Míriam Leitão Os lados da moeda
Política

Míriam Leitão Os lados da moeda



A inflação está caindo forte. Aqui não há risco da deflação como doença econômica que leva a mais recessão. O IPCA sai amanhã e deve ser de 0,25%, o que levará o acumulado de 2008 a menos de 6%, portanto, dentro da meta. Na reunião de ontem com os empresários, o governo ouviu e prometeu ajudar, mas se a ajuda for muita, pode impedir o ajuste de preços.

A queda da inflação é a prova de que a economia está funcionando, que a lei da oferta e da procura atinge os preços livres.

“O IPA industrial está refletindo a força da queda do nível de atividade e a queda dos preços das commodities. Estão em queda preços como os do aço, dos produtos petroquímicos e até os agrícolas. O IPA agrícola, que chegou a superar 15%, termina o ano abaixo de 4%. Tudo isso ajuda a reduzir o risco de inflação, permitindo a queda dos juros”, diz o professor Luiz Roberto Cunha, da PUC.

Na economia, os fatos têm dois lados. O que assusta as empresas muitas vezes favorece o consumidor. Por isso, muita ajuda do governo, neste momento, atrapalha. Esta é a hora em que, pressionada pela queda das vendas, a indústria reduz preços para o varejo, que faz promoções para atrair o consumidor. O Ministério da Fazenda tem que ser cuidadoso ao oferecer o socorro do Tesouro. Em vários casos, o governo ajudaria se deixasse a economia funcionar.

Na reunião de ontem na Fazenda, cada setor fez reclamações e pedidos. A Anfavea divulga hoje a produção de veículos de dezembro. Mesmo com o aumento das vendas de carros em dezembro, a indústria terminou novembro com 305 mil veículos em estoque. Isso dá 56 dias de venda. Muito alto para um país com os juros brasileiros.

A indústria de máquinas e equipamentos, segundo o vice-presidente da Abimaq, José Veloso, vai começar a demitir em março, e as demissões podem chegar a 20 mil pessoas. Ele diz que o setor vive de encomendas, e elas caíram 40% em média — em alguns setores chegou a 70%.

O presidente da Associação Nacional de Material de Construção (Anamaco), Claudio Conz, pediu medidas mais ágeis. No fim do ano, o governo liberou R$ 1 bilhão para compra de material de construção, mas fez tantas exigências que o dinheiro não foi usado. Mas houve também pedidos contraditórios. A indústria de máquinas e equipamentos quer menos concorrência de importados – quem compra essas máquinas acha que elas deveriam ser desoneradas porque representam investimentos.

O governo já prometeu desoneração de impostos e muitas obras públicas para manter o ritmo de atividade.

O professor Luiz Roberto Cunha alertou que a queda dos preços está ocorrendo, em parte, pela diminuição da atividade, e lembrou que os preços controlados vão impedir a queda maior da inflação neste momento. O salário mínimo, pela regra, vai subir mais de 12%.

“O salário mínimo será corrigido pelo PIB de 2006, que foi alto, e pela inflação do ano passado, que foi alta. Isso vai se refletir no custo dos serviços, de empregado doméstico, condomínio”, diz.

A energia subirá por alguns modelos de correção tarifária, como o de Itaipu, que sobe na mesma proporção do dólar. Os combustíveis poderiam cair mais se não fossem fornecidos por empresa monopolista. Educação vai ser reajustada agora, no começo do ano. A ajuda virá de queda de preços de vestuário e de bens de consumo duráveis.

Menos inflação é igual a mais espaço para queda das taxas de juros, que significa menos gasto financeiro do governo e mais flexibilidade monetária para a economia. Luiz Roberto acredita em quatro cortes de meio ponto percentual seguidos.

Para quem se assustou com a queda da produção industrial e a diminuição de demanda e produção nos últimos dias, vale uma conversa com o economista John Welch, analista de economia global do Itaú. Filho de americano com brasileira, John passou os últimos tempos em bancos americanos e europeus.

“Estou feliz de estar no Brasil. O ambiente aqui é muito melhor. Na Europa e nos Estados Unidos a crise é muito maior. Principalmente na Europa, onde a crise não é apenas contágio como se imagina. Eles têm também um problema imobiliário grave, como a Inglaterra, a Irlanda e a Espanha, e demoraram muito mais que os EUA a agir contra a crise e, por isso, entraram em recessão primeiro”, conta ele.

Welch acha que o pacote de Obama vai fazer efeito só no segundo semestre.

“As pessoas estão cautelosas, os bancos estão cautelosos. Bancos não emprestam e pessoas não querem gastar e devem usar o ganho com a redução de impostos para pagar dívidas ou poupar. Só uns 10% devem ir para o consumo.”

Luiz Roberto Cunha acha que a recuperação do Brasil pode começar no segundo semestre. Mas ele alerta que, quando vier a recuperação, as empresas podem tentar repassar o aumento do dólar para os preços.

“Se a economia mundial se recuperar no segundo semestre e o Brasil ainda estiver crescendo, o repasse será mais fácil, e isso pode elevar a inflação novamente. O governo vai fazer tudo para segurar a economia, só que isso também aumenta o repasse da alta de custos aos preços.”

Com Leonardo Zanelli




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