FOLHA DE SP - 19/12
Começo do fim do estímulo monetário por ora nem de longe reduz incertezas e risco de tumulto
O GOVERNO estava "extremamente preparado" para a mudança da política econômica americana (palavras de Dilma Rousseff). O "mercado" brasileiro tinha "precificado" a decisão do banco central americano, o Fed (isto é, taxas de juros e câmbio, por exemplo, já seriam negociados como se a mudança esperada tivesse ocorrido).
Isto é, donos do dinheiro e governo estariam preparados para o começo do fim do programa de despejo de dinheiro do Fed na economia dos EUA, que começou ontem a conta-gotinhas. A partir de 2014, o Fed vai comprar menos dívida privada e pública, programa que ajudou a reduzir os juros de longo prazo.
Ainda que fosse verdade ou desse para levar muito sério esse tipo de afirmação dos "preparados", o BC dos EUA, o Fed, anunciou ontem que seu programa só acaba quando termina, que a história ainda vai durar muito tempo e que o pouso será suavíssimo, mas sujeito a arremetidas e mudanças de rota a fim de aumentar a segurança do procedimento.
Ou seja, além das incertezas do efeito mesmo do início do fim do programa de estímulos à economia, surgiram novas oportunidades de especulação sobre o ritmo de fechamento da torneira monetária americana.
O Fed até que está animado com o crescimento da economia em 2014, que estima em 3%. Mas está cismado com a inflação baixa demais (sinal de algum tipo de anemia econômica) e com o desemprego ainda alto demais.
Sugeriu, pois, que: 1) A taxa de juros de curto prazo, a taxa "básica" deles, deve ficar em zero até 2015, pelo menos (até bem depois que o desemprego baixe de 6,5%). Ou seja, o que tira com uma mão agora dá com outra no futuro; 2) Pretende reduzir paulatinamente a compra de títulos de dívida no mercado, talvez até dando cabo do programa no final de 2014. Mas tudo vai depender do ritmo da economia: da inflação e do emprego.
E nós com isso?
A taxa de juros de longo prazo dos EUA tende a aumentar paulatinamente. Até agora, a alta dos juros americanos (títulos de dez anos) foi acompanhada passo a passo pela alta do dólar, relação que ficou estremecida apenas pela intervenção do BC brasileiro no mercado.
Se a relação vai continuar tão estreita, é difícil dizer. Depende das intervenções do BC em 2014, do efeito da alta dos juros brasileiros, da gestão econômica do governo. Mas é certo que o dólar vai ficar mais caro; os juros, ao menos um tico adicional mais altos.
Há mais incertezas. Em qual ritmo o mercado americano vai chutar os juros deles para cima? Qual o efeito disso na atividade econômica (que será favorecida por alguma folga fiscal em 2014)?
Vai haver "acidentes"? Com juros baixíssimos, a taxa de calote das empresas baixou. Vai continuar assim? As empresas boas inflaram suas margens de lucro com a redução do custo financeiro (e demissões e queda dos salários). A festa vai continuar? Dado o ritmo suavíssimo de redução dos estímulos, as Bolsas americanas vão desenvolver bolhas?
Vai haver tumultos devido à flutuação de dados e expectativas de crescimento dos EUA, o que poderia modificar o ritmo do Fed? Haverá problemas nos "emergentes" mais frágeis, o que pode nos contaminar (se é que o problema não vai acontecer mesmo conosco)?
Difícil estar bem preparado para tantas possibilidades.