O Estado de S. Paulo - 15/06/2011 |
Em editorial recente, este jornal apontou para as deficiências nas infraestruturas da metrópole paulistana e as repercussões tanto na qualidade de vida de seus habitantes quanto no ambiente de negócios. Com a proximidade de dois importantes eventos esportivos - Copa do Mundo e Jogos Olímpicos -, cresce a consciência de que, na verdade, todas as cidades-sede enfrentam problemas gravíssimos. Abstraindo a questão mais específica dos estádios, são flagrantes os gargalos nas infraestruturas urbanas. Após décadas de descaso, o crescimento desordenado das grandes cidades brasileiras gerou severos gargalos no suprimento de serviços urbanos essenciais. As causas do descalabro foram múltiplas e continuadas: altas taxas de crescimento demográfico; intensas migrações internas; rebatimento da concentração de renda na ocupação e uso do solo urbano; e drástica redução na capacidade de investimento público. Mas o que mais chama a atenção na urbanização brasileira, especialmente nas grandes metrópoles e suas regiões do entorno, é terem persistido, por décadas, a absoluta falta de planejamento e a ocupação desordenada do solo. É evidente que, por maiores que sejam os apelos dos eventos esportivos, não será em exíguos três anos que teremos resolvidos os graves problemas de mobilidade, transporte público, saneamento, disposição de lixo e resíduos, degradação ambiental, distribuição de energia, telecomunicações, segurança pública e contenção da criminalidade. É preciso ter consciência, pois, de que a agenda urbana do País transcende os eventos esportivos. Mas estes poderão ser a grande oportunidade de promover mudanças de paradigmas. Poderão fomentar a motivação para que as autoridades federais, estaduais e municipais enfim se unam para mobilizar recursos humanos e materiais para planejar melhor o futuro das nossas cidades. Poderemos pensar grande ou sermos mesquinhos em relação às possibilidades de mudança. Se prevalecer a ideia de mudança, poderemos enxergar um legado mais permanente desses eventos. O importante seria aproveitá-los para motivar decisões de cooperação técnica, investimentos e fomento de parcerias com governos e empresas de países onde a questão urbana, apesar de complexa, está mais bem resolvida. Isso é importante porque, embora as metrópoles brasileiras sediem centros de decisão e unidades de produção de grandes conglomerados internacionais, as infraestruturas urbanas há muito não despertam interesse para o capital externo, exceto na área imobiliária. O crescimento desordenado e o gigantesco aumento das carências eram por demais complexos e assustadores para o setor privado internacional, principalmente pela instabilidade institucional e jurídica. Agora que o crescimento demográfico e as migrações internas se estabilizam e que temos melhorias na distribuição da renda, com inclusão de camadas menos favorecidas, abrem-se oportunidades fantásticas para o aporte de capital internacional voltado para grandes projetos urbanos. Ou seja, investir nas infraestruturas urbanas do Brasil pode vir a ser um bom negócio. Se prevalecer a visão mesquinha e fecharem-se as portas para soluções de longo alcance, perderemos a grande oportunidade de mudar os padrões de crescimento urbano. Será cantada em prosa e verso nossa capacidade de improvisação, com a preparação e execução às pressas de um Plano B ou C. São exemplos conspícuos disso as perspectivas para os aeroportos e estádios sem acessibilidade. Se, desde a indicação do País para sediar os eventos, o governo federal tivesse assumido postura de incentivo ao planejamento e coordenação de projetos e ações, estaríamos hoje correndo menos riscos. Como a capacidade de investimento do governo é muito baixa, haverá necessidade de aporte de recursos privados. Há uma vasta gama de oportunidades, em termos de concessões e parcerias. Esperemos que o interesse e a motivação transcendam os eventos esportivos e transmitam um legado, que não seja o da nossa miséria, como diria o grande Machado. |