De duas, uma: ou a fidelidade de Gilberto Kassab a José Serra não é
tão profunda quanto diz o prefeito ou o papel de Serra na cartada de
Kassab ao esvaziar o PSDB e o DEM não é tão anódina quanto assegura o
ex-governador.
Nenhum dos dois se movimenta com clareza suficiente para permitir a
elucidação do dilema enunciado. Pelo menos por ora não é possível
enxergar a olho nu o que realmente se passa e o que verdadeiramente se
pretende com a sangria desatada traduzida na saída de seis ou sete
vereadores paulistanos do PSDB com destino, boa parte deles, ao PSD.
Serra diz que não tem nada a ver com os movimentos de Kassab e que
tentou por todos os meios e modos evitar a saída dele do DEM.
Kassab corrobora a versão, não perde a chance de acentuar sua
admiração e lealdade a Serra, mas também diz para quem quiser ouvir
que se o seu guia genial tiver juízo reconhece que a chance do
Planalto passou e se recolhe de vez à planície.
É algo que se diga de alguém por quem se devota tanto apreço? Como
essa análise de Kassab já frequenta colunas de notas na imprensa
supõe-se que Serra tenha conhecimento dela.
Não exibe, contudo, sinais de contrariedade. Tática? Pode ser: não
ganha nada se indispondo com Kassab por tão pouco.
Sim, mas e o PSDB?
Não obstante os pormenores envolvidos na decisão dos vereadores, fato
é que a debandada coletiva não ocorre por acaso, mas com o claro
objetivo de causar impacto e dar a impressão de desmonte. Justamente
na cidadela mais importante dos tucanos.
Serra não teria influência bastante junto a Kassab para evitar esse
tipo de derrota política? Parece natural que ao menos tivesse
ascendência sobre a seção regional do partido que seus aliados o
julgam merecedor de presidir, e acionasse esse poder para conter o
êxodo.
No discurso em que reconheceu a derrota presidencial José Serra disse
um "até breve". Se com isso quis indicar disposição de prosseguir na
luta, em tese seria do interesse dele a preservação física do PSDB.
Mas não se vê um gesto. Nem dele nem da direção nacional do partido ou
do governador Geraldo Alckmin, cuja voz se levanta para "lamentar".
Não dá para perceber a razão, mas é como dizia Leonel Brizola diante
de situações anômalas que não conseguia de imediato compreender: "Algo
há".
Se não houver, então o caso é de pura apatia partidária aguda.
Foi mal. A senadora Gleisi Hoffmann (PT) tentou desqualificar cobrança
do senador Álvaro Dias (PSDB) para que o Ministério Público investigue
a oferta de propina que teria provocado o recuo na indicação do
ministro Cesar Asfor Rocha para o Supremo, dizendo que o tucano é
especialista em repercutir denúncias feitas por jornais e revistas. No
caso específico, a Veja.
Sempre diligente em seu ofício, desta feita a senadora tropeçou ao
esquecer que ninguém esquece que o PT, quando oposição, não só fazia
da imprensa sua caixa de ressonância como municiava jornais e revistas
com dados muitas vezes sigilosos de comissões parlamentares de
inquérito para produzir suas denúncias.
O desdém com o papel dos meios de comunicação pode ser um atalho
quando se precisa de um instrumento de defesa. Mas também é um
indicativo de que não se dispõe de nenhum outro mais convincente.
Inflação. Há um cálculo político por trás da resistência do governo em
agir com mais rigor no combate à inflação: o receio de que uma
"pancada" muito forte derrube o crescimento e com ele os índices de
popularidade da presidente da República.
Petistas se arrepiam só de pensar na possibilidade de que o governo
Dilma enfrente as consequências que enfrentou o governo Fernando
Henrique a partir da crise do câmbio de 1999.
Mano a mano. Uma hipotética disputa eleitoral entre Lula e FH teria
necessariamente de obedecer a uma preliminar: que nenhum dos dois nem
os respectivos grupos tivessem acesso às ferramentas do poder.