Política
Erros do pacote Miriam Leitão
Eleitor nenhum gosta de pacotes de ajuda a bancos. De cada 10 telefonemas que os deputados americanos recebem dos eleitores, sete condenam o projeto. Mas em relação ao pacote específico, que está no meio do tiroteio em Washington, há críticas técnicas a ele. Economistas de tendências diferentes vêm mostrando uma série de erros. Ele é mal concebido, dizem vários deles.
Para qualquer pessoa que tenha perdido sua casa porque o banco foi implacável, e milhões passaram por isso nos EUA desde o início da atual crise, fica incompreensível que justamente os bancos sejam ajudados. É difícil passar para qualquer leigo a idéia de que o desmonte do mercado financeiro tem um efeito demolidor que afeta toda a economia. Mas o pacote de Paulson tem sido criticado até por profissionais.
Os eleitores entopem os emails e telefones dos deputados, que por sua vez estão em plena disputa eleitoral.
Grande parte do Congresso será renovada e a tendência é de os republicanos perderem as eleições parlamentares. Isso, em parte, explica por que foi dos republicanos a pior reação ao pacote do próprio governo republicano. Eles estavam tentando responder à reação dos eleitores.
No primeiro contato com parlamentares, semana passada, o secretário Henry Paulson e o presidente do Fed, Ben Bernanke, foram bemsucedidos em assustá-los.
Usaram expressões fortes, como a de que a economia estava às vésperas de um ataque cardíaco, que poderia ser na semana seguinte. Ao longo desta semana, no entanto, os deputados e senadores saíram do estado de choque e ganharam musculatura no debate. Argumentos contrários foram se somando e sendo avalizados por uma série de economistas conhecidos.
Os deputados ficaram com a munição da reação popular e da crítica racional.
Isso os fortaleceu na discussão.
A “Economist” sustenta que há mais diferenças que semelhanças da situação atual com a de 1929, o grande fantasma que tem sido agitado para derreter resistências.
O desemprego chegou a 25% naquela época e, agora, mesmo crescendo, está em 6%. A inadimplência chegou a 40% em 29. Segundo a revista, há o risco de se pagar demais pelos ativos bancários, elevandose o déficit fiscal americano à estratosfera e ameaçando seriamente o dólar. Ela lembra que US$ 700 bilhões é mais do que todo o dinheiro depositado no FDIC, o fundo que garante os depósitos dos correntistas americanos.
O grande problema que tem sido apontado por economistas é que, em todos os precedentes de crises bancárias, o processo de compra de ativos podres aconteceu depois que os bancos quebraram.
As Savings&Loan quebraram no começo dos anos 80 e a Resolution Trust Corporation foi criada apenas em 1989. No Japão, os bancos quebraram no começo de 90 e a reestruturação aconteceu no fim da década. Esse tipo de ação preventiva, ao estilo de George Bush, levanta uma série de dificuldades, e a pior delas é a da precificação.
Glenn Hubbard, reitor da Columbia Business School e expresidente do Conselho de Consultores Econômicos de Bush, diz o seguinte: “Isso pode ser feito de forma mais eficiente, por meio da injeção de ações preferenciais do governo.
Então o mercado poderia precificar os ativos.” Duzentos economistas acadêmicos assinaram um documento enviado ao Congresso, organizado pela Universidade de Chicago, dizendo que o plano de Paulson cria “incentivos perversos”, é “muito vago” e seus efeitos não estão claros.
Eles admitem que a economia corre riscos se houver congelamento do fluxo de crédito. Frederic Mishkin, economista da Columbia, que foi membro do Fed até o mês passado, lembrou que quando as coisas saem do controle “o custo para consertálas mais tarde sobe exponencialmente”.
O problema é que, mesmo admitindo o risco, os economistas estão alertando que o caminho escolhido pode trazer também inúmeras distorções.
Luiz Zigale, da Universidade de Chicago, diz que o programa de Paulson “comprará ativos podres a preços inflados, criando uma instituição de caridade que provê assistência social para os ricos às custas dos contribuintes”.
Ele fala que é também a violação do princípio capitalista de que “os ganhos devem garantir as perdas”. Na época das S&L, os depósitos estavam segurados e o governo teve que pagar o custo.
Agora, como garantir o mesmo benefício para credores de bancos de investimento que nem estavam sob supervisão bancária? Alguns dos críticos, como Alan Blinder, acham que o governo está sendo açodado e que nada disso precisa ser decidido esta semana. Outros, que o governo está fazendo um caminho longo demais se o que quer é, de fato, socorrer cidadãos comuns que não estão conseguindo pagar ao banco. O prêmio Nobel Joseph Stiglitz acha que o erro é que o plano parte do princípio de que se o governo prover moeda suficiente aos mercados financeiros o problema vai desaparecer.
“Mas isso não ataca o problema fundamental da sangria de ações de despejo e dos buracos nos balanços dos bancos.” Edward Leamer, da Universidade da Califórnia, toca no ponto nevrálgico: Henry Paulson não terá de responder na Justiça por seus atos. “Quando li isso pela primeira vez, pensei que era uma piada.” É difícil encontrar algum economista, fora do mercado financeiro, que diga que o plano de Paulson resolverá a crise financeira.
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