Os prefeitos foram os grandes vencedores das eleições municipais recém-concluídas: perto de 70% dos que buscaram um segundo mandato o obtiveram - o maior índice desde que a reeleição foi adotada. Esse resultado é um produto do Brasil da bonança econômica em que a arrecadação crescente deu às prefeituras condições incomuns de investir em programas de interesse das respectivas populações. O clima de contentamento com o estado das coisas contribuiu também para fortalecer uma tendência conhecida em toda parte onde os governantes podem pleitear mais um período nos mesmos cargos: a menos que o desempenho do incumbente tenha ficado abaixo da crítica, ou algum de seus adversários seja uma figura fora de série, o eleitorado reluta em trocar o certo pelo duvidoso.
Essa regra teve uma peculiaridade em São Paulo, onde o segundo turno foi disputado entre o prefeito e um desafiante que os eleitores conhecem de sobejo: a ex-prefeita Marta Suplicy, que já havia tentado ficar no cargo quatro anos atrás - e fracassou. Gilberto Kassab se reelegeu com 60,7% dos votos válidos não apenas porque uma proporção equivalente de paulistanos aprova a administração que ele herdou (e à que deu continuidade) quando o titular original, José Serra, assumiu o governo do Estado. Os números finais do domingo e a forma como se distribuíram pelas regiões da cidade mostram que a aprovação de Kassab se combinou com o crescimento da rejeição política e pessoal a Marta. Não há de ter sido ínfimo o contingente que votou antes contra ela do que a favor dele. A petista teve 45% dos votos válidos quando perdeu para Serra. Agora, não chegou aos 40%.
A outra grande capital em que o PT enfrentou um pleito com tons plebiscitários foi Porto Alegre, uma das primeiras a ser conquistada pelo partido do então ainda aspirante presidencial Luiz Inácio Lula da Silva. Ali, o prefeito José Fogaça, que levou 59% dos sufrágios, se beneficiou de sua imagem de bom administrador e do veto da maioria a uma retomada da cidade pelo PT. Nesse caso, tudo indica que a rejeição foi muito mais ao partido do que à sua candidata, a deputada federal Maria do Rosário. Fogaça, também ele ex-parlamentar, é um dos seis peemedebistas sufragados nas 26 capitais em jogo no ciclo eleitoral deste ano e 1 dos 17 vencedores do partido (ante 9 em 2004) no conjunto dos 79 municípios com mais de 200 mil eleitores, onde funciona o sistema de dois turnos. Ao todo, o PMDB fez 1.203 prefeitos (ante 1.059 há quatro anos), confirmando a sua condição de principal máquina eleitoral do País.
O PT, embora tivesse acrescentado 143 Prefeituras ao seu estoque de 411, sai desta eleição sem motivos de júbilo. Primeiro, no plano dos números gerais, porque esperava avançar além do que avançou (o partido terá a partir do ano que vem menos prefeitos do que o PSDB e o PP, embora tivesse elegido nas capitais tantos titulares quanto o PMDB e cinco a mais do que este no grupo dos 79 maiores municípios). Segundo, porque - a começar da estrepitosa derrota em São Paulo - o partido não abocanhou nenhuma capital de projeção, além de Fortaleza, Recife e Vitória. (Não pôde fazer a festa nem em Belo Horizonte, porque a direção nacional repudiou a aliança dos petistas, liderados pelo prefeito Fernando Pimentel, com o governador tucano Aécio Neves em torno do vitorioso Márcio Lacerda, do PSB.) E terceiro, porque Lula imaginava, sim, que a sua popularidade faria a balança pender muito mais para a companheirada.
O presidente tem razão quando diz que nenhum candidato, qualquer que fosse o seu partido, falou mal dele na campanha. Tal seria, como se diz, com o País vivendo o seu "momento mágico".
Mas, infelizmente, o momento está passando, mesmo na hipótese otimista de que a recessão global provoque no Brasil apenas uma desaceleração moderada do crescimento. O cenário mudou dramaticamente e é pouco provável que até o fim deste governo volte a reinar aqui um clima de otimismo generalizado como aquele definido por Lula como "momento mágico". E, conforme o grau do contágio da economia brasileira pela crise, a transferência de votos em que ele aposta para eleger sua, até agora, provável candidata, a ministra Dilma Rousseff, poderá ser ainda muito mais difícil do que foi no caso de Marta Suplicy, por outras razões - na última eleição antes da crise.
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