Visto assim do alto, o incentivo à gastança do presidente Luiz Inácio da Silva parece só mais um exercício de oratória à deriva, ainda mais quando em contraste com a defesa da contenção de gastos feita pela maioria dos prefeitos em seus discursos de posse.
A menos que o governo federal estivesse em vias de criar algum tipo de programa beneficente para municípios, uma espécie de bolsa-prefeitura, o que o presidente da República diz não guarda a menor relação com o que a realidade financeira dos prefeitos permite.
Examinada mais de perto, porém, a manifestação de Lula revela uma precisa intenção de natureza política: pontuar uma diferença, marcar um contraponto, prorrogar a identificação da era Lula com os tempos de bonança na economia, manter colada a imagem de Lula à fortuna, preservar a associação de sua figura à fartura.
Assim, quando os ventos mudarem e os efeitos dessa mudança trouxerem um cotidiano mais difícil, Luiz Inácio reinará consolidado como o arauto da boa sorte, do Brasil exuberante.
Fixada desse modo a lembrança, no mínimo fica garantido o registro histórico para sempre favorável. No máximo, pavimentado com bom asfalto o caminho de volta mais à frente se as circunstâncias permitirem.
Seja qual for a agenda da crise, sejam quais forem as necessidades de prefeitos, governadores, candidatos e até do futuro presidente, Lula continuará passando ao largo da adversidade enquanto os outros se encarregam de transmitir ao País as notícias mais realistas.
Ficam assim divididas as tarefas: "eles" fazem o que é preciso fazer e Lula fala o que lhe convém dizer.
Tal distribuição de trabalho serve tanto para os dois últimos anos de governo quanto para a campanha eleitoral de 2010 e, se for o caso, para o PT na eventualidade de voltar a ser oposição no próximo mandato presidencial.
A discrepância nos discursos não significa que os defensores da contenção sejam responsáveis e que Lula e a turma do todo vapor sejam desprovidos de juízo.
A estes talvez falte um pouco de escrúpulos quando vendem a exuberância, os investimentos, a melhoria da infraestrutura como se aqueles não abraçassem a mesma causa por ausência de sensibilidade ou de "vontade política".
Detalhe que não chega a impressionar, muito menos a configurar novidade. Trata-se, aliás, de um dos aspectos em que Lula mantém a coerência. Sempre fiel à missão de renovar esperanças, não obstante a falta de compromisso com as circunstâncias objetivas.
Lua de felHá mais de um mês o PMDB tenta produzir uma conversa "sigilosa" e "definitiva" entre Luiz Inácio da Silva e José Sarney. No dizer da cúpula do partido seria uma conversa de "presidente para ex-presidente", com a finalidade de resolver a questão da presidência do Senado.
Questão esta, diga-se, transformada em problema - o primeiro da série "rumo a 2010" - porque o PMDB assim deseja. Se o partido preferisse uma convivência pacífica com o governo, deixaria as coisas no curso natural, disputando a presidência da Câmara com o apoio do PT e apoiando o parceiro para o comando do Senado.
Como investe na desarmonia, inventa obstáculos e transfere para Lula a tarefa de remoção. Se o presidente da República estivesse mesmo interessado em se avistar com Sarney ou se enxergasse nesse encontro a solução de fato, já teria chamado o senador.
O PMDB, da mesma forma. Se visse nisso uma saída real e se quisesse mesmo preservar o sigilo da conversa, não tomaria a iniciativa de manter o assunto vivo no noticiário.
Portanto, o objetivo do partido não é outro senão o de criar dificuldades para depois pôr preço nas facilidades.
O presidente da República tem clareza do quadro e o PMDB sabe que Lula enxerga a existência de ocultas intenções, mas ambos se fazem de mortos. Até o momento em que um dos dois resolva dar o bote no coveiro.
Tal qualPode ser só uma coincidência. Mas pode também ter sido fruto de um conselho de um antigo amado mestre, a visita de surpresa a um hospital público feita por Eduardo Paes no domingo, aos primeiros acordes de seu mandato como prefeito do Rio.
A presença física em filas e hospitais foi a forma escolhida por José Serra para inaugurar sua gestão à frente do Ministério da Saúde, no governo Fernando Henrique. Obedecendo à seguinte lógica: se um problema é de difícil solução, o agente público deve pelo menos transmitir à população interesse por ele.
Antes de se filiar ao PMDB, depois de sair do PFL, Eduardo Paes foi do PSDB, onde ocupou a secretaria-geral por obra de José Serra, a quem continua muito ligado.
Medida provisóriaA nomeação do delegado Paulo Lacerda como adido policial da embaixada brasileira em Lisboa é da maior relevância. Além de urgente, claro.
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