É um erro técnico definir o PIB como o total da riqueza produzida no país durante um determinado período. A contabilidade social de um país ou de uma região pode ser elaborada em termos de variáveis-fluxo ou de variáveis-estoque. Uma variável-fluxo se mede num período de tempo (ano, trimestre, etc.), como, por exemplo, o PIB, os investimentos, o consumo, etc. Uma variável-estoque se mede num dado instante do tempo, como, por exemplo, a riqueza nacional não financeira no dia 1º de janeiro de 2008, que se exprime pelo valor da capacidade instalada em termos de potencial produtivo (hidrelétricas, máquinas, equipamentos, áreas agricultáveis, etc.), pelo valor do capital natural, etc.
Portanto, o PIB é uma variável-fluxo e a riqueza, uma variável-estoque. É um erro confundir o estoque de água num reservatório em dado instante com os fluxos de entrada e saída de água desse reservatório num período de tempo. Novos fluxos de investimentos em capital físico, realizados durante o ano, modificam o valor da riqueza nacional não financeira, calculado no fim do ano. Essa distinção conceitual pode ser ilustrada por meio da descoberta do pré-sal, caracterizada como o aumento do valor do capital natural do País, que terá impactos favoráveis sobre o crescimento do PIB somente a partir do momento em que se iniciarem os fluxos de investimento de sua exploração.
Embora essa distinção conceitual esteja consolidada na literatura econômica, é muito complexa a relação entre os dois tipos de contas sociais por causa da incorporação das expectativas do futuro econômico sobre as decisões de produção e investimentos no presente e da presença de capitais intangíveis nas concepções modernas de desenvolvimento sustentável.
Há várias classificações dos diversos tipos de capital que podem contribuir para o desenvolvimento de um país ou de uma região. O Banco Mundial distingue sete formas de capital, divididas em capital físico e capital social. Normalmente, as regiões e os países menos desenvolvidos dispõem de uma concentração relativamente menor de capital social ou intangível - justamente as formas de capital que dão sustentabilidade a um crescimento contínuo da produtividade e da prosperidade.
O sistema de contas nacionais do Brasil tem medido, desde os anos 50, o grau de prosperidade do País, dos Estados e dos municípios em termos de fluxos agregados anuais e trimestrais de produção, renda, investimento, etc. Pouco se sabe sobre o que se passa com o valor econômico das diferentes formas de capital físico e de capital social, a não ser estimativas indiretas da depreciação das máquinas, dos equipamentos e da infra-estrutura econômica que se desgastam pelo uso ao longo dos anos, ou estimativas de pesquisas de amostras por domicílio.
Amartya Sen, Prêmio Nobel de Economia, sugere que a prosperidade inclui também um diferenciado conjunto ou estoque de bens e ativos (capitais) que permitem melhorar os níveis de produtividade de países e regiões. Nesse sentido, as perspectivas do desenvolvimento do Brasil para as futuras gerações, a partir da megadescoberta do pré-sal, ficam mais bem conhecidas por uma visão ou abordagem com as variáveis-estoque para se dar uma melhor idéia da capacidade de um país ou região produzir bens e serviços no futuro.
Percebe-se com maior clareza a importância do capital social no processo de desenvolvimento de um país ou de uma região em situações de assimetria no retrocesso econômico, como sugere Celso Furtado. Assim, se uma economia desenvolvida atrofia ou involui por causa de um evento exógeno, como no caso dos países da Europa após a 2ª Guerra Mundial, essa economia perde a dimensão física de sua capacidade produtiva e pode assumir os indicadores de renda per capita, de comércio e de produtividade típicos de uma economia subdesenvolvida. Entretanto, quando recebe novos estímulos e incentivos, como os financiamentos e o apoio técnico do Plano Marshall, a sua reação é rápida e acelerada por causa de sua capacidade endógena de mobilizar capitais tangíveis e intangíveis (empreendedorismo, cidadania, cultura da inovação, etc.) para promover a retomada do desenvolvimento econômico e social. O mesmo poderia não ocorrer em regiões menos desenvolvidas do Brasil, ainda que beneficiárias do pré-sal, se a escassez de capital social e institucional levar a situações de reprodução das desigualdades e das assimetrias sociais prevalecentes.
*Paulo R. Haddad, professor do IBMEC/MG, foi ministro do Planejamento e da Fazenda no governo Itamar Franco
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