo Regional, pela voz do seu Secretário Regional dos Transportes, bem tentam dar a volta à questão. O Plano Estratégico da SATA, apresentado três meses antes da abertura do espaço aéreo (?!), surge como a grande resposta. O Plano prevê a redução de receitas e refere de forma muito mitigada a necessidade de redução de pessoal. Poucos parecem acreditar na sua solidez, a começar pelos próprios trabalhadores da própria SATA.
A chegada das companhias aéreas low cost é o culminar de uma discussão com muitos anos, que identificava há muito os problemas do anterior modelo de espaço aéreo fechado. Os elevados preços do transporte aéreo condicionavam o desenvolvimento da região, sobretudo em termos turísticos, mas não só. Qualquer solução que implicasse a redução dos custos das ligações aéreas com o Continente seria naturalmente muito bem-vinda, tais eram os constrangimentos provocados pelo anterior modelo.
Precisamente por esta ser uma mudança que vinha sendo pensada, discutida e analisada há tantos anos, é grave constatar que a mesma parece ter sido muito mal preparada. Num dia, a o espaço aéreo fechado era fundamental para garantir a coesão entre ilhas, no dia seguinte deixou de ser. Num dia, as companhias low cost ofereciam pouca qualidade nos serviços prestados, no dia seguinte já não era bem assim. Num dia, a SATA era uma empresa regional de referência, levando o nome dos Açores a vários continentes, no dia seguinte passou a ser uma empresa pouco sustentável, que necessita de se “adaptar aos novos tempos”, de se “preparar aos desafios futuros”.
Tudo indica que as low costs terão um papel positivo na região. Ainda bem que assim é. Mas que o referido processo tenha acontecido assumindo a SATA como moeda de troca é de uma gravidade e incompetência grandes. Não se pode achar que uma empresa habituada a um mercado fechado pode subitamente adaptar-se a um mercado liberalizado. Não se pode assumir que um Plano Estratégico aprovado três meses antes de tão grande mudança poderá fazer milagres. E, sobretudo, não se pode sequer considerar que os destinos de uma empresa pública e estratégica como a SATA são um mero detalhe.
Se não houve capacidade durante estes últimos anos para preparar decentemente a transição para o mercado liberalizado, que haja agora compromisso, tempo e vontade do Governo Regional para o fazer. A SATA não pode ser a moeda de troca de todo este processo. A empresa, e sobretudo os seus trabalhadores, merecem muito mais do que isso.
Artigo ontem publicado no Açoriano Oriental
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