O Estado de S. Paulo - 02/05/2012 |
Alguém precisava tratar o comportamento cartelizado dos bancos com a necessária dureza. A presidente Dilma começou uma queda de braço, mas isso é pouco. Não é apenas com retórica que se chega lá. Seu discurso de 1.º de maio na TV, de forte crítica ao comportamento dos bancos, teve tom inusitado. Mas a única ação prática colocada em marcha até agora – que nem pode ser chamada de política de governo – é a decisão de levar os dois maiores bancos oficiais de varejo, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal, a baixar os juros e a trabalhar com planilhas de juros e spreads mais baixos, de modo a arrastar também para baixo os juros cobrados pelos bancos privados. As primeiras reações das instituições privadas foram insatisfatórias e tende a continuar sendo assim, porque falta ao governo federal capacidade impositiva – algo que os ingleses chamam de enforcement. Alguns grandes bancos divulgaram tabelas de juros mais baixas do que as anteriormente praticadas, mas logo se viu que se destinavam mais a compor jogo de cena e a dar alguma satisfação à opinião pública do que a levar a sério os efeitos da ação do governo. Para reduzir os juros, não se pode focar somente os bancos. Os juros praticadas pelas operadoras dos cartões de crédito são ainda mais escorchantes. Se são inaceitáveis os juros cobrados no financiamento de capital de giro para pessoas jurídicas (na média, de 40% ao ano, como apurou o Banco Central) ou no crédito direto ao consumidor (49% ao ano) e se articulam a "lógica perversa" – como denuncia a presidente Dilma –, o que se pode dizer, então, dos juros ao ano do cartão de crédito (238%, conforme levantamento da Anefac) e do cheque especial (176%)? Mas, afinal, o que fazer para derrubar os juros ao produtor e ao consumidor? A mais longo alcance, o melhor caminho que o governo federal tem a tomar para ser capaz de restabelecer um mínimo de competitividade no segmento bancário é reduzir sua própria dívida. O grande tomador de crédito no Brasil, em condições até recentemente próximas do monopólio, continua sendo o Tesouro Nacional, que tem no mercado nada menos que R$ 1,9 trilhão em títulos, um pouco menos do que o atual estoque geral de crédito (R$ 2,1 trilhões). Se têm à sua disposição um devedor que paga bem ("os juros básicos mais altos do mundo") e no mole; se esses financiamentos não oferecem risco de crédito; e se não acarretam custos operacionais relevantes de financiamento; por qual motivo os bancos têm de dar melhores condições para conquistar clientes? Redução da dívida, por sua vez, implica disciplina fiscal. Ou seja, um pouco mais de superávit ajudaria a baixar ainda mais os juros. Outra providência seria assegurar que a derrubada do spread e dos juros não se limitasse aos contratos novos de crédito, mas que se estendessem aos antigos. As instituições financeiras não temem o crescimento da inadimplência? Pois importante passo para evitar calotes seria renegociar contratos antigos, oferecendo prazos e juros melhores. Os bancos oficiais também poderiam oferecer essa redução dos juros nos contratos antigos aos clientes dos bancos privados que enfrentam custos altos. Um bom incentivo oficial para isso também poderia ajudar. A terceira providência necessária já foi tratada por esta Coluna em algumas edições anteriores. Consiste em aprovar imediatamente a adoção do cadastro positivo para que seja permitida a redução dos juros para os devedores de baixo risco. Finalmente, não basta simplesmente derrubar os juros. Igualmente escorchantes são ainda as taxas de administração e as tarifas cobradas pelo sistema bancário – incluídos aí o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal. Depois do discurso do Dia do Trabalhador, a bola não está apenas com os bancos. Está também com o governo. |