Alberto Tamer - Depois da festa, a economia
Política

Alberto Tamer - Depois da festa, a economia





O Estado de S. Paulo
28/8/2008

Encerrada a Olimpíada, vamos tratar de coisa séria para a atormentada economia mundial? Não, não sou contra os jogos olímpicos, e quem, em bom juízo, poderia ser? Afinal, eles não revelaram o homem mais rápido, o que pula mais; o que salta mais; o que nada mais? Não foi um grande progresso para a humanidade?

A Olimpíada - viva! - só abre a coluna porque se realizou na China, que concentra, de novo, a atenção do mundo, pois, nesta crise, dela vai depender, nos próximos meses (anos?), o crescimento da economia mundial.

Nesta cobertura da mídia, a única coisa que me deixou triste foi ver que nenhum jornalista pediu para visitar os mais de 30 colegas presos por um governo repressivo e totalitário. Nem que fosse só para confirmar que não poderia fazê-lo. Evidentemente, era proibido. Mas esse é outro assunto do qual o mundo não queria saber; estava empolgado com a festa bilionária. Jornalistas, políticos, tibetanos e manifestantes corajosos estavam nas masmorras chinesas? Ora, o que é que nós, o mundo, temos com isso?

AGORA, A ECONOMIA

O que importa agora é saber se o governo chinês vai evitar que a economia recue dos 10% a fim de que eles possam importar mais e exportar produtos acabados a preços ainda baixos, apesar da inflação interna. Isso ajuda a conter a alta dos preços em outros países.

A China é uma espécie de usina. Importou US$ 956 bilhões no ano passado, US$ 567 bilhões só neste semestre e pode passar de US$ 1 trilhão. Mas isso apenas se a economia continuar a crescer em torno de 10%.

Isso é extremamente importante, principalmente para o Brasil, que viu, embasbacado, o show de enormes prédios luminosos sem olhar para a miséria em que vivem 800 milhões de chineses nos campos. Até para o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que andou "turistiando" por lá, a China é uma maravilha. Ele afirma, em um artigo incrível, que não viu miséria, só pobreza... Ora, ora, professor.

Não há mais dúvida de que a economia mundial está se desacelerando. O FMI admite que não crescerá mais de 3,9% neste ano, pode ser menos, mas apenas, vejam bem, diz textualmente o FMI, "apenas" se a China, a Índia, a Rússia e alguns países em desenvolvimento conseguirem manter o ritmo de expansão atual, entre 5% e 10%.

Por enquanto, está dando, mas não se sabe se isso vai durar o tempo suficiente para que os desenvolvidos - EUA, Europa - se recuperem. Afinal, eles estão parando e respondem por mais da metade do PIB mundial. Usando uma gíria, por enquanto é a China que está segurando as pontas.

VEM PACOTE CHINÊS?

Mas ela sustenta? O governo diz que sim. Informa-se que estuda um plano de investimentos maciços de muitas dezenas de bilhões de dólares para estimular a economia, via demanda interna, já que a externa encolheu. Quer mostrar que não é bom apenas em medalhas olímpicas de ouro, mas de bom senso econômico também.

Neste contexto de desaceleração econômica, em que, claramente, grande importadora e exportadora tem papel decisivo, a China é ainda mais importante para o Brasil. Recorro à reportagem desta terça-feira no Valor Econômico, baseada em dados oficiais, para confirmar isso.

1 - A China, neste semestre, superou a Argentina e passou a ser o segundo parceiro comercial do Brasil. Em 12 meses, de julho a julho, a corrente comercial (importação-exportação) foi de US$ 31,9 bilhões, acima dos US$ 29,3 com a Argentina. No primeiro lugar estão os EUA, com US$ 49,3 bilhões.

2 - De janeiro a julho, as exportações brasileiras para a China aumentaram 64%, puxadas por soja e minério de ferro, mais que a média nacional, de 27%.

3 - As importações da China avançaram nada menos que 74%, bem superior ao aumento médio das importações nacionais, de 52%.

4 - Em conseqüência, se antes tínhamos um superávit expressivo, hoje amargamos um déficit de US$ 2,6 bilhões em 12 meses.

Esses números, mais os relativos ao peso da China no comércio mundial, são suficientes para mostrar que a China precisa continuar crescendo. E isso só será possível com um vigoroso programa de consumo interno, que já representa hoje 66,7% do crescimento do seu PIB. O peso das exportações foi negativo; só 20%. Aqui, o desafio da China: crescer muito internamente, sem mais inflação.

Agora, sim, poderíamos dizer, com a consciência tranqüila, que o problema da inflação é deles. O mundo quer mesmo é que ela cresça, pois mais importações chinesas significam mais exportações de países desenvolvidos, que estão parando, e, principalmente mais importações a serem feitas do Brasil.

Agora, precisamos do mercado chinês mais do que nunca para sustentar o equilíbrio externo e uma boa parte do crescimento. Há espaço, sim, pois representamos um quase nada de um país que importa US$ 1 trilhão.




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