Tem pouco efeito prático externo a indignação que a presidente Dilma
Rousseff manifestou quinta-feira por causa das políticas monetárias
frouxas dos países ricos que canibalizam, segundo ela, as economias
dos emergentes.
Apenas para relembrar, Dilma se queixou de que as impressionantes
emissões de moeda pelos bancos centrais dos Estados Unidos e da área
do euro provocam "tsunami monetário", ou seja, despejam vagalhões de
moeda no resto do mundo e tiram competitividade do setor produtivo dos
emergentes - especialmente do Brasil, à medida que acarretam
desvalorização das moedas fortes e valorização das mais fracas, como o
real.
Ao denunciar a guerra cambial provocada pela política monetária das
grandes potências, o ministro Guido Mantega já denunciava esse efeito
e continua acreditando em que possa contar com séria discussão no
âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC), sobre o impacto no
comércio global provocado pela manipulação do câmbio.
Mas não dá para afirmar que, por terem despejado nos mercados mais de
US$ 7 trilhões, os grandes bancos centrais estejam adotando políticas
condenáveis e, portanto, sujeitas a represálias pelo resto do mundo. E
não deixa de ser paradoxal que essa questão seja levantada no momento
em que Ben Bernanke, presidente do Federal Reserve (o banco central
dos Estados Unidos), e Mario Draghi, do Banco Central Europeu, estejam
sendo festejados como salvadores globais por dominarem com essas
políticas - ao menos temporariamente - os incêndios que varriam as
economias dos Estados Unidos e dos países-membros do bloco do euro.
Mas, afinal, o que é melhor para o Brasil: enfrentar o efeito
colateral dessas políticas (o tal tsunami de moeda estrangeira no
câmbio interno), mas trabalhar sem as turbulências que paralisaram a
economia mundial e a ameaçaram com uma tempestade perfeita; ou o
contrário? Por acaso, o governo do PT prefere a paisagem desoladora de
uma grande depressão global, de poder destrutivo equivalente ao dos
anos 30? Ou, então, poderia sugerir aos grandes bancos centrais
opções, politicamente viáveis, melhores do que a adotada?
O governo brasileiro também se contradiz quando condena o sacrifício
imposto às populações dos países ricos - em recessão, desemprego,
perda de salário e tal - e, ao mesmo tempo, acusa seus governos de
praticar políticas fiscais flácidas, que têm de ser compensadas em
seguida com despejo de trilhões de dólares.
Tivesse o Brasil poupança equivalente a 50% do PIB, como a da China,
seria possível neutralizar os efeitos deste e de outros tsunamis. Mas
não é o que acontece. O Brasil tem uma poupança insignificante, de
apenas 17% do PIB, que tende a ficar ainda mais baixa em consequência
da política econômica dos últimos anos, que privilegia o consumo em
nome da criação de um forte mercado interno.
Pode-se lamentar a falta de políticas preventivas contra enchentes.
Mas há um momento, como este, em que tudo o que é possível fazer é
passar os móveis para o andar de cima e depositar sacos com areia para
tentar deter os efeitos da enxurrada sobre a casa. No entanto, há
razões para acreditar que a indignação de Dilma tenha mais objetivo
interno do que externo