A crise global atingirá tão fortemente o mercado de trabalho em todo o mundo que, em 2009, pela primeira vez, o número de trabalhadores desempregados no planeta superará 200 milhões. Em conseqüência da crise, muitos avanços sociais alcançados nos últimos anos poderão se perder. Até o fim de 2009, o número de miseráveis no mundo aumentará em 140 milhões de pessoas.
Depois de apresentar previsões como essas - cuja confirmação, ou não, dependerá da duração e profundidade da crise, que nem ele nem ninguém pode prever -, o diretor-geral da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Juan Somavia, fez uma advertência: "Precisamos de um plano de resgate econômico para famílias trabalhadoras e para a economia real, com regras que gerem empregos decentes."
Não é possível, ainda, determinar em que países o desemprego será maior, mas a OIT deixa claro que a advertência vale para todos os governos, inclusive o brasileiro.
O Brasil, diz a OIT, dificilmente criará 2 milhões de empregos em 2009, como criou nos anos de 2007 e, até agora, em 2008: "Os efeitos indiretos da crise vão afetar as exportações e a produção industrial no Brasil", prevê a OIT. Também os investimentos poderão ser afetados. Além disso, o Brasil não conseguiu reduzir a informalidade, que chega a 70% dos trabalhadores e tende a crescer nos períodos de crise.
Em relatório que divulgou na semana passada, a OIT havia enfatizado o efeito mais negativo da crise financeira sobre o mercado de trabalho: quem menos ganhou no recente período de prosperidade mundial é quem mais vai sofrer com os custos do ajuste financeiro e econômico.
A globalização estimulou o progresso, com benefícios generalizados. Mas, segundo a OIT, alguns ganharam mais do que outros, e os que mais ganharam foram os que já estavam no topo da pirâmide social, o que aumentou o fosso entre os mais ricos e os mais pobres no mundo. Também a crise terá efeitos desiguais sobre as diferentes camadas sociais.
"A desaceleração da economia mundial afeta de maneira desproporcional os grupos de baixa renda", disse a OIT, "e isso ocorre depois de uma longa fase de expansão, na qual a desigualdade de renda já vinha aumentando."
O relatório examinou a evolução do mercado de trabalho do início da década passada até meados da década atual em 73 países e constatou que em 51 deles a massa salarial diminuiu como proporção da renda nacional. Em mais de dois terços dos países, a renda dos 10% que ganham mais aumentou bem mais depressa do que a renda dos 10% que ganham menos.
"O relatório mostra de maneira clara que a distância entre as famílias ricas e pobres aumentou do começo dos anos 90 para cá", disse Raymond Torres, diretor do Instituto Internacional de Estudos Trabalhistas da OIT. "Isso mostra o impacto da globalização financeira e a baixa eficácia das políticas nacionais para melhorar a renda das camadas médias e dos grupos de poucos recursos."
As economias nacionais tornaram-se mais produtivas, e algumas obtiveram ganhos de produtividade excepcionais de 1990 a 2006. Mas, em muitos países, os ganhos de produtividade não foram transferidos para os trabalhadores.
Num grupo de 32 países examinados pela OIT, o que apresenta a maior disparidade entre aumento de produtividade e aumentos reais de salários é o Brasil. No período analisado, o salário real diminuiu, enquanto a produtividade cresceu, em média, quase 4% ao ano.
O sistema de coleta de impostos poderia reduzir a disparidade de renda entre as várias camadas sociais, mas, no caso do Brasil, o relatório da OIT observa que o "complexo" sistema tributário "afeta mais os pobres", pois os impostos indiretos pagos por estes representam uma fatia maior de sua renda do que a fatia dos impostos indiretos pagos pelos mais ricos.
A crise global, apontou a OIT, coloca os governantes diante de um novo desafio na área social: elaborar e colocar em prática políticas públicas capazes de impedir que desigualdades de renda se transformem em fonte de intranqüilidade social e ineficiência econômica.
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