Esta é uma crise financeira diferente das anteriores e seus desdobramentos não estão claros. Ficou bem mais difícil planejar a vida econômica e os negócios.
Ontem o Relatório de Inflação, edição que neste quarto trimestre leva 103 páginas, reconheceu a existência de pelo menos três grandes incertezas na trajetória da inflação e da política monetária (política de juros) de 2009: (1) duração e tamanho da crise; (2) repasse da alta do dólar (pass-through) sobre os preços; e (3) comportamento da atividade econômica interna. Convém aceitar o roteiro e avaliar os riscos.
A rejeição do risco e a procura por portos seguros (de natureza também questionável) produzem uma infinidade de efeitos. Entre eles estão a queda do consumo (demanda), recessão, desvalorização dos ativos e derrubada dos preços das commodities. A maior parte dos efeitos está associada à queda de preços, a ponto de se dar como certo que o mercado global caminha para a deflação ou para estado parecido.
Mas isso não é tudo, porque os governos atuam, e como! Todos os bancos centrais e secretarias de tesouros dos países ricos estão despejando volume sem precedentes de recursos, contados em trilhões de dólares, tanto para salvar bancos e empresas como para reativar o consumo. Fica difícil avaliar qual será o resultado disso no quadro geral de inflação e o quanto desse resultado encontrará terreno aqui dentro. Hoje, a inflação interna está cedendo em conseqüência da retração do consumo e da queda dos preços das commodities.
Ninguém sabe até onde subirá a cotação do dólar em reais ou se voltará a se retrair. Em geral, dólar caro leva ao aumento dos preços internos, pois encarece os importados e as mercadorias produzidas internamente cujas cotações são fixadas em moeda estrangeira (caso de alimentos, componentes e matérias-primas). De junho até agora, o dólar já subiu 47% em reais e, no entanto, o repasse aos preços internos foi insignificante.
Em segundo lugar, não se sabe a partir de quando e de quanto será o repasse. Até agora, produtor e comerciante evitaram descarregar a alta do dólar sobre os preços ao consumidor, aparentemente por temerem o encalhe de mercadoria. Difícil saber como ficam esses efeitos no futuro.
E, finalmente, há o comportamento interno da economia. Decididamente, o consumo já não segue tão robusto quanto descreviam os documentos do Banco Central. Também não há indicação de que a oferta interna siga insatisfatória, porque, além da queda do consumo, já há sobra de exportações que está sendo empurrada para o mercado interno.
Também não se sabe a que ritmo prosseguirão os investimentos. O PAC pode empacar ainda mais com a falta de financiamento externo e a exploração do pré-sal pode ser adiada por falta de elementos para definir custos e renda futura.
Em todo o caso, o Brasil está mergulhado na crise em condições bem melhores do que no passado. As incertezas tornam o ambiente muito instável, mas quando isso tudo acabar, sabe-se lá quando, a posição da economia brasileira tende a ser bem melhor do era antes da crise.
E fica a dúvida. Se o Banco Central tanta incerteza vê no comportamento dos fatores de inflação, como pode cravar 4,7% na inflação final de 2009? |