Nem sempre o Banco Central (BC) tem critérios claros quando projeta seus números. Durante meses ignorou a enorme perspectiva de entrada de Investimentos Estrangeiros Diretos (IED) ou os recursos que entrarão para a capitalização da Petrobrás.
As Contas Externas de novembro, ontem divulgadas, começam a corrigir essas lacunas. E, apenas de IED, o BC já prevê, em 2010, US$ 45 bilhões (em outubro não admitia mais do que US$ 38 bilhões), além de US$ 25 bilhões em investimentos de longo prazo e em ações (em outubro admitia apenas US$ 15 bilhões).
Isso significa que o forte crescimento do déficit em conta corrente (contas com o exterior menos o fluxo de capitais) será compensado com a chegada de mais investimentos. Mas o governo Lula mantém em relação à entrada de capitais atitude ambivalente.
No final de novembro, o ministro Guido Mantega comemorou quando a Volkswagen anunciou que irá investir R$ 6,2 bilhões no País. Como ela, empresas de capital estrangeiro tendem a anunciar investimentos em todos os setores em que atuam. Por trás de tudo está a expectativa de que o consumo interno cresça perto de 10% em 2010 e siga forte.
Mas setores do governo e especialmente Mantega estão preocupados com a perspectiva de forte entrada de investimentos, pois eles são um dos principais fatores de valorização do real.
E, no entanto, foi o governo Lula e o ministro que turbinaram as vendas internas de veículos com redução de impostos, mesmo sabendo que a crise tinha perdido força e que não era necessário aumentar o incentivo ao setor.
Além disso, Mantega foi um dos que mais fizeram lobby com as agências de classificação de risco para conferir o grau de investimento ao Brasil. Por esse lado, mostrou-se muito interessado na entrada de capitais. Mas lamenta o estrago produzido pelo afluxo de recursos sobre a trajetória do dólar no câmbio interno.
Mantega está entre os que aplaudem o fortalecimento da empresa brasileira. Empurrou o Banco do Brasil a buscar mais recursos no exterior com o lançamento de ADRs (American Depositary Receipts), instrumento pelo qual as ações de empresas daqui são negociadas lá fora.
Também foi um dos que encorajaram a capitalização da Petrobrás prevista para 2010. Mas, como nem sempre é coerente, ouviu do presidente do Banco do Brasil, Aldemir Bendine, e do presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli, que a cobrança do IOF de 2% nas aplicações de estrangeiros em renda variável está jogando contra a capitalização de qualquer empresa nacional. E por que Mantega instituiu o IOF? Ora, instituiu para inibir a entrada de capitais estrangeiros e seu efeito sobre o câmbio.
Há um punhado de conclusões sobre o que foi dito. Primeiramente, que a política econômica comandada pela Fazenda não segue estratégia. Ela é mais o resultado das pressões, venham de onde vierem, do que de um plano.
Em segundo lugar, a opção ao avanço do consumo leva o capital estrangeiro a reforçar sua exposição no mercado brasileiro. E isso aumenta o afluxo de dólares, que produz o impacto conhecido sobre o câmbio.
Por mais que se diga o contrário, esse modelo alarga o déficit em conta corrente. No passado, foi um desastre. Nos novos tempos, provavelmente nem tanto.
Confira
Soft - Ao contrário do que estava na Ata do Copom divulgada em outubro, desta vez o Banco Central (BC) pegou leve na política fiscal do governo federal.
Em vez de advertências sobre o forte aumento das despesas públicas, preferiu afirmar que conta com o cumprimento das metas do superávit primário, ou seja, conta com as sobras de arrecadação para o pagamento da dívida pública.
Fora da Ata, o presidente do BC, Henrique Meirelles, também preferiu mudar de tom. Em vez de apontar para o risco eleitoral, disse que o combate à inflação será levado a sério, seja quem for o próximo presidente da República.