A Espanha deve pedir hoje socorro à Europa, mas de forma indireta: quer que a Europa resgate seus bancos e não o país. Esse é um jeito de evitar a humilhante situação de ter as decisões políticas e econômicas monitoradas pela troica, ou seja, os burocratas do FMI, BCE e Comissão Europeia. Esta é a segunda vez que a Espanha entra no olho do furacão e o país será o quarto a ser resgatado, depois de Grécia, Irlanda e Portugal.
Os bancos estrangeiros no Brasil seguem regras brasileiras de prudência, que têm o mérito de isolar a unidade que opera aqui. Os bancos estrangeiros no Brasil não podem emprestar para as suas sedes, não podem captar aqui para aplicar lá. E têm limites muito rígidos de exposição aos riscos de suas matrizes. É importante ter isso em mente em mais uma onda de fragilidade das instituições financeiras na Europa.
A crise começou bancária, virou crise da dívida dos governos, e agora volta a abalar os bancos. A economia mundial está presa em uma espiral negativa, que já coloca em risco inclusive o supercrescimento chinês. Até agora os resgates foram para os países que eles definem no mercado como sendo "a periferia". Da Espanha não se pode falar isso: é a quarta maior economia da região.
Do ponto de vista do custo cobrado pelo mercado na rolagem das dívidas, a zona do euro está dividida em vários blocos. Numa ponta está a Grécia, isolada, na porta de saída, com seus títulos sendo negociados como juros de 28%. Depois aparecem Portugal e Irlanda, países que já foram socorridos, e têm títulos negociados com juros entre 11% e 8%. Logo após, estão Espanha e Itália, com governos que pagam 6% e 5%. Por fim, há ainda o grupo dos mais seguros, que é encabeçado pela Alemanha, e inclui a França, Áustria, Bélgica, com taxas abaixo de 3%. A Alemanha tem tido até juros reais negativos. A crise atinge os países de forma desigual.
Veja no gráfico abaixo que os juros da Espanha subiram muito e depois caíram. Parte da melhoria do humor foi induzida pela oferta de empréstimos ilimitados aos bancos feita pelo presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi, logo que ele assumiu.
O calendário neste mês de junho é apertado. A Grécia tem eleições no dia 17 para tentar formar um novo governo. O resultado das urnas pode trazer novas turbulências na região.
O governo espanhol captou 2 bilhões na quinta-feira, mas pagou juros de mais de 6%, para títulos com vencimento de 10 anos. A dívida tem crescido bastante e há projeções de 82% a 90% do PIB para os próximos anos.
Se não fosse tudo o mais que distancia a conjuntura brasileira da espanhola, só esse indicador de dívida/PIB - em queda no Brasil; em alta forte na Espanha - já seria o suficiente para exibir as contradições das agências de risco. Depois de derrubar a Espanha em três níveis, a Fitch a classificou no mesmo nível que o Brasil.
A Espanha vai recorrer à cláusula de recapitalização, do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira. Essa cláusula permite ao governo receber recursos sem uma intervenção da troica - FMI, Comissão Europeia e Banco Central Europeu -, como aconteceu com Grécia, Portugal e Espanha. A diferença seria alegar que os recursos não são para o próprio governo, mas para os bancos do país.
A Alemanha é contra a injeção direta de dinheiro nos bancos. Quer que os recursos passem pelo governo espanhol, para que ele seja o fiador do seu sistema financeiro. Caso haja crise de crédito no país, quem ficará oficialmente com o mico na mão será o governo espanhol, e não o Fundo Europeu.
As estimativas para o socorro estão variando entre 30 bilhões e 150 bilhões. Somente o Bankia precisou de 19 bilhões de aporte no mês passado. Então um valor baixo seria visto com desconfiança pelo mercado, ao mesmo tempo em que uma cifra muito alta seria avaliada como a confirmação de que os problemas são sérios. De qualquer forma, as bolsas reagiriam melhor com um volume maior de recursos, que pudesse afastar a escalada do risco sistêmico no país.
Esta será a terceira rodada de injeção de recursos nos bancos, desde que a crise começou. Os bancos espanhóis já receberam 82 bilhões, de acordo com o Ministério da Economia da Espanha.
A expectativa na semana que vem será em torno do resultado dos testes de estresse feitos pelos FMI com bancos espanhóis. Esses testes fazem simulações de como os bancos absorveriam choques diante de um agravamento da crise no país.