O GLOBO
Ultrapassado um dos mais importantes obstáculos, com a recente aprovação, na Câmara de Representantes (deputados) dos Estados Unidos, de um projeto de lei que limita pela primeira vez as emissões de gases de efeito estufa, uma das prioridades do presidente Barack Obama, o movimento internacional para a mudança do clima se depara com dois novos desafios: a ratificação, pelo Senado americano, do "Ato de Energia Limpa e Segurança" — cuja dificuldade pode ser ainda maior do que na Câmara (o projeto foi aprovado por 219 votos a 212, apenas um a mais do que o mínimo necessário), embora o governo tenha na teoria uma maioria à prova de obstruções — e a confirmação, na Assembleia Geral da ONU, em setembro, da realização da Terceira Cúpula da Terra (a Rio+20), em 2012.
Na avaliação política do embaixador extraordinário para o Meio Ambiente, Sérgio Serra, sem dúvida alguma a decisão da Câmara dos Representantes foi passo importante para um comprometimento sério dos EUA com metas de redução de emissões de CO2, mas é preocupante a reduzida margem da aprovação: só 7 votos, tendo 44 dos 255 deputados democratas votado contra.
O plano dos Estados Unidos busca reduzir as emissões de CO2 criando empregos ecológicos e reduzindo a dependência de fontes de energia estrangeiras, uma das promessas de campanha de Obama.
O objetivo de redução de 17% das emissões de gases de efeito estufa em 2020 em relação ao nível de 2005 é considerado tímido, mas um bom começo para o maior poluidor do planeta, que se recusou a seguir o Protocolo de Kyoto.
Além disso, os fornecedores americanos deverão produzir no mínimo 15% de energia de fontes renováveis (eólica, solar) em 2020, e adotar medidas de eficiência energética que gerem uma economia anual mínima de 5%.
Mais decisiva na evolução desse processo, porém, é a realização da Terceira Cúpula da Terra (a Rio+20), em 2012, conforme o calendário histórico da ONU, sobre a qual pairam sérias dúvidas.
Na definição do embaixador Serra, "estamos empenhadíssimos" no assunto, bastando lembrar que o próprio presidente Lula lançou a ideia quando discursou na abertura da 62aAssembleia Geral, em 2007.
Nas suas palavras: "É muito importante o tratamento político integrado de toda a agenda ambiental. O Brasil sediou a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Rio-92.
Precisamos avaliar o caminho percorrido e estabelecer novas linhas de atuação. Por isso, proponho a realização, em 2012, de uma nova conferência, que o Brasil se oferece para sediar, a Rio+20".
O Brasil está trabalhando para sediar o encontro, enquanto outros países procuram adiá-lo ou simplesmente eliminá-lo do calendário mundial, sob diversas alegações.
Há os que temem que a nova cúpula venha a ser palco de cobranças de compromissos não cumpridos, e aqueles que simplesmente acham que o mundo está farto de reuniões de cúpula (a chamada "summit fatigue").
Há, ainda, os que prefeririam que a conferência se realizasse não em 2012, mas em 2017, quando se completa um ciclo de 25 anos de funcionamento da Comissão de Desenvolvimento Sustentável (CDS), criada para pôr em prática os compromissos da Rio-92.
O embaixador extraordinário para mudança do clima considera que a Rio+20 permitiria "examinar e renovar compromissos de longo prazo assumidos desde a Cúpula do Rio, bem como analisar o cumprimento dos compromissos decorrentes do Plano de Implementação de Joanesburgo (Cúpula de Joanesburgo, de 2002, chamada às vezes de Rio+10)".
A conferência representaria a conclusão de um ciclo de 20 anos de negociações ambientais, marcando o início de novo período de engajamento da comunidade internacional.
"Há necessidade de forte e urgente mensagem política de que o desenvolvimento sustentável continua a merecer elevada atenção", adverte Serra.
Na visão de Sérgio Serra, a Rio+20 serviria como estímulo à ação, auxiliando a engajar governos, sociedade civil e setor produtivo em favor de um reforço na cooperação internacional para o desenvolvimento sustentável.
A posição brasileira é de que o encontro também serviria como fonte de inspiração para as novas gerações de cientistas, líderes, ativistas, industriais, jovens e mulheres que não puderam participar das conferências anteriores.
Outro dado a ser levado em consideração, ressalta Sérgio Serra, é que as respostas às múltiplas crises atuais "serão decisivas para informar o curso do desenvolvimento sustentável em direção a um crescimento verde".
A conferência ofereceria a oportunidade para buscar consenso em relação a esse desafio, além de aprofundar o debate sobre áreas da agenda ambiental que evoluíram na última década, como governança internacional para o desenvolvimento sustentável e água.
O Itamaraty está em campo para angariar apoios. A Coreia do Sul, que reivindicava sediar o encontro, retirou sua candidatura em nosso favor. Segundo o embaixador Serra, o grande desafio será dobrar as resistências não ao Rio de Janeiro como sede, mas à realização em si da conferência. "Mas estamos confiantes".
Quanto ao processo preparatório da Rio+20, que demanda muita antecedência, só poderá ser colocado em marcha uma vez dada a luz verde pela Assembleia Geral.
O Brasil, caso venha a ser confirmado como sede do encontro, gostaria que esse processo fosse "enxuto" e pouco oneroso, aproveitandose tanto quanto possível as estruturas da ONU, como a própria Comissão de Desenvolvimento Sustentável.