Política
A guerra fria no comércio mundial:: Vinicius Torres Freire
FOLHA DE S. PAULO
Protecionismo "oficial" não causou baixa no comércio, mas ações na OMC cresceram mais de 100% desde 2007
A ameaça brasileira de elevar impostos de importação de produtos americanos suscita o alerta exagerado de risco de guerra comercial com os EUA. O subsídio americano ao algodão foi condenado na Organização Mundial do Comércio (OMC). Os EUA deram de ombros, e o Brasil ameaça retaliar.
A iniciativa parece diplomaticamente um tanto desastrada. Mas é difícil o Brasil ficar fora da guerra comercial, que fermenta. França e europeus mais pobres se queixam da Alemanha. Os EUA, da China.
"Guerra fria", pois, nesta crise de 2007-2010, as ameaças de protecionismo até agora são muito mais comuns do que novas barreiras oficiais a importações. O comércio mundial caiu 9% no ano passado, a maior baixa desde a Segunda Guerra.
Desânimo do consumidor, restrição de crédito para famílias e empresas e seca de financiamento para o comércio internacional foram as causas da baixa, diz o economista Jian Wang, do Federal Reserve de Dallas. Não o protecionismo.
Mas Wang nota que o número de pedidos de processos na OMC tem crescido. No primeiro semestre de 2009, o número de queixas subiu 20% sobre a primeira metade de 2008. No primeiro semestre de 2008, havia crescido 86,8% sobre a primeira metade de 2007.Tais reclamações podem se tornar restrições comerciais de fato a partir deste ano. Wang observa ainda que o número de barreiras pode crescer anos depois do pior de uma crise. O pico da recessão anterior foi em 2001. O grosso das medidas destinadas a barrar importações barateadas marotamente ocorreu em 2003.
Wang, como tantos outros, diz que países com superavit comerciais excessivos precisam consumir mais (trata-se de China, Alemanha e Japão). Isto é, deixar que os salários reais subam e "crescer para dentro", importando mais e estimulando economias do resto do mundo.Parlamentares americanos pediram ontem que Barack Obama declare oficialmente que a China manipula o câmbio. Isto é, que mantém sua moeda desvalorizada demais, de modo a baratear seus produtos e exportar mais. Caso a China não se emende (até parece), querem que o governo vá à OMC pedir retaliações contra os chineses. O Nobel de Economia Paul Krugman acha que o excesso chinês no comércio ajuda a deprimir a economia mundial.
A ministra das Finanças da França, Christine Lagarde, disse ao jornal britânico "Financial Times" que os produtos alemães são competitivos porque a Alemanha arrocha salários. Os alemães bufaram e disseram que vendem mais porque são mais eficientes (embora arrochos sejam um fator de eficiência). O PIB alemão depende de exportações. Tal como a China, mas em muito menor escala, seu consumo doméstico é baixo. Os alemães em parte dependem do deficit comercial de vizinhos europeus, a quem criticam por terem deficit (entre outras críticas).
O governo brasileiro toma medidas desde 2008 a fim de reduzir, de modo indireto, o efeito do real forte.
Colocou mais dinheiro barato no BNDES, baixou impostos e deve tomar mais medidas de estímulo até meados do ano (a melhor delas seria baixar o consumo do governo). Não temos cacife para muito mais. Como vamos aumentar a produtividade?
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