A presidente Dilma Rousseff insistiu ontem, em Uberaba, no que já
havia garantido em entrevista ao jornal Valor: seu governo "não
negocia com a inflação". Essa intransigência é uma postura clara que
confirma pronunciamentos anteriores sobre a matéria, especialmente seu
discurso de posse, no dia 1.º de janeiro.
Dilma está certa ao expressar o que já se tornou clássico na economia
política: não há crescimento sustentável em ambiente eivado de
inflação. No Brasil, infelizmente, alguns figurões ainda apregoam a
tese de que o combate à alta de preços é incompatível com crescimento
e com criação de empregos. No entanto, crescimento com inflação é,
como a própria presidente vem dizendo, apenas voo de galinha, acaba em
seguida.
Essa atitude firme contrasta com a do ministro da Fazenda, Guido
Mantega, que tem preferido afirmar que esta safra de inflação não
preocupa, porque é sazonal e está naturalmente em retração. Mantega
passa, assim, a impressão de que a atual disparada de preços vai
perder fôlego logo a seguir e, por isso, não requer combate sem
tréguas.
A presidente Dilma parece ter entendido, a partir do que aconteceu nos
últimos 16 anos de governo (tanto o período Fernando Henrique como o
período Lula), que a atitude intransigente em relação à inflação não
tem apenas consequências econômicas positivas, mas, também, alto
alcance político. O eleitor sempre responde positivamente a um governo
que preserva o salário do trabalhador e castiga governantes tolerantes
com a inflação.
Mas não dá para ignorar nem as inconsistências do próprio discurso da
presidente Dilma nem as contradições entre o que diz e o que faz.
Ela afirma, por exemplo, que não há inflação de demanda no Brasil,
querendo com isso dizer que a esticada dos preços a partir do final do
ano passado é, preponderantemente, consequência da escalada dos preços
internacionais dos alimentos e das matérias primas, fora do alcance do
governo, e não de forte aumento do consumo, provocado pelo excesso das
despesas públicas.
E, de fato, a disparada dos preços deste início de ano não se
concentra apenas nos alimentos e itens de incidência sazonal, como os
reajustes da condução. Está muito espalhada na economia (alcançou 62%
dos preços que compõem o custo de vida) e atinge, especialmente, áreas
que nada têm a ver com alimentos, como todo o setor de serviços.
Além disso, há uma forte dose de inflação de demanda na incubadeira
encomendada pelo próprio governo Dilma. Qualquer planejador de
negócios, por exemplo, sabe que, no ano que vem, terá de enfrentar um
avanço de quase 13,9% no salário mínimo (ou cerca de 7,5% em termos
reais).
Em todo o caso, a afirmação da presidente, de que a inflação não é de
demanda, não deve ser entendida somente como uma questão de semântica.
Implica, sim, determinado diagnóstico e procedimentos de contra-ataque
que, felizmente, não observou.
Ou seja, se a inflação não fosse de demanda, como diz a presidente
Dilma, seu combate não exigiria aperto monetário (aumento dos juros) -
como o colocado em prática pelo Banco Central - nem cortes de despesas
públicas - como os anunciados exatamente com o objetivo de controlar a
inflação.
CONFIRA
Iene mais forte
Trata-se de forte valorização de nada menos que 3,7% em quatro dias.
Muitos podem estar se perguntando se não deveria acontecer o
contrário, refletindo a parada da economia e as enormes perdas de
patrimônio.
Fazer caixa
Essa alta reflete a expectativa de que seguradoras e investidores
agora sejam obrigados a vender ações e títulos para fazer caixa e
enfrentar as despesas de reconstrução.