FOLHA DE S. PAULO
Mercados avaliam situação grega como pré-falimentar, crise balança Europa e chega até ao Brasil superemergente
Ontem foi dia de brasileiros prestarem atenção à chatíssima crise da dívida grega. Que pode se tornar crise da dívida portuguesa, quiçá irlandesa ou espanhola. O intermitente churrasco grego serviu para impulsionar a "correção" da Bolsa. O Ibovespa fechou ontem 7,4% abaixo do pico do dia 8. A Bolsa estava carinha e, enfim, os juros vão subir, o que não é assim lá tão relevante no caso do mercado brasileiro, mas pega.
A Grécia mergulhara no vinagre na semana passada, quando pediu dinheiro ao FMI e à União Europeia. Como de hábito, as agências de classificação de risco comparecem ao campo de batalha a fim de matar os feridos. Degradaram ontem a nota de crédito do governo grego para "junk", investimento com razoável risco de levar calote. A dívida portuguesa também foi desacreditada.
Apesar de ineptas e cúmplices da bandalha que resultou na crise de 2007-09, as notas das agências são relevantes. Investidores podem ser impedidos, por motivos contratuais, de comprar títulos com nota de crédito "junk".
Se todas as maiores agências rebaixarem a Grécia para "junk", os títulos gregos não serviriam como garantia nem para negócios com o Banco Central Europeu. O problema é que bancos usam títulos gregos como garantia para empréstimos no BCE. Quando os papéis perdem valor, em tese os bancos têm de oferecer mais garantias.
O mercado passou a cobrar taxas de juros cada vez mais altas do governo grego. Cobra quase o dobro da taxa pedida para o Brasil, desde a semana passada. É a espiral da morte: o país já superendividado paga cada vez mais caro para refinanciar a dívida, que cresce mais. O rendimento dos papéis gregos ("juros") de dois anos ultrapassou bem o dos brasileiros e até os argentinos. Excetuado algum país obscuro, são agora os mais altos do mundo.
Se a Alemanha não abrir logo o cofrinho, os gregos terão de "reestruturar" a dívida (pagar mais tarde, quando puderem). Os alemães em tese bancariam 28% do empréstimo europeu à Grécia. Mas o governo alemão adia a decisão sobre a ajuda, muito impopular entre o eleitorado.
E daí?
Se a Grécia "reestrutura", dá um calote, bancos franceses e alemães, entre outros, perdem dinheiro e ficam com menos capital. Isso para não falar do medo -os seguros de crédito ficam mais caros, os juros sobem, e não apenas para os governos europeus. O caldo da economia do mundo rico pode voltar a entornar.
O novo pico da crise pode ser um faniquito do mercado. Pode não ser. Em tese, apenas a promessa de empréstimos tapa-buraco à Grécia deveria ter acalmado o ambiente. Com o dinheiro prometido por FMI e Europa, a Grécia poderia tapar buracos até o início do trimestre final do ano.
Mas rumores e palpites publicados na mídia financeira europeia dão conta de que o mercado quer um remendo de pelo menos ano e meio. O remendo também não garante o fim da novela. O governo grego precisa cortar sua despesa em pelo menos 12% do PIB até 2015. É um massacre.
Virá recessão, corte de benefícios sociais e revolta, que já está nas ruas. Além do mais, os gregos vão precisar tomar empréstimos a juros de pai para filho, de modo a não voltar ao buraco. Está difícil.