Política
Leve alento Míriam Leitão
O GLOBO
Qualquer número positivo numa crise é alentador, mas não pode ser encarado como tendência. A alta de 1,4% nas vendas do varejo em janeiro para dezembro de 2008, divulgada pelo IBGE, não é, infelizmente, a retomada do consumo e o fim da crise. O economista Luiz Roberto Cunha acha que fevereiro terá nova alta, mas por causa das liquidações, que continuaram no mês passado.
Mas depois de uma semana com um número tão horrível, o do PIB, uma notícia como este pequeno aumento no comércio ajuda a começar o fim de semana. Mas o próprio IBGE, que divulgou a pesquisa, alertou que o crescimento nas vendas do varejo ainda não é uma tendência. O pesquisador da coordenação de Comércio do IBGE, Nilo Lopes, disse ao Alvaro Gribel, do blog, que só a partir dos resultados de fevereiro e março é que será possível dizer se o comércio se recuperou ou se a alta foi impulsionada pelas liquidações.
O economista Luiz Roberto Cunha, da PUC, acha sim que o crescimento foi motivado pelas liquidações.
- A liquidação foi maior em janeiro, mas continuou em fevereiro. Além disso, o comércio, que é o grande empregador, não demitiu como a indústria. Foram muitas promoções, em vários setores, como o de automóveis, beneficiado com a redução de IPI. E como as liquidações continuaram em fevereiro, devemos ter nova alta.
Os dados da Fecomércio-SP não são os mesmos do IBGE. Na pesquisa feita por eles, as vendas em janeiro tiveram uma queda de 3,8% para janeiro de 2008 - a alta do IBGE foi de 6%. Fábio Pina, economista da Fecomércio-SP, explica que a tendência para fevereiro, no índice da entidade, ainda é de queda nas vendas.
- As promoções têm um efeito positivo, mas não têm força para reverter esta crise. Numa crise de menores proporções, elas até podem ajudar numa retomada. Mas, agora, o que se pode dizer é que ações pontuais, como a redução do IPI nos automóveis, que são como um prêmio para o consumidor que for comprar, ajudaram.
Pina acha que o primeiro semestre ainda vai ser negativo para o varejo, com queda entre 0,5% e 1%. No segundo semestre podem vir números positivos se o cenário de saída da crise estiver se desenhando. Do contrário, o ano deve ser negativo.
- Só nos próximos meses é que vamos saber se há ou não uma tendência de recuperação. Para o consumo voltar, é preciso que as pessoas que perderam o emprego acreditem que vão recuperar a vaga e que quem está empregado não vai perder - conta ele.
O CSFB, em comunicado de ontem, disse que a diminuição da massa salarial, a falta de crédito e o desemprego devem desacelerar as vendas no varejo.
Depois de dois meses de promoções, o varejo vai, agora, repor o estoque. Muitas indústrias ainda estão estocadas, outras não. Certo é que quando chegarem os novos produtos as promoções acabam, porque a indústria, mesmo em crise, tentará corrigir alguns preços. Para Luiz Roberto Cunha, março é o mês em que a indústria pode começar a voltar a produzir e que o comércio vai começar a sentir os efeitos da crise.
- A partir de março e abril o comércio vai sofrer. Acaba o estoque, acabam as liquidações, como a de vestuário, vem um preço que não é de estoque.
O presidente da Abinee, Humberto Barbato, também acha que a recuperação da indústria, e do setor de eletrônicos, começa em março, mas de forma muito tênue.
- Tenho a sensação que a situação vai melhorar, com um ciclo mais positivo. Não que a indústria vá admitir novos funcionários. Isso vai acontecer lá pelo segundo semestre. Mas acho que vai ser o início da retomada.
Segundo Barbato, alguns setores dentro da indústria eletrônica estão bem, como o de infraestrutura, que tem encomendas feitas no ano passado, e o de segurança, com grades, cercas e portões eletrônicos. Já a situação das empresas ligadas a bens de consumo duráveis é a mesma do fim de 2008, com uma demanda menor.
- Março vai ser sintomático. Vai ter reposição e novos pedidos para as empresas ligadas à infraestrutura. Então, poderemos saber se teremos melhora ou se a produção vai ficar estável. Já para os bens de consumo duráveis, tem de ver como ficam os estoques - diz Barbato.
Mesmo com expectativa positiva para a volta da produção, Barbato diz que 2009 não terá crescimento, o que só deve ocorrer em 2010. Neste ano, a indústria eletrônica deve ficar no nível de 2007, o que, para ele, já seria bom para o setor. O presidente da Abit, Agnaldo Diniz Filho, diz que em fevereiro o setor exportou menos e vendeu menos para o mercado interno.
- A retomada do setor têxtil não vem agora, mas há sinais de melhoras em alguns setores, como jeans, o que já é alguma coisa.
A pesquisa da CNI trouxe a informação de que um número maior de indústrias está se dizendo atingida pela crise. Por isso, o dado de ontem deve ser visto com cautela. Luiz Roberto Cunha acha que um bom resultado para o Brasil é ficar no 0 a 0 no fim de 2009, mas isso só se a economia se recuperar no segundo semestre.
- Não quero derrubar o otimismo, mas vai ser difícil. Não acho que o Roubini está certo, que a crise vai durar 36 meses, mas ela vai demorar para acabar - diz ele, referindo-se ao economista americano que previu a crise e continua pessimista sobre a evolução da conjuntura econômica.
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