Os ciclos políticos e a forma como a popularidade da força política no poder evolui são fenómenos particularmente interessantes. A evolução é conhecida. Numa primeira fase, o partido no poder goza tipicamente de um estado de graça junto do eleitorado, junto dos opinion makers e da comunicação social em geral. Após tal fase inicial onde normalmente se atingem os picos da popularidade, entra-se numa fase tendencialmente decrescente, embora de certa forma camuflada por subidas e descidas ao sabor da agenda política. Por último, inicia-se então a fase de fim de ciclo. O partido da oposição já ultrapassa em popularidade o partido no poder, este último já tem dificuldade em disfarçar alguma desorientação e já caiu completamente em desgraça junto de comentadores e outros líderes de opinião.
A evolução dos ciclos políticos pode ser facilmente acompanhada pelas sondagens. Estas fornecem material empírico bastante rico para análise do fenómeno. Mas, para além da perspectiva da opinião pública, torna-se particularmente rico observar os ciclos políticos no seio da força política governamental (através dos seus dirigentes, militantes de base ou simples apoiantes de sempre). Como é evidente, da mesma maneira que a opinião pública acredita, apoia e começa depois a desmotivar e a desejar a mudança, o mesmo acontece no seio dos partidos que se encontram no poder.
Vem este enquadramento a propósito da situação do actual Executivo e do desconforto manifesto que se faz sentir em franjas cada vez maiores do PS. Sabendo com toda a certeza que o Governo entrou na tal fase de fim de ciclo, os sinais de desmotivação começam a ser indisfarçáveis, sentindo-se mesmo uma vontade em inúmeros sectores para que seja posto fim a este pesadelo. Ao ver camaradas seus a aprovarem PECs uns a seguir aos outros em claro desacordo com a linha política original do partido, ao ver ministros da sua cor política a cometerem gafes consecutivas, ao sentir que o rumo político seguido norteia-se apenas pelo possível, afastando-se liminarmente do desejável, é natural a tal vontade de colocar rapidamente um ponto final num ciclo que já nada de bom poderá trazer ao partido e seus militantes.
Escusado será dizer que este sentimento está presente sobretudo em sectores do partido que não estão a beneficiar significativamente com a actual governação, i.e., que não estão dependentes da mesma a nível profissional. É esta independência que lhes possibilita algum desprendimento relativamente ao actual ciclo político. Por outro lado, como é evidente, este desejo nunca poderá ser assumido abertamente porque a ideia de “responsabilidade” não o permite. Ou seja, uma força política no poder não pode dar-se ao luxo de bater com a porta e ficar com o pesado ónus da irresponsabilidade perante a opinião pública. Defender tal ideia abertamente equivale a defender um quase suicídio em termos políticos.
E é com estes sentimentos contraditórios, com estas angústias e agonias que se encontram cada vez mais militantes e apoiantes férreos do PS. Como disse acima, é um sentimento natural, um desconforto que ocorre em todos os partidos no poder em fim de ciclo. Estranho seria se assim não acontecesse. De qualquer modo, este fenómeno demonstra bem a complexidade das dinâmicas internas nos partidos do centro que assumem rotativamente responsabilidades governativas.
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