Folha de S Paulo Política econômica põe governo Dilma à esquerda de Lula PARA EX-MINISTRO TUCANO, PRESIDENTE É MAIS IDEOLÓGICA E TEM PROPOSTA DE INTERVENÇÃO MAIS FORTE NO ESTADO QUE O SEU ANTECESSOR ELEONORA DE LUCENA DE SÃO PAULO Ex-ministro tucano, Luiz Carlos Mendonça de Barros, 68, traça diferenças entre Lula e Dilma. Conclui que a atual política econômica está mais à esquerda. Nesta entrevista, fala de inflação e sugere redução no crescimento. Também advoga a implantação de quarentena para o capital externo. Para Mendonça, as finanças vão ficar menos confiantes no governo se o ministro Antônio Palocci (Casa Civil) cair. Executor de boa parte da privatização nos anos FHC, avalia que o PSDB é hoje um partido mais medíocre. Folha - Quais são as diferenças ente Dilma e Lula? Luiz Carlos Mendonça de Barros - A economia de Lula era continuidade da de FHC. Quando a inflação ameaçava subir, o BC aumentava juros. Está claro que Dilma mexeu nessa lógica. O pessoal da Unicamp passou a ter papel de formulador de política. O Banco Central de [Henrique] Meirelles tinha uma linha mais liberal, de gente do mercado financeiro. O BC de Dilma é formado por burocratas. Existe uma visão de que o BC era sempre capturado pelas finanças. Não era capturado. O BC reproduzia a leitura que o mercado financeiro tem da política econômica. E agora não mais? Não. Há diferença de comportamento. É muito difícil para um burocrata ir contra a hierarquia. Com Lula, havia um conflito entre BC e Fazenda. Quem ganhava era o BC. Houve uma inversão. A política econômica é conduzida por [Guido] Mantega. No sistema de metas, está se levando em consideração o custo para o crescimento. E usam outros instrumentos além dos juros, como as medidas macroprudenciais. O mercado financeiro está insatisfeito? Quer acreditar que não mudou nada. Está num período de grandes incertezas. O mercado está sendo prejudicado? Não, mas muda a forma de trabalhar. O mercado detesta mudança. O governo Dilma -e daí a importância da questão do Palocci- tem uma irracionalidade. Tem um lado que aparentemente é dominante e que tem uma leitura diferente da de Lula. E o Palocci é um sinal de que a racionalidade anterior não está abandonada. O sr. acha que ele vai ficar? Não sei. A Bolsa caiu, o dólar subiu. É porque tem uma insegurança latente. Se Palocci sair, vai ter um efeito importante sobre expectativas. Vai ficar menos confiante na política do governo. É importante mostrar que Dilma tem política diferente. É mais à esquerda? O pensamento econômico do governo Dilma é mais à esquerda do que na época de Lula. Tem uma ideia de intervenção mais forte do Estado. Com Lula havia um certo conflito. A macroeconomia era bem ortodoxa, mas o Estado intervinha. Com Dilma aumentou essa contradição. Ela é mais ideológica. Não percebeu a herança maldita de Lula. O crescimento do consumo foi forte e não foi acompanhado pelo investimento produtivo. Entraremos num período em que a inflação vai cair porque tem deflação nas commodities. O país pode se desamarrar do sistema de metas de inflação? Não, porque é preciso uma referência. Sou a favor de um sistema de metas que leve o custo da convergência da inflação em consideração. Mas fazer isso agora é complicado. Bagunça as expectativas. É preciso reduzir o crescimento agora? Não há dúvida. O aspecto mais preocupante é o mercado de trabalho. No início de Lula o desemprego era de 12%. Hoje é de 6%. Isso faz uma diferença brutal. |