O Estado de S. Paulo - 22/04/2009 |
Quando o sistema financeiro fica doente, como agora, o crédito emperra, a produção afunda na recessão e o desemprego aumenta. Nessas condições, por mais que os governos tentem estabelecer ligações diretas entre bancos centrais e sistema produtivo, nada vai funcionar normalmente enquanto o crédito bancário não voltar. Isso, por sua vez, depende da recuperação dos bancos. Daí por que é tão importante saber até que ponto as instituições financeiras estão em condições de voltar à sua atividade normal. Ontem, o mundo teve informações conflitantes sobre esse processo. Em Washington, o secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Tim Geithner, em depoimento na comissão especial do Congresso que cuida do socorro oficial, revelou que a maioria dos bancos americanos não precisa de reforço de capital para prosseguir na sua tarefa. As bolsas globais comemoram como se essa fosse uma informação preciosa. Mas o relato de Geithner não deixa de conter certa dose de dubiedade. Basta que não se consiga equacionar a situação de um grande banco para que a hipótese de crise sistêmica (queda em dominó) ainda não tenha sido definitivamente afastada. O patrimônio dos bancos americanos está sendo submetido ao tal teste de estresse, cuja função é conferir que tranco cada um deles é capaz de aguentar. O prazo final para avaliação dos resultados dos testes é 4 de maio. A partir daí, o governo americano determinará quais os ativos hoje carregados pelos bancos que serão oferecidos para o setor privado, e qual será o tamanho do socorro a ser assumido com verbas públicas. Ainda ontem, o Fundo Monetário Internacional (FMI) divulgou em sua sede, em Washington, informe que avalia em US$ 4,1 trilhões o total de ativos podres que sabotam a economia mundial. Não estão só nos balanços dos bancos. Pesam, também, no patrimônio dos fundos de pensão, fundos de investimento e outras instituições globais. O relatório do FMI diz, ainda, que os bancos americanos já encaminharam solução para metade de um total de US$ 1,1 trilhão em créditos ruins que carregam em seus ativos. Já os europeus estão mais atrasados no processo de saneamento. Absorveram perdas de apenas 25% de US$ 1,4 bilhão de ativos impagáveis. Não dá para sustentar que não houve progresso e que tudo continua na mesma. O caminho já andado na recuperação do sistema financeiro global é impressionante. Mas ainda falta muito para o fim da crise. Tem dia em que o mercado financeiro olha para a obra refeita e fica feliz. Tem dia em que olha o que ainda falta e se deprime. Vai ser assim por um bom tempo. Confira Henrique Meirelles, presidente do Banco Central do Brasil, passou, por e-mail, a seguinte entrevista relâmpago: Qual a razão de tantas palestras feitas pelo senhor nos últimos dez dias pelo Brasil? Meirelles - Tenho recebido grande número de convites para falar sobre a crise, suas origens, as medidas tomadas pelo Banco Central e pelo governo. As palestras tiveram finalidade pedagógica e não de sinalização de política monetária. O mercado interpretou de duas formas afirmação sua recente de que é prematura a discussão sobre os juros de um dígito. Alguns acharam que o senhor considera prematura a discussão sobre se é sustentável ou não manter os juros em um dígito, caso cheguem lá. Outros entenderam que o senhor considera prematura a discussão sobre se chegaremos ao juro de um dígito. Qual a interpretação correta? Meirelles - Respondi diretamente a uma pergunta sobre se seria sustentável a manutenção dos juros de um dígito. Disse que, na hipótese de que esta previsão de mercado esteja correta, a sustentabilidade dos juros ao nível de um dígito seria uma resultante da conjugação de dois vetores: de um lado, da queda gradual de juros reais, como resultado da estabilização e da maior previsibilidade da economia; de outro, dos fatores cíclicos de curto prazo. |